SAÚDE

Covid-19: agência europeia garante que vacina de Oxford é segura e eficaz

A divulgação da análise conduzida por especialistas do órgão é sucedida por anúncios de retomada do uso da fórmula em campanhas de imunização na Europa. OMS volta a reiterar a importância de os países não suspenderem o fármaco britânico

Diante da suspeita de ocorrência de trombose causada pela vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Universidade de Oxford e pela biofarmacêutica AstraZeneca — o que gerou temor em vários países e a suspensão da aplicação do imunizante em alguns deles —, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) declarou ontem que o fármaco é seguro, eficaz e não está associado ao surgimento de coágulos sanguíneos. A declaração se deu após a conclusão de uma série de análises realizadas pelo órgão e desencadeou anúncios de retomada do uso da vacina (leia mais ao lado). Também ontem, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reiterou a importância de manter a fórmula britânica nas campanhas de imunização.

“O comitê chegou a uma conclusão científica clara: trata-se de uma vacina segura e eficaz”, declarou a diretora executiva da EMA, Emer Cooke, durante videoconferência. Sabine Straus, presidente do Comitê de Segurança da agência, explicou não ter encontrado nenhuma evidência de baixa qualidade ou problemas relacionados a um lote específico do fármaco. “Seus benefícios continuam a ser muito maiores do que seus riscos”, frisou a especialista ao jornal americano The New York Times.

Ainda assim, segundo a EMA, não é possível descartar completamente uma ligação entre a vacina britânica e casos raros de distúrbios de coagulação sanguínea. “Com base nas evidências disponíveis e após dias de análises aprofundadas dos dados obtidos até agora, ainda não podemos excluir, definitivamente, uma relação entre esses casos e o imunizante”, afirmou Cooke.

Pouco antes da divulgação do relatório, a OMS reiterou a importância da continuidade do uso da fórmula criada pela parceria Oxford/AstraZeneca. “Nas campanhas de vacinação, apontar potenciais efeitos colaterais é algo rotineiro. Isso não quer dizer, necessariamente, que os efeitos estão vinculados com a vacinação”, justificou Hans Kluge, diretor europeu da agência das Nações Unidas.
O diretor ressaltou ainda que ganhar e manter a confiança do público quanto às imunizações é algo “crucial” durante a pandemia. “Precisamos renovar a confiança nas vacinas. E, se for perdida, restaurá-la. Especialmente para a AstraZeneca. Fazemos isso, basicamente, com transparência. Então, a comunicação, desde o primeiro dia, é muito importante. Em segundo lugar, precisamos mostrar empatia com as pessoas. E, em terceiro, é preciso ser competente”, indicou.

Está previsto para hoje a publicação das conclusões de uma avaliação feita pelo Comitê Consultivo Mundial sobre Segurança das Vacinas do órgão. Outra análise técnica sobre uso da fórmula britânica, também divulgada ontem, indicou resultados parecidos aos da EMA. A Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos para a Saúde (MHRA), do Reino Unido, anunciou que não detectou relação direta entre ocorrência de trombose e as vacinas da Oxford/AstraZeneca e Pfizer/ BioNTech. “Nossa revisão minuciosa, ao lado da avaliação de importantes cientistas independentes, mostra que não há evidências de que os coágulos de sangue aconteçam mais do que seria esperado na ausência de vacinação. Isso para nenhuma das vacinas”, afirmou a diretora executiva da MHRA, June Raine.

Vigilância

Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), avalia que a conclusão da EMA é importante porque mostra o cuidado das autoridades quanto à eficácia e à segurança das vacinas. O especialista também enfatiza que essas análises deverão ser feitas constantemente, pois fazem parte de uma rotina da área médica.

“Para esclarecer se esses episódios aconteceram por causa da vacina, é necessário a análise individual de cada caso ou um estudo amplo com a quantidade de vacinados e o seu perfil, o que foi feito pela EMA”, explicou. “Por exemplo, se casos de trombose, que são raros em crianças, começarem a ser registrados em indivíduos com essa idade que receberam a vacina, será algo preocupante. Não foi o que aconteceu nesse cenário. São adversidades que podem estar associadas a outros fatores relacionados à faixa etária dos imunizados até agora”, complementou.

Para Kfouri, a suspensão do uso do imunizante britânico em países europeus aconteceu devido à situação um pouco mais confortável dessas nações, que ainda podem utilizar outros tipos de vacina. “Para cada produto médico que é posto no mercado é tido esse cuidado. E esse caso da vacina de Oxford reforça essa atitude preventiva. Isso ocorre mesmo em um episódio como esse, em que poucos casos de coágulos sanguíneos foram registrados. É algo diferente do Brasil, por exemplo, em que nós temos poucas possibilidades. Nós não podemos nos dar ao luxo de ter suspensões temporárias. Isso atrapalharia muito a velocidade de imunização”, justificou. De acordo com dados oficiais, foram detectados 469 casos de coágulos sanguíneos entre os 20 milhões de vacinados com a vacina britânica na Europa.

Aplicações a partir de hoje

Quinze países suspenderam “por precaução”, na terça-feira, o uso da vacina britânica logo após o surgimento da suspeita de trombose. A maioria dos governantes informou que aguardaria o relatório de análise da Agência Europeia de Medicamentos (EMA). Ontem, depois de divulgados os resultados, oito países cumpriram a promessa e anunciaram que darão continuidade ao uso da fórmula: França, Alemanha, Espanha, Itália, Portugal, Holanda, Bulgária e Eslovênia.

“O governo italiano dá as boas-vindas às declarações da EMA. O fornecimento da vacina AstraZeneca será retomado (…) A prioridade do governo continua sendo a de realizar a maior quantidade possível de vacinação no menor tempo possível”, afirmou, em nota, Mario Draghi, primeiro-ministro italiano.

A retomada na Itália está prevista para hoje. O mesmo deverá ocorrer na Alemanha, segundo Jens Spahn, ministro da Saúde. Na Espanha, a imunização com a vacina britânica será restabelecida na próxima quarta-feira, de acordo com Carolina Darias, ministra da Saúde.

França

Além de anunciar que voltará a aplicar a vacina, a França informou que ordenou um confinamento parcial de pelo menos um mês em Paris, sua região metropolitana e outras regiões do país. “Estamos adotando uma terceira via, uma forma que deve permitir frear sem travar”, disse o primeiro-ministro, Jean Castex, que será vacinado com o imunizante da AstraZeneca hoje, para “dar o exemplo”.

As atividades não essenciais vão voltar a fechar as portas, e os deslocamentos serão restritos nas regiões afetadas. As escolas permanecerão abertas e será permitida a prática de exercícios ao ar livre em um raio de 10 quilômetros ao redor das residências. Segundo Castex, as medidas podem ser estendidas a outras regiões do país se a situação se agravar.