EFEITOS

Vacina da AstraZeneca tem risco baixo de provocar marcas roxas na pele

Estudo com dados de 2,5 milhões de pessoas mostra que a fórmula britânica contra a covid-19 pode desencadear a púrpura trombocitopênica imunológica. A complicação, responsável também por pequenos sangramentos, é rara e tem tratamento simples

Vilhena Soares
postado em 10/06/2021 06:00
Segundo os cientistas, o efeito pode ocorrer após a vacina da covid e de outras enfermidades, como a gripe e a hepatite B -  (crédito: Norberto Duarte/AFP)
Segundo os cientistas, o efeito pode ocorrer após a vacina da covid e de outras enfermidades, como a gripe e a hepatite B - (crédito: Norberto Duarte/AFP)

Em uma pesquisa feita com dados de 2,5 milhões de vacinados, pesquisadores escoceses constataram que a imunização com o fármaco da AstraZeneca pode estar ligada à ocorrência de um pequeno distúrbio hemorrágico autoimune, mas que se trata de uma complicação rara. Os especialistas avaliaram indivíduos que receberam uma dose do fármaco britânico ou do desenvolvido pela empresa Pfizer, e alguns voluntários do primeiro grupo desenvolveram púrpura trombocitopênica imunológica (PTI). Em artigo publicado na revista Nature Medicine, os cientistas enfatizam que o risco observado é muito baixo, semelhante ao de outras vacinas e bem inferior ao do surgimento de danos vasculares desencadeados pela infecção pelo novo coronavírus.

A análise engloba dados de 57% da população da Escócia com 18 anos ou mais. Esses indivíduos receberam a dose da AstraZeneca ou da Pfizer entre dezembro de 2020 e abril de 2021. Os cientistas descobriram um risco ligeiramente maior de PTI em 1,7 milhão de pessoas que receberam a primeira dose do imunizante britânico. No caso da outra vacina, o número foi 800 mil. Ainda assim, a frequência estimada de complicação é de 1,13 caso a cada 100 mil aplicações da primeira dose do imunizante britânico, um número considerado extremamente baixo, avaliam os pesquisadores.

“No geral, isso é bastante reconfortante. Nesse acompanhamento da população imunizada, estamos vendo riscos baixos no uso dessa vacina. Temos que frisar que também existem muitos tratamentos para pessoas que desenvolvem a púrpura trombocitopênica imunológica. Ela não é um problema preocupante”, afirma, em comunicado, Aziz Sheikh, professor na Universidade de Edimburgo e principal autor do estudo.

O distúrbio hemorrágico foi observado principalmente em pessoas idosas com problemas crônicos de saúde, como doença coronariana, diabetes e enfermidade renal crônica. Na maioria dos casos, surgiu da segunda à quarta semana após a aplicação do imunizante. “Se as pessoas apresentarem hematomas ou sangramento depois de receberem a vacina AstraZeneca/Oxford, é importante que avisem ao médico, porque existem excelentes terapias disponíveis para a PTI. São opções viáveis e acessíveis a todos”, enfatiza Sheikh.

Segundo os autores do estudo, o risco de surgimento da PTI após receber a vacina britânica é semelhante ao observado no uso de imunizantes parecidos, como os contra gripe, tríplice viral e hepatite B. A equipe lembra que os indivíduos que não se imunizam têm um risco ainda maior de sofrer com enfermidades cardiovasculares caso sejam infectados pelo novo coronavírus. “A mensagem principal é que o risco de ocorrência desse problema de saúde é muito menor com a vacina do que se você desenvolver a covid-19. Principalmente se for acometido pela forma grave da infecção”, alerta Sheikh. Ele também pondera que são necessárias mais pesquisas para investigar a relação entre a imunização contra a covid-19 e a PTI. Incluir voluntários mais novos é um caminho, além de avaliar os riscos de problemas cardiovasculares após a aplicação da segunda dose.

Análise robusta

Segundo Claudia França Cavalcante Valente, membro do Departamento Científico de Imunização da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI), os resultados confirmam o que era uma suspeita levantada em estudos anteriores. O estudo escocês é feito de forma mais ampla, o que passa mais segurança nos resultados vistos, avalia a especialista. “É um trabalho muito bonito, que utilizou dados reais, colhidos na população já vacinada, não de estudos clínicos, em que o número de avaliados é pequeno. Nesse artigo, temos um grupo extenso de indivíduos, e isso faz com que ele tenha ainda mais valor, algo que só conseguimos fazer em países que têm um banco de dados bem rico e organizado”, explica.

Valente também ressalta que casos de PTI, além de raros, são contornáveis, algo que é feito, inclusive, após o uso de outros imunizantes. “Temos casos de crianças que apresentam essa alteração de produção de plaquetas após imunização de hepatite ou sarampo, por exemplo, e é algo corrigido tranquilamente. Esses efeitos colaterais das vacinas são conhecidos e mínimos. Só nos mostram o quanto é necessário continuar a imunização da população com todos imunizantes disponíveis, pois, como dizem os pesquisadores, os riscos para quem tem covid-19 são bem maiores”, afirma.

A médica brasileira acredita que pesquisas futuras ajudarão a entender ainda mais os efeitos colaterais que podem estar relacionados à vacinação contra a covid-19. São informações, segundo Claudia Valente, que poderão ser utilizadas também para atualizar as fórmulas protetivas. “Temos um tempo recorde de aprovação dessas vacinas. Os imunizantes anteriores demoraram até décadas para serem feitos, e, hoje, estamos com opções seguras em cerca de um ano. Isso é algo muito importante. É bem possível também que, mais para frente, até esses riscos mínimos desapareçam”, aposta.

Menos plaquetas

Chamado também de trombocitopenia imune, esse distúrbio hemorrágico é provocado pela redução do número de plaquetas (trombócitos) desencadeada pela reação exagerada do sistema imune. Pode causar o surgimento de pequenos sangramentos e de marcas roxas na pele. Para a púrpura trombocitopênica imunológica, são usados medicamentos que impedem a destruição das plaquetas, como os corticosteroides.

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