Farmacologia

Pesquisa mapeia medicamentos que podem reduzir letalidade da covid-19

Cientistas reuniram os principais compostos pesquisados desde o início da pandemia e classificaram quanto ao potencial benéfico, ou maléfico, no tratamento de pacientes infectados pelo novo coronavírus

Jéssica Gotlib
postado em 31/01/2022 16:59 / atualizado em 31/01/2022 17:01
Nas conclusões, os autores do texto constataram que não buscam recomendar remédios para uso imediato na clínica médica, mas apontar possíveis soluções que podem ser estudas a fundo por outras equipes -  (crédito: Juan Mabromata/AFP)
Nas conclusões, os autores do texto constataram que não buscam recomendar remédios para uso imediato na clínica médica, mas apontar possíveis soluções que podem ser estudas a fundo por outras equipes - (crédito: Juan Mabromata/AFP)

A pandemia de covid-19 já matou mais de 5,6 milhões de pessoas ao redor do mundo e infectou 364 milhões, segundo dados da Organização Mundial da Saúde postados no sistema WHO Coronavirus. Embora as medidas restritivas venham sendo gradualmente retiradas em grande parte dos países com o avanço da vacinação, a busca por medicamentos que possam diminuir o impacto de possíveis novas variantes ainda é um importante foco das pesquisas científicas.

Foi baseado nessa preocupação que um grupo de pesquisadores do Centro Nacional de Investigações Oncológicas (CNIO) da Espanha publicou um artigo em que mapeia todos os compostos químicos, citados de 2020 até agora, com potencial para ajudar a intervenção em quadros graves. O estudo foi feito seguindo o método de revisão de literatura, em que se analisa e compila outros textos científicos previamente publicados, com modelagem matemática, feita a partir de simulações de computador.

Os pesquisadores focaram em um grupo específico de pacientes: aqueles que desenvolvem um quadro inflamatório excessivo em resposta à infecção pelo SARS-COV-2. De acordo com Óscar Fernández-Capetillo, chefe do Grupo de Instabilidade Genômica do, quando há uma infecção, o organismo humano naturalmente reage liberando um grupo de proteínas chamadas citocinas.

São elas as responsáveis por gerar a resposta imune que vai combater o invasor. Mas há casos em que o corpo se torna hiper-reativo em um quadro chamado de "tempestade de citocinas". "Essa resposta é, muitas vezes, a causa da morte das pessoas afetadas pelo SARS-CoV-2, e não o próprio vírus", explica o cientista.

Lista de amigos

Nos casos destes pacientes, os medicamentos listados pelo grupo do CNIO podem agir como um antídoto. "Os tratamentos potenciais para a tempestade de citocinas de pacientes com Covid-19 incluíram terapias anti-inflamatórias de amplo espectro, como corticosteroides ou terapias mais direcionadas, como anticorpos anti-receptor de IL-6 (Tocilizumab)", detalha o artigo publicado nesta segunda-feira na revista Nature.

Para o pesquisador, o resultado foi reconfortante na medida em que incluiu entre as substâncias eficazes alguns dos remédios que já estão sendo usados no dia a dia das emergências ao redor do mundo.

"O estudo prevê que glicocorticóides como a dexametasona devem ser eficazes no combate à mortalidade em pacientes com covid-19, o que foi reconfortante porque, de fato, esses medicamentos, juntamente com outros, já estão sendo usados em hospitais para combater a morte por covid-19”, comemorou Fernández-Capetillo.

Entretanto, ele ressaltou que qualquer terapia à base de anti-inflamatórios só pode ser eficaz na fase gravíssima da doença, quando os pacientes estão internados e a resposta autoimune exagerada fica evidente para a equipe médica.

O artigo também apontou uma lista de substâncias que podem fazer mal aos pacientes, como classes de medicamentos que estimulam o sistema imune ou aumentam o quadro inflamatório generalizado. Além disso, há possíveis interações com outros tratamentos como os oncológicos ou a via de sinalização da insulina.

Entre as surpresas, esteve o indício de que o estrogênio produzido naturalmente pelas mulheres durante a idade fértil pode sim interferir na gravidade da infecção. Dados apontaram para uma menor mortalidade feminina durante a idade adulta e uma redução da diferença de gravidade em relação aos homens em idades mais avançadas, coincidindo com o período pós-menopausa.

Só o começo

Nas conclusões, os autores do texto deixaram claro que não buscam recomendar remédios para uso imediato na clínica médica, mas listar as substâncias que possam ser estudadas por outras equipes individualmente a fim de criar o maior número possível de soluções médicas para a atual crise sanitária.

A pesquisa é complementar a outras abordagens desenvolvidas até então como vacinas, transfusões de plasma de pacientes que se recuperaram da covid-19 e tratamentos antivirais que limitam a replicação do vírus ou infecção, destacam os cientistas no artigo.

Mesmo que feito em tempo recorde, como as primeiras vacinas para o coronavírus desenvolvidas ainda em 2020, qualquer estudo precisa seguir critérios científicos rígidos que garantam a validade de seus resultados. No caso desta pesquisa do CNIO, o professor Fernández-Capetillo fez questão de reconhecer o empenho dos voluntários da Unidade de Bioinformática do CNIO.

O estudo foi resultado, em grande parte, da “perseverança e trabalho de Laura Sánchez-Burgos, uma estudante que, durante o duro confinamento em Madrid, recorreu a aproximações computacionais para que, embora estivesse em casa, pudesse ser útil e investigasse problemas relevantes associados ao SARS-CoV-2”, agradeceu.

Intitulado Uma análise in silico identifica drogas potencialmente modulando a tempestade de citocinas desencadeada pela infecção por SARS-CoV-2, o artigo completo pode ser lido, em inglês, no site da revista Nature.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação