Covid-19

Estresse sofrido na pandemia pode afetar cérebro de bebês, diz pesquisa

Crianças nascidas durante a crise sanitária têm redução no volume de áreas como o hipocampo e o cerebelo. As mães não estavam infectadas, mas tinham estresse e depressão

O estresse sofrido pelas grávidas durante a pandemia do novo coronavírus pode gerar danos à saúde neural dos filhos, mostra um estudo americano. Os cientistas chegaram à conclusão após detectar alterações no desenvolvimento do cérebro de bebês cujas mães sequer foram infectadas pelo Sars-CoV-2 durante a gestação. Para o grupo, a constatação reforça a importância de se investigar a fundo os efeitos desse vírus em gestantes e os possíveis impactos na infância.

"Compreender como os estressores contemporâneos podem influenciar o desenvolvimento do cérebro fetal durante a gravidez tem grandes implicações para a ciência básica e pode ajudar a guiar as iniciativas de políticas públicas", enfatiza, em comunicado à imprensa, Catherine Limperopoulos, diretora do Developing Brain Institute da Children's National e uma das autoras do estudo, publicado na revista especializada Communications Medicine.

O trabalho é uma continuidade de investigações que já vêm sendo conduzidas pelo grupo. Antes, eles observaram que a ansiedade em grávidas parece afetar o desenvolvimento cerebral dos bebês. Agora, Limperopoulos e colegas selecionaram 202 mulheres, sendo que 137 estavam grávidas antes da pandemia e 65 grávidas durante a crise sanitária não infectadas, para investigar de que forma o surgimento do Sars-CoV-2 pode influenciar nesse fenômeno.

As participantes responderam a uma série de perguntas sobre a ocorrência de qualquer tipo de sofrimento experimentado durante a gravidez, incluindo ansiedade, estresse e depressão. Por meio dos questionários, a equipe descobriu que estresse e depressão foram mais relatados proporcionalmente entre as mulheres que engravidaram durante a pandemia. Os níveis de ansiedade, porém, permaneceram consistentes nos dois grupos.

Na segunda parte do trabalho, os especialistas usaram técnicas avançadas de ressonância magnética e reconstrução de modelos cerebrais 3D de alta resolução para avaliar minuciosamente a estrutura neural dos bebês. Naqueles que nasceram durante a pandemia, houve uma redução dos volumes de diversas áreas cerebrais, como hipocampo, cerebelo e córtex cerebral.

Para os especialistas, os resultados justificam a realização de mais análises sobre o fenômeno e a adoção de medidas que protejam gestantes e fetos. "Com esse trabalho, podemos mostrar que há um problema de desenvolvimento, que está acontecendo no pré-natal. É possível usar esse modelo como uma base para começar a explorar formas de reduzir o estresse sofrido pelas mães e apoiar os bebês", defende Limperopoulos.

A cientista lembra que as condições observadas são modificáveis. "Sabemos que podemos intervir cedo nessa questão, conseguindo prevenir ou reduzir, para as grávidas, o estresse no cenário atual", explica. Os autores não investigaram o impacto a longo prazo das alterações neurais e sugerem que pesquisas futuras façam essa análise. Para eles, também é necessário avaliar a influência de outros fatores, como nutrição materna, segurança financeira e fatores genéticos.

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Tatianna Ribeiro, obstetra especialista em fertilização in vitro, do Instituto Verhum, em Brasília, também pontua a necessidade de mais investigações sobre o fenômeno. "Foi analisado um grupo reduzido. Apenas 65 das avaliadas tiveram filhos durante a pandemia. Para chegar a conclusões mais fortes, precisamos aumentar esse retrato", justifica. "Ainda assim, sabemos que o estresse durante o período mais grave de disseminação do novo coronavírus gerou muitos desgastes, e isso, provavelmente, refletiu no desenvolvimento do feto."

A especialista observa que outros elementos também podem ter contribuído para as alterações neurais observadas pelos americanos e sinaliza que estamos em um novo momento da crise sanitária. "Agora, temos um cenário menos preocupante. O estresse das grávidas é menor. Então, os efeitos devem ser mais brandos, mas ainda temos muitos casos de depressão, por exemplo. Por isso, é importante entender melhor essa relação."

Segundo Tatianna Ribeiro, a área explorada pelos cientistas é bastante promissora e pode render dados ainda mais interessantes. "Esse trabalho fala sobre algo muito importante, uma ciência chamada de epigenética, que dá foco a elementos externos, do meio ambiente, que podem gerar efeitos na nossa genética mesmo sem alterar os nossos genes", explica. "O estresse é algo que pode, sim, ter uma grande influência no nosso organismo. Por isso, precisa ser bem investigado."

Diabetes: pouco ajuste na dieta

Um grande estudo de revisão publicado no periódico British Journal of Medicine (BMJ) — envolvendo a análise de 150 pesquisas e dados de mais de 7 milhões de gestantes — detalha os riscos para a mãe e para o bebê quando há o diagnóstico de diabetes gestacional e fortalece a tese de que não são necessárias grandes mudanças alimentares para evitar uma das complicações mais frequentes na gravidez.

O diabetes gestacional é diagnosticado quando há um nível de açúcar no sangue muito alto, que, geralmente, desaparece após o parto. A condição, porém, aumenta o risco de surgimento do diabetes clássico nos anos seguintes. "Sabemos que sua frequência vem aumentando há vários anos, em parte porque o excesso de peso — que favorece a diabetes — está se tornando mais comum", afirmam os autores do trabalho, liderado por Fangkun Liu, pesquisador da Central South University, na China.

Ao analisar os estudos, os cientistas recomendam que se evite ao máximo alterar a dieta da paciente. Até o consumo de alimentos açucarados pode ser permitido, mas, obviamente, sob o acompanhamento de especialistas