Vacinação

Covid: liberação de vacina da Pfizer para crianças é excelente notícia e traz 'horizonte melhor para 2022', avaliam especialistas

O consenso dos estudos é que a taxa de mortalidade nas crianças é pequena mas isso não significa que elas também não sejam afetadas pela doença


A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou na quinta-feira (16/12) o uso da vacina da Pfizer em crianças brasileiras de 5 a 11 anos.

Esse é o primeiro imunizante contra a covid-19 a ser liberado no país para essa faixa etária.

A decisão foi comemorada por especialistas e sociedades médicas, que chamam a atenção para a quantidade considerável de óbitos por essa doença entre os mais jovens nos últimos meses.

"A notícia da liberação desse imunizante para as crianças é excelente. Finalmente esse público poderá ser protegido da covid e de suas formas mais graves", analisa a médica Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

"A chegada de uma vacina contra a covid-19 para crianças brasileiras é algo a ser visto com muito otimismo, alívio e alegria", concorda a pediatra Heloisa Ihle Garcia Giamberardino, coordenadora do Centro de Imunizações do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, no Paraná.

"Se a gente analisar os dados, a doença infecciosa que mais mata na faixa etária pediátrica no nosso país atualmente é a covid-19. Ter um produto que passou por um processo rigoroso de análise da Anvisa e de outras agências internacionais traz uma perspectiva de um horizonte melhor para 2022", complementa a especialista.

Ainda não há certeza, porém, de quando as crianças serão efetivamente incluídas na campanha de vacinação contra a covid-19 no Brasil. Em anúncios recentes, o Ministério da Saúde disse que esperaria um posicionamento da Anvisa para negociar a compra de doses específicas para essa faixa etária.

A BBC News Brasil entrou em contato com o Ministério da Saúde para saber se há alguma perspectiva da vacinação das crianças, mas não foram enviadas respostas até a publicação desta reportagem.

Por que vacinar as crianças contra a covid-19?

É consenso entre os especialistas que a covid-19 é mais grave e tem uma maior taxa de mortalidade em indivíduos mais velhos ou com algumas comorbidades, como doenças cardíacas e pulmonares.

Mas isso não significa que as crianças também não sejam afetadas pelo coronavírus.

Num vídeo apresentado durante o anúncio da Anvisa na quinta-feira, a médica Rosana Richtmann, consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, destacou que cerca de 2,5 mil crianças e adolescentes brasileiros morreram de covid-19 desde o início da pandemia.

Já o médico Renato Kfouri, representante da Sociedade Brasileira de Pediatria, chamou a atenção para o fato de que, atualmente, a covid-19 mata mais do que todas as demais doenças infecciosas contempladas no calendário de vacinação infantil.

"Além disso, precisamos levar em conta as complicações da infecção pelo coronavírus nessa faixa etária, como o risco de síndrome inflamatória multissistêmica, a covid longa, a hospitalização e toda a carga relacionada com essa doença", disse o pediatra.

"E esse impacto todo não é algo que a gente pode negligenciar ou minimizar", emenda Ballalai.

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Vacinação das crianças representa um 'horizonte melhor para 2022', avaliam especialistas

O gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, explicou que a liberação da vacina da Pfizer para crianças de 5 a 11 anos teve como base dois estudos principais feitos pela farmacêutica.

A primeira pesquisa tinha como objetivo verificar a segurança e a tolerância ao produto em três diferentes dosagens: 10, 20 e 30 microgramas.

Os resultados mostraram que a dose de 10 microgramas é a mais adequada para essa faixa etária e induz uma boa resposta imune, com uma produção robusta de anticorpos neutralizantes contra a covid.

No segundo estudo, 2.268 crianças foram divididas em dois grupos. Dois terços delas tomaram duas doses da vacina com um intervalo de 21 dias entre as aplicações. O restante recebeu placebo, uma substância sem nenhum efeito no organismo.

"Na comparação entre os dois grupos, o perfil de segurança é muito positivo e não houve diferenças importantes entre quem recebeu vacina ou placebo. Não foram observados relatos de eventos adversos sérios, de maior preocupação", informa Mendes.

"Sobre a eficácia, a gente consegue perceber facilmente nos gráficos do estudo que o grupo que tomou placebo apresentou uma incidência maior de casos de covid-19 em comparação com quem recebeu a vacina", resume o representante da Anvisa.

A Pfizer calcula que a eficácia de sua vacina nessa faixa etária é de 90,7%.

O que muda na vacina da Pfizer para as crianças?

O produto que será aplicado para quem tem entre 5 a 11 anos é bem diferente da versão para adolescentes e adultos.

As crianças receberão uma dosagem de 10 microgramas. Para quem tem 12 anos ou mais, a dose é de 30 microgramas.

Há também diferenças importantes no volume de líquido injetado, na concentração de mRNA (o componente da vacina que estimula a resposta do sistema imunológico), na quantidade de doses por frasco de vacina e no tempo de armazenamento dos imunizantes.

"E isso tudo também representa uma boa notícia, pois nós conseguimos proteger bem as crianças com uma dose menor de vacina", observa Ballalai.

"Na prática, isso significa um maior rendimento de doses aplicadas na população, num momento em que precisamos proteger mais e mais pessoas mundo afora", completa.

Para evitar qualquer tipo de confusão na hora de aplicar as doses nos postos de saúde, a Pfizer e a Anvisa concordaram em usar um sistema de cores para facilitar a diferenciação das duas versões (para crianças ou para adolescentes e adultos).

