CIÊNCIA

Marte: saiba mais sobre o voo de quase 40 segundos que entrou para a história

O helicóptero Ingenuity eleva-se a 3 metros da superfície marciana, paira no ar por quase 40 segundos e se torna a primeira aeronave a motor a sobrevoar outro planeta. Façanha faz parte de missão da Nasa que busca sinais de vida extraterrestre

Vilhena Soares
postado em 20/04/2021 06:00
Câmera do helicóptero registrou a sombra criada por ele em solo marciano: missão dificultada pelo ar rarefeito -  (crédito: HANDOUT)
Câmera do helicóptero registrou a sombra criada por ele em solo marciano: missão dificultada pelo ar rarefeito - (crédito: HANDOUT)

Pela primeira vez na história, uma aeronave a motor sobrevoou outro planeta. O helicóptero Ingenuity, construído por cientistas da Agência Espacial dos Estados Unidos (Nasa), elevou-se a 3 metros sobre a superfície de Marte, durante a manhã de ontem. O voo, que durou quase 40 segundos, foi bastante comemorada pelos idealizadores, que planejaram a façanha astronômica durante os últimos seis anos. O grupo, agora, pretende realizar trajetos mais longos na mesma região e também em outras áreas planetárias.

A pequena aeronave, que pesa 1,8kg, levantou voo às 4h34 (no horário de Brasília) e pousou depois de 39,1 segundos. O ar muito rarefeito em Marte — menos de 1% da pressão da atmosfera da Terra — era um desafio, por dificultar a elevação do helicóptero. Para superar esse obstáculo, os especialistas utilizaram pás de rotor (hélices) com mais de 1m de comprimento, que giram muito mais rápido do que aeronaves semelhantes utilizadas na Terra.

A Nasa informou que os engenheiros do Ingenuity acompanharam o voo com tensão, por meio dos monitores do Laboratório de Propulsão a Jato (LPJ), localizado no estado da Califórnia. À medida que as tarefas planejadas eram executadas, uma onda de aplausos surgia. Após a aeronave ter pousado, com excelência, em uma “bacia marciana” chamada Cratera de Jezero, a voz de um dos engenheiros anunciou: “O Ingenuity fez o primeiro voo de uma aeronave motorizada em outro planeta”, e a comemoração foi ainda maior, relatou a agência.

Os dados e as imagens do voo autônomo foram transmitidos à Terra, a 278 milhões de quilômetros de distância, e processados mais de três horas depois. Duas antenas da agência espacial ajudaram no envio. Uma das primeiras imagens a chegar foi uma, em preto e branco, feita pela câmera de navegação do próprio helicóptero, que revelou sua sombra, semelhante a um inseto, projetada sobre a superfície de Marte.

Homenagem

Os cientistas na Nasa compararam a jornada do Ingenuity com o primeiro voo motorizado na Terra, realizado pelos irmãos Wright, Orville e Wilbur, em 17 de dezembro de 1903, na cidade de Kitty Hawk, no estado da Carolina do Norte. Um pedaço de tecido da primeira aeronave americana bem-sucedida também foi colocado dentro do Ingenuity, como uma forma de homenagem aos irmãos.

“Conversamos durante tanto tempo sobre nosso momento irmão Wright em Marte, e aqui está”, enfatizou, em comunicado, a engenheira principal do projeto, MiMi Aung. “Vamos tomar um momento para celebrar nosso sucesso e, depois, seguir o exemplo de Orville e Wilbur sobre o que fazer a seguir (…) A história mostra que eles voltaram ao trabalho, para aprender o máximo que conseguiriam sobre seu novo avião, e nós também faremos isso.”

A equipe continuará recebendo e analisando dados nos próximos dias e, em seguida, dará início ao planejamento do segundo voo, que não acontecerá antes de 22 de abril. Há ainda planos de repetir a operação em outras regiões do Sistema Solar, incluindo o planeta Vênus e uma das luas de Saturno, chamada de Titã.

Naelton Mendes de Araújo, astrônomo e professor da Fundação Planetário do Rio de Janeiro, avalia que o voo de Ingenuity é uma conquista importante para a área astronômica e abre portas para novas façanhas do tipo. “Acredito que é um desdobramento natural termos ainda mais máquinas voadoras em outros planetas, sobretudo em Marte, que tem atmosfera. No futuro, deveremos ter muitos drones percorrendo extensas áreas em território marciano”, opinou.

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Teste de tecnologia


O Ingenuity viajou a Marte unido à parte inferior do veículo espacial Perseverance, que pousou no Planeta Vermelho, em 8 de fevereiro, para cumprir a missão que busca sinais de vida extraterrestre. Pouco após o pouso do helicóptero, Perseverance enviou um vídeo colorido (veja arte) mostrando detalhes da decolagem e do pouso de Ingenuity. Ao contrário do veículo espacial, o objetivo do helicóptero é demonstrar que sua tecnologia funciona — ele não será usado para compreender melhor as características marcianas.

A Nasa havia programado o voo para 11 de abril, mas adiou por um problema de software que foi identificado durante um teste de alta velocidade do helicóptero. O problema foi solucionado com uma atualização do software e a mudança do código do computador de comando da aeronave.

Os especialistas estão otimistas quanto aos próximos voos do helicóptero, já que ele alcança áreas que os veículos espaciais não podem ir e pode viajar muito mais rápido. “Não sabemos exatamente até onde o Ingenuity nos levará, mas os resultados de hoje (ontem) indicam que o céu — ao menos em Marte — pode não ser o limite”, afirmou Steve Jurczyk, engenheiro da Nasa.

Para Naelton Mendes de Araújo, astrônomo e professor da Fundação Planetário do Rio de Janeiro, o uso de drones renderá ainda mais frutos em explorações espaciais. “Esse tipo de aeronave não tripulável pode fazer um mapeamento de uma superfície de forma mais detalhada do que um satélite. Isso devido à baixa altitude que ela atinge facilmente e à sua maior manobrabilidade, o que facilita bastante a navegação”, explicou. “Creio que haverá especificamente drones de asa fixa, que se assemelham a um pequeno avião, e balões dirigíveis, além dos helicópteros. Ou seja, teremos um mundo de opções a serem exploradas, e isso é algo bastante animador.” (VS)

 

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