1,8 milhão de mortes a mais

Alerta vem de cientistas americanos que avaliaram os efeitos de poluentes em 13.189 cidades. Uma das constatações é de que a exposição ao dióxido de nitrogênio está ligada ao surgimento, em 2019, de 1,85 milhão de casos de asma em crianças

Vilhena Soares
postado em 06/01/2022 00:01
 (crédito: ANDREW CABALLERO-REYNOLDS)
(crédito: ANDREW CABALLERO-REYNOLDS)

Altos níveis de poluição do ar nas cidades têm contribuído para um aumento de mortes e de doenças respiratórias, como a asma, em todo o mundo. O alerta é feito por cientistas dos Estados Unidos em dois estudos científicos publicados na última edição da revista Lancet Planetary Health. Um deles enfatiza que as crianças estão entre o público mais vulnerável. Em 2019, de cada três casos de asma em pacientes nessa faixa etária registrados, dois aconteceram em locais com taxas altas de poluição atmosférica. No mesmo ano, mostra a outra pesquisa, a quantidade de poluentes emitidos registrada foi sete vezes maior do que a considerada aceitável pela Organização Mundial da Saúde (OMS) — um excesso que provocou 1,8 milhão de mortes. Para especialistas, juntos, os estudos destacam a necessidade urgente de melhorar a qualidade do ar e de reduzir a exposição à poluição principalmente entre os mais novos e os mais velhos.

Na pesquisa voltada para a população infantil, a equipe avaliou as concentrações de dióxido de nitrogênio (NO2) — um poluente presente nas emissões de veículos automotivos (tubos de escape), usinas de energia e instalações industriais — em mais de 13.189 cidades de diversos países, incluindo o Brasil. Os cientistas cruzaram os dados do ar com a quantidade de novos casos de asma diagnosticados em crianças entre 2000 e 2019.

Por meio das análises, constatou-se que, dos cerca de 1,85 milhão de novos casos de asma pediátrica atribuídos ao NO2 globalmente em 2019 (8,5% de todos os novos casos da enfermidade relatados nesse ano), dois terços ocorreram em áreas urbanas, onde as taxas de poluição eram mais altas. "Nossa pesquisa mostra que esse poluente coloca as crianças em risco de desenvolver asma, e o problema é especialmente agudo em áreas urbanas", enfatiza, em comunicado, Susan Anenberg, professora de saúde ambiental e ocupacional na Universidade George Washington e uma das autoras do estudo.

As análises também revelaram que a quantidade de casos de asma pediátrica ligados ao NO2 em áreas urbanas caiu recentemente. No geral, a fração diminuiu de 20% em 2000 para 16% em 2019. De acordo com os especialistas, essa boa notícia significa que um ar mais limpo na Europa e em partes dos Estados Unidos, provavelmente devido a regulamentações mais rígidas implementadas por países de renda mais alta, resultou em grandes benefícios para a saúde dos jovens, especialmente para os que vivem em bairros próximos a estradas movimentadas e áreas industriais.

Por outro lado, observou-se um aumento das taxas de poluição atmosférica no sul da Ásia, na África Subsaariana e no Oriente Médio. "Em locais que têm programas eficazes de gestão da qualidade do ar, as concentrações de NO2 têm diminuído por décadas, com benefícios para a saúde respiratória das crianças. Mas, mesmo com essas melhorias, os níveis atuais desse poluente contribuem substancialmente para a incidência de asma pediátrica. As nossas descobertas sugerem que manter o ar puro deve ser uma das prioridades nas tomadas de decisão que buscam manter as crianças saudáveis", afirma Anenberg.

"Prova cabal"

Segundo Celso Taques Saldanha, coordenador do Departamento Científico de Biodiversidade, Poluição e Alergias da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai), os dados obtidos são extremamente importantes porque mostram como a redução da emissão de poluentes influencia na incidência de problemas respiratórios. "É um estudo muito importante e bastante sólido, já que analisou um grande número de regiões urbanas, mais de 13 mil cidades, além de ter avaliado as cidades que adotaram programas de combate à poluição atmosférica", justifica. "Ao constatar que essas regiões reduziram as taxas de asma após essa decisão, temos uma prova cabal do quanto o ar poluído prejudica a saúde das crianças."

Saldanha ressalta que, em se tratando de saúde respiratória, a vulnerabilidade é maior entre os mais novos, o que demanda cuidados extras em relação ao ambiente em que eles vivem. "A população infantil está em desenvolvimento. A mucosa, os brônquios e os alvéolos são mais frágeis. Por isso, estão mais indefesos. Além disso, eles ficam muito em lugares fechados, como casas e escolas. Uma boa medida é sempre que possível mantê-los em locais abertos, evitando, assim, essa exposição constante a poluentes", sugere.

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