A vacina para maiores de 12 anos vem num frasco roxo, enquanto o imunizante para crianças de 5 a 11 anos terá a cor laranja.

Giamberardino, do Hospital Pequeno Príncipe, entende que será muito importante o trabalho de treinamento e comunicação com os profissionais de saúde que fazem a vacinação e também com os pais que levarão os filhos para tomar as doses.

"Ter um frasco diferente, em outra cor, é uma ótima estratégia e ajuda a fazer essa conferência na hora da aplicação do produto", elogia.

Há risco de efeitos adversos?

A gerente-geral de Monitoramento da Anvisa, Suzie Marie Gomes, destacou que o produto da Pfizer já está liberado para crianças em várias partes do mundo, como Estados Unidos e União Europeia.

De acordo com a Pfizer, a autorização de uso da vacina em crianças também já ocorreu em Costa Rica, Colômbia, República Dominicana, Equador, El Salvador, Honduras, Panamá, Peru e Uruguai.

Até o momento, foram observados cerca de 2,9 mil eventos adversos no público infantil, sendo que 95% deles não foram graves.

"Cerca de 60% das notificações de eventos adversos estão relacionados a complicações e erros na hora da aplicação da vacina, que podem ser prevenidos, e os 40% restantes têm a ver com dor no local da injeção", detalha.

Um dos pontos que causa um certo receio no uso da vacina da Pfizer em crianças é a probabilidade de desenvolver uma miocardite ou uma pericardite, um tipo de inflamação que afeta o coração.

Embora esse efeito colateral esteja documentado em adolescentes, os técnicos da Anvisa e as sociedades médicas que participaram da decisão de liberar as doses no Brasil consideram que os benefícios de vacinar as crianças contra a covid superam, de longe, os riscos de eventos adversos.

Durante o anúncio da quinta-feira, os convidados lembraram que os Estados Unidos já vacinaram cerca de 5 milhões de crianças de 5 a 11 anos contra a covid-19 e não foram observados casos de inflamação cardíaca por lá até agora nessa faixa etária

E, mesmo entre adolescentes, a frequência de miocardites e pericardites entre os imunizados é bem baixa: o problema afeta ao redor de 0,007% dos imunizados, segundo dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA.

Ainda de acordo com a entidade, todos os pacientes costumam se recuperar bem desse efeito colateral após algum tempo.

"A população brasileira precisa estar preparada, porque nos próximos dias serão divulgadas muitas informações falsas e dados mentirosos ou enviesados sobre a vacinação das crianças contra a covid-19", alerta Ballalai.

"Não temos motivos para ficar preocupados com esses efeitos colaterais. A liberação desse imunizante foi feita com responsabilidade e respeitando dados técnicos e científicos", defende a médica.

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Diferença na cor dos frascos da vacina da Pfizer ajuda a evitar confusões na hora de aplicar a dose em crianças ou adultos

Giamberardino reforça que a vacinação é uma estratégia coletiva e é importante a participação de toda a sociedade na campanha.

"O que mais vemos hoje no hospital são casos de crianças internadas com covid-19 cujos pais decidiram não se vacinar", relata.

"Tomar a vacina não é uma decisão pessoal, mas, sim, de entender que fazemos parte de uma sociedade e, juntos, precisamos nos proteger", complementa.

A Anvisa também afirmou que continuará atenta e fará a vigilância sobre possíveis eventos adversos quando a vacinação do público infantil começar no país.

"A nossa autorização se baseia nos dados que temos disponíveis até o momento e faremos todo o monitoramento pós-aprovação", esclareceu Gomes.

"Sabemos que os benefícios superam os riscos e temos os canais de notificação adequados para os casos de eventos adversos", complementa a representante da agência.

Quando vai começar a vacinação das crianças?

A aprovação da Anvisa é o primeiro passo para que a vacina seja usada em crianças brasileiras.

Porém, para a campanha de imunização começar pra valer nesta faixa etária, é preciso que o Ministério da Saúde compre as doses e faça o planejamento de aplicação pelos próximos meses.

Até o fechamento desta reportagem, o Governo Federal não havia se pronunciado sobre a decisão da Anvisa ou as perspectivas do calendário de vacinação contra a covid-19 para quem tem entre 5 e 11 anos.

"Incluir as crianças no Plano Nacional de Imunização contra a Covid-19 é uma pauta do comitê técnico que assessora o Ministério da Saúde nessas questões há bastante tempo", diz Ballalai, que faz parte desse grupo de orientação sobre as políticas públicas de vacinação.

"Há toda uma questão de negociação entre o governo e a farmacêutica que não nos envolve, mas tudo indica que essa faixa etária será contemplada na campanha, possivelmente a partir do começo de 2022", projeta a médica.

Em comunicados enviados à imprensa, a Pfizer disse que pode fazer ajustes no terceiro contrato assinado com o governo brasileiro no dia 29 de novembro, que prevê a entrega de 100 milhões de doses da sua vacina para 2022.

Segundo a farmacêutica, há a "possibilidade de [entregar] versões modificadas do imunizante para variantes, que poderão ser eventualmente desenvolvidas caso necessário, e versões para diferentes faixas etárias, conforme solicitação por parte do Ministério da Saúde".

Além da vacina da Pfizer, a Anvisa também recebeu na quarta-feira (15/12) um pedido de liberação do uso da CoronaVac (Instituto Butantan/Sinovac) para indivíduos de 3 a 17 anos.

A agência deve dar uma resposta a essa outra solicitação nos próximos 30 dias.


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