FERTILIDADE

Descobertas moléculas promissoras para criação de anticoncepcionais mais eficazes

Técnica pode servir também para facilitar fertilização in vitro

Em março deste ano, pesquisadores da Academia Austríaca de Ciências anunciaram uma tecnologia que gerou os primeiros embriões humanos em estágio inicial numa placa de Petri — aquele potinho de vidro onde se faz culturas em laboratório. O objetivo do estudo foi chegar a um modelo fiel da formação inicial do feto e, assim, entender o comportamento embrionário detalhadamente. Agora, a mesma equipe anunciou, na revista Nature, que duas diferentes moléculas utilizadas nessas estruturas se mostraram promissoras para o desenvolvimento de anticoncepcionais aprimorados e de procedimentos de fertilização in vitro (FIV) mais eficazes.

O estudo foi liderado por Nicolas Rivron, do Instituto de Biotecnologia Molecular (Imba) da academia austríaca. A técnica desenvolvida pela equipe e descrita anteriormente estimula células-tronco humanas a se auto-organizarem exatamente da forma como ocorre durante uma fecundação uterina. Assim, é possível visualizar, com fidelidade, os primeiros estágios do desenvolvimento embrionário. Embora o estudo tenha sido realizado com tecidos de embriões humanos, Rivron esclarece que a tecnologia pode ser feita também com células-tronco adultas.

Os modelos in vitro desenvolvidos pelos pesquisadores, chamados blastoides, foram cultivados por 13 dias, um estágio em que agregavam cerca de 200 células. Essa estrutura embrionária é constituída por três tipos celulares principais, formadas antes da implantação no útero: os epiblastos, que formarão o embrião; os trofoblastos, responsáveis pela placenta; e os hipoblastos, que originarão o saco vitelino.

Estudando os jovens blastoides, a equipe descobriu que os epiblastos mandam sinais moleculares importantes aos trofoblastos. Eles determinam que um lado do embrião primitivo fique "pegajoso". Se os blastoides são depositados em células cultivadas do revestimento do útero humano, eles alcançam e se posicionam nessa parte viscosa, se fixando no tecido e replicando, assim, os eventos que ocorrem no início da gravidez.

Os pesquisadores descobriram que uma molécula natural chamada SC144 evita que o blastoide grude nas células uterinas, impedindo a implantação, apontando o caminho para uma nova geração de anticoncepcionais. Eles justificam que os contraceptivos hormonais são usados há muito tempo e funcionam para muitas mulheres. Porém podem ter efeitos colaterais sérios e a eficácia diminui se não forem tomados diariamente. Além disso, algumas pessoas, como as sobreviventes do câncer de mama, não podem ser submetidas a esse tipo de tratamento.

A equipe de Rivron usou uma molécula aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA), órgão regulatório de medicamentos norte-americano, para os testes. A chamada SC144 não precisa ser tomada todos os dias, apenas quando necessário. "A necessidade de apenas uma dose ocasional também pode resultar em efeitos colaterais significativamente menores, em comparação com uma pílula hormonal diária", diz o artigo. "Queremos tornar o planejamento familiar mais fácil, mais conveniente e mais adaptado aos atuais desafios da sociedade", disse Rivron, em nota.

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Embriões

Por outro lado, a equipe também descobriu como fazer o contrário: aumentar a chance de concepção. Uma molécula natural chamada LPA melhorou a auto-organização das células-tronco. Assim, poderia impulsionar a formação de embriões naturais nos processos de fertilização in vitro. "Planejamos testar o LPA e outras moléculas em um futuro próximo. Esperamos usá-las para melhorar o número e a qualidade dos embriões nos procedimentos de FIV, aumentando a chance de a mulher engravidar", diz Hillda Van de Velde, da Universidade Virje, de Bruxelas, que faz parte do estudo. "Nosso objetivo é empoderar as mulheres, permitindo-lhes controlar melhor sua fertilidade quer desejem evitar a gravidez ou aumentar as chances de ter um filho", escreveu Rivron.

Para Rovin Lovell-Badge, professor e geneticista do Instituto Francis Crick, no Reino Unido, é preciso ter cautela quanto às descobertas. "Para realmente saber se essas ou outras estruturas semelhantes a embriões baseadas em células-tronco podem ser usadas para modelar com precisão aspectos do desenvolvimento de embriões humanos normais, serão necessárias comparações detalhadas com embriões humanos normais e, de preferência, sua cultura em estágios além de 14 dias, quando a complexidade embrionária começa a se desenvolver", diz. Por outro lado, como há a possibilidade de utilizar células-tronco adultas nesse tipo de estudo, Lovell-Badge aponta uma vantagem: "Se validado (o modelo), isso reduziria a necessidade de trabalhar diretamente com embriões humanos. "