Lockdown. A palavra que foi eleita a palavra do ano pelo Collins Dictionary. A palavra que traz medo ou esperança, a depender de quem a profere e de quem a recebe. E, talvez, uma das medidas mais eficazes para mitigar os efeitos do coronavírus, enquanto desenvolvemos ferramentas para erradicá-lo.
Discutir se já houve ou não lockdown de fato no Brasil (eu entendo que sim, o que não houve foi adesão), se há um modelo de lockdown a ser aplicado como medida modelo, de forma igual, para todas as populações (não há), ou se é uma solução mágica que, na ausência de outras, é suficiente para diminuir a taxa de infecção da pandemia (não é) é assunto para longas discussões entre epidemiologistas e estudiosos da área. Fato é que essa medida, em conjunto com outras (expandir e treinar o sistema de saúde, rastrear todos os casos suspeitos, testagem em massa, adaptar instalações para tratar e isolar pacientes, desenvolver plano para quarentena daqueles que entraram em contato com infectados, focar o governo em suprimir e conter a doença) já era sugerida há um ano pela OMS.
Países como a Nova Zelândia, que, de setembro a fevereiro não registrou uma morte sequer e, desde então, somente uma, entenderam que um caso pode rapidamente se espalhar e ordenam lockdowns locais com a confirmação de um número pequeno de casos, acompanhado de testagem em massa para rastrear possíveis novas contaminações.
Mas se há responsabilidade do Estado em controlar a transmissão, o que fechar? Simples: os espaços em que há maior risco de infecção: restaurantes com ou sem restrição de ocupação, academias, bares e cafeterias, hotéis e motéis e serviços religiosos (igrejas, templos, mesquitas e sinagogas).
Mas seria o lockdown realmente eficaz para conter a transmissão? Os bons estudos indicam que sim. Uma vez que o vírus já está se espalhando em uma população, medidas de fechamento de fronteiras são menos eficazes (salvo se estamos falando das novas variantes). Restringir contato social, estabelecer protocolos de permanência em casa e manter aberto apenas serviços realmente essenciais (hospitais, farmácias e supermercados, por exemplo, estes últimos com taxa de ocupação controlada e reduzida) são capazes de reduzir bastante o contato entre infectados e possíveis pessoas suscetíveis, que, com a diminuição de proteção por infecção prévia e surgimento de variantes que escapam dos anticorpos adquiridos, tem aumentado em número.
A conta, nesse caso, é muito simples: o que se almeja é salvar vidas. Permitir que a doença corra solta (em especial em locais fechados e mal ventilados, como é o caso de igrejas, academias, restaurantes e escolas) é admitir que teremos mais infectados. Não há aumento de leitos de UTI que dê conta de salvar todo mundo; evitar que se contaminem, sim.
Júlio de Carvalho Ponce é farmacêutico bioquímico e bacharel em ciências moleculares, mestre em ciências e PhD em Epidemiologia pela Universidade de São Paulo
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