SAÚDE

Estudo aponta que covid leve pode deixar sequelas no pulmão

Cicatrizes nos pulmões e falta de fôlego para caminhar são detectadas em pessoas que se curaram da infecção pelo Sars-CoV-2 sem serem internadas. Resultado de estudo irlandês sinaliza a importância de monitoramento a longo prazo de todos os ex-pacientes

Paloma Oliveto
postado em 08/01/2021 06:00
 (crédito: AFP / RODGER BOSCH)
(crédito: AFP / RODGER BOSCH)

Fadiga e dificuldade para respirar são sequelas relativamente comuns em pacientes que se recuperaram da covid-19, exigindo, muitas vezes, um longo período de reabilitação. Até agora, não se sabe se essas complicações estão associadas à gravidade da doença, com pessoas que precisaram de internação devido à infecção pelo Sars-CoV-2 sendo mais propensas a apresentarem esse tipo de complicação. Um estudo irlandês sugere que as sequelas pulmonares, porém, independem da severidade da infecção.
Na pesquisa, os autores acompanharam 153 pacientes recuperados da covid-19 por até 75 dias após o diagnóstico. Essas pessoas sofreram graus variados da doença. “Conforme esperávamos, problemas como falta de ar e cansaço foram comuns depois da covid-19. Porém, os sintomas não pareceram estar relacionados à gravidade da infecção inicial”, diz Liam Townsend, pesquisador do Departamento de Doenças Infecciosas do Hospital de St. James.

Para avaliar a relação entre sequelas e severidade da covid-19, os autores dividiram os pacientes em grupos: sem necessidade de internação, internados e internados na unidade de terapia intensiva (UTI), sendo esses últimos os mais graves. Quase metade dos 153 participantes do estudo foi hospitalizada na fase aguda da infecção. No período, quando já estavam livres da doença, foram submetidos a exames diversos, incluindo de imagem e testes que avaliaram a capacidade cardiorrespiratória.

A equipe de Townsend comparou, então, a gravidade inicial da covid-19 com o resultado dos exames de radiografia torácica e o desempenho em testes de caminhada (durante seis minutos, os voluntários andaram em um ritmo normal, sendo monitorados), além dos relatos de percepção de esforço. Os médicos perguntaram se os pacientes se sentiram cansados durante a caminhada e se consideravam que já estavam plenamente recuperados. As respostas foram classificadas em escalas.

Nas radiografias do tórax, os pesquisadores investigaram a presença de fibrose — cicatrizes pulmonares — e sinais de infecção persistente. Naqueles que apresentaram anomalias, foi feita uma tomografia computacional. Além disso, todos fizeram exame de sangue para verificar a proteína C reativa, um marcador de inflamação.

Inesperado

Townsend afirma que os resultados o surpreenderam, porque esperava um número alto de radiografias com fibrose, o que não aconteceu: somente 4% dos pacientes apresentaram esse problema na tomografia computadorizada. Mas o que mais chamou sua atenção foi que as sequelas — inflamação, cicatriz, infecção persistente e desempenho ruim no teste de caminhada — não estavam relacionadas ao grau de severidade inicial da doença.

De acordo com Townsend, 62% dos pacientes sentiram que não haviam se recuperado totalmente, enquanto 47% afirmaram ter fadiga. Aqueles que se esforçaram mais em exercícios moderados também demonstraram percepção maior de saúde frágil. Porém, não houve associação estatística entre a gravidade da covid-19 e essas sequelas — as complicações tardias foram relatadas em pacientes de todos os grupos observados.

A única associação foi entre o tempo de internação e o desempenho no teste de caminhada: quanto maior tempo de hospitalização, menor a distância percorrida em seis minutos. Segundo Towsand, os resultados do estudo têm implicações para o tratamento clínico de pessoas que se recuperaram da infecção por Sars-CoV-2. “Eles demonstram a importância de acompanhar todos os pacientes que foram diagnosticados com a covid-19, independentemente da gravidade da infecção inicial. Não é possível prever quem terá sintomas contínuos”, diz.

Readmissão

“Os casos de covid-19 diminuíram e, depois, ressurgiram em muitos lugares. Assim, é crucial que entendamos o curso da pós-hospitalização e os fatores de risco para uma futura reinternação”, observa Anuradha Lala, pesquisadora do Hospital de Mount Sinai, em Nova York, e autora de um estudo publicado, em dezembro, sobre a readmissão hospitalar de ex-pacientes da covid-19 que, depois, sofreram complicações pulmonares. “À medida que avançamos para uma fase em que a covid-19 não é mais uma doença nova, devemos focar nossa atenção para a fase pós-aguda para entender como manter os pacientes bem e fora do hospital”, destaca.

No estudo norte-americano, dos quase 2,9 mil pacientes de covid-19 que receberam alta, mais de 100 (3,6%) retornaram para atendimento de emergência, com queixas pulmonares. Assim como no trabalho irlandês, não houve associação entre gravidade da infecção inicial e aparecimento de sequelas. Ao contrário, a maior parte das pessoas que voltaram ao hospital queixando-se de falta de ar e cansaço não havia necessitado de cuidados intensivos, quando internadas. De acordo com Lala, são necessárias mais pesquisas de longo prazo para predizer quais ex-pacientes têm risco maior de sequelas pós-covid.

 

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  • Há o risco de ex-pacientes da covid-19 demandarem novos cuidados intensivos devido às complicações duradouras da infecção
    Há o risco de ex-pacientes da covid-19 demandarem novos cuidados intensivos devido às complicações duradouras da infecção Foto: Rodger Bosch/AFP
  • Paciente com covid-19
    Paciente com covid-19 Foto: Rodger Bosch/AFP

Prazo de 72 horas para usar o plasma

Um estudo argentino publicado na revista The New England Journal of Medicine mostra que a administração de plasma de convalescente em pacientes com a covid-19 nas primeiras 72 horas da doença reduz pela metade o risco de quadro crítico. “É uma alternativa se alguém com mais de 65 anos se infectar. Mas é como um seguro-saúde, você tem que receber o tratamento quando ainda está saudável, porque não há tempo a esperar e ver o que acontece: se você está mal, o plasma é inútil”, diz o líder da pesquisa, o infectologista Fernando Polack, da Fundação Infant.
Com base nos resultados, “o estudo diz que, em todos os pacientes, a incidência da doença grave foi cortada pela metade”, diz Polack. “Temos certeza de que o plasma é útil nos primeiros três dias de doença, ou seja, você tem (um prazo de) 72 horas de sintomas para recebê-lo”, afirma o cientista à Rádio Con Vos.
Polack explicou que os resultados dependem da quantidade de anticorpos presentes no plasma. “Os melhores provedores são os pacientes que foram hospitalizados, porque eles têm mais anticorpos, além das pessoas que foram vacinadas”, diz ele, definindo essas últimas como “doadores privilegiados em potencial”. “Em uma sociedade desamparada contra o coronavírus, ser vacinado significa estar protegido e também ter a possibilidade de doar plasma, o que significa seis tratamentos para seis idosos para cada pessoa que doa duas vezes no mês”, ilustra.
O estudo envolveu 200 doadores de plasma e 120 pacientes voluntários, metade tratada com placebo, bem como mais de 200 profissionais da saúde. No entanto, a Argentina não tem, atualmente, capacidade para aplicar esse tratamento em seu sistema de saúde. “Hoje, não existe, é algo em construção dentro dos sistemas público e privado. É preciso gerar um arsenal (de plasma), que será uma ponte até que haja uma vacina para a maior parte da população”, explica Polack.

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