A Rússia anunciou na quinta-feira (6/5) o registro de uma nova versão da vacina Sputnik, de uma dose só em vez de duas. Batizado de Sputnik Light, o imunizante usa apenas a primeira dose da Sputnik V, a original.
O anúncio foi feito pelo Fundo Russo de Investimento Direto (RDIF, na sigla em inglês), que é administrado pelo governo russo e financiou a criação do imunizante; pelo Instituto Gamaleya, que também é público e foi responsável pela pesquisa; e o Ministério da Saúde do país.
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Os testes mostraram que o uso da primeira dose da Sputnik V tem uma eficácia de 79,4%, de acordo com o fundo. Isso "é superior ao de muitas vacinas de duas doses", ressaltou o RFID.
"O regime de dose única permite a imunização de um maior número de pessoas em um menor espaço de tempo, favorecendo o combate à pandemia na fase aguda." Não se trata, portanto, de uma vacina completamente nova, mas sim do uso de apenas a primeira dose da Sputnik V como dose única.
Nenhum evento adverso grave foi registrado na pesquisa, informou o RDIF.
A Sputnik V vem sendo questionada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A agência vetou pedidos de importação da vacina russa porque diz que não pode confiar na segurança, eficácia e qualidade do imunizante diante da ausência de informações que foram requisitadas.
Uma das principais questões é que não deveria haver vírus capazes de se replicar em sua composição, e, segundo a Anvisa, os dados das pesquisas mostram que a Sputnik V tem isso.
O RDIF negou e disse que mais de 20 milhões de pessoas no mundo já receberam ao menos uma dose do imunizante.
O uso da Sputnik V foi aprovado em 64 países até agora, afirma o fabricante. Mas a Anvisa diz que só uma minoria deles está aplicando de fato a vacina na população.
O assunto será tema da CPI da covid-19 nesta quinta-feira (06/5), quando o presidente da Anvisa vai depor.
O que se sabe sobre eficácia
O fundo soberano russo disse no novo anúncio que a Sputnik Light gerou anticorpos em 96,9% dos participantes do estudo, e, em 91,67%, também produziu os anticorpos neutralizantes, que impedem a infecção das células humanas.
A taxa de eficácia de 79,4% foi calculada com base em dados de russos que foram vacinados com a primeira dose da Sputnik V e não receberam a segunda por algum motivo, entre 5 de dezembro de 2020 e 15 de abril de 2021.
O fabricante não informou no comunicado quantas pessoas fizeram parte do grupo analisado.
O RDIF divulgou com o anúncio de hoje que um estudo com 7 mil pessoas sobre a eficácia da Sputnik Light está sendo feito desde fevereiro na Rússia, nos Emirados Árabes, em Gana e em outros países.
Mas não ficou claro se os dados apresentados nesta quinta-feira fazem parte dessa pesquisa. A BBC News Brasil questionou os responsáveis, mas não recebeu uma resposta até a publicação desta reportagem.
Como funciona
A Sputnik V usa dois tipos de adenovírus diferentes, um em cada dose, que devem ser administrados em uma sequência certa.
Esses vírus causam resfriados em humanos e foram modificados em laboratório para carregar as instruções genéticas do novo coronavírus até nossas células.
Isso faz com que elas comecem a produzir uma proteína do Sars-CoV-2, disparando o processo que nos deixa imunizados.
Esses adenovírus também foram alterados pelos cientistas para não serem capazes de se reproduzir. Se fizerem isso, diz a Anvisa, podem fazer mal à saúde, e esse efeito não teria sido investigado.
Mas a agência afirma que só um tipo de adenovírus, o que é usado na segunda dose, teria conseguido se replicar de novo.
A Sputnik Light usa o primeiro tipo, que não teria esse problema — e essa é a principal preocupação da Anvisa com a segurança da vacina russa.
Isso não resolve no entanto as outras questões apontadas pela agência, que colocou em dúvida sua eficácia (porque faltariam dados) e sua qualidade (porque os métodos usados não seguem os padrões internacionais).
Sputnik será alvo da CPI
O fundo russo ameaçou processar a Anvisa por difamação, depois que a agência disse não ter testado doses da vacina russa. A Anvisa teria duvidado da Sputnik V sem fundamento, afirmou o RDIF, e manchado sua reputação.
"Após a admissão do regulador brasileiro Anvisa de que não testou a vacina Sputnik V, a Sputnik V está iniciando um processo judicial de difamação no Brasil contra a Anvisa por espalhar informações falsas e imprecisas intencionalmente", disse o fundo russo pelo Twitter.
A Anvisa reagiu convocando uma coletiva de imprensa para mostrar que a informação sobre os adenovírus replicantes estava nos relatórios do Instituto Gamaleya.
Também disse ter questionado os cientistas do instituto sobre isso e exibiu trechos de um vídeo de uma reunião como prova disso. O Brasil "foi achincalhado", disse o presidente da Anvisa, Antônio Barra, para justificar a decisão inédita da agência de mostrar a gravação.
O RDIF respondeu que o vídeo foi muito editado e não confirma nada. Também afirmou que a Anvisa errou e que novos testes feitos na Rússia e no Brasil mostram que não há vírus replicantes na Sputnik V.
Em nota divulgada na quarta-feira (5/5), a agência voltou a se defender, afirmando que ainda faltam dados. O que está sendo pedido aos russos é o mesmo que foi solicitado a outros fabricantes das vacinas que já foram aprovadas, disse a Anvisa.
"O que vem sendo exigido são questões básicas para uma vacina e não são motivos para indignação e tentativa de difamação do Brasil e dos seus servidores", afirmou a agência.
O presidente da Anvisa irá depor nesta quinta-feira (6/5) na CPI da covid-19 no Congresso Nacional e será questionado sobre o veto à importação da Sputnik V.
Vários governos estaduais e prefeituras, além do próprio governo federal, já fizeram acordos para comprar milhões de doses da vacina russa, em meio ao problema crônico de falta de vacinas no Brasil.
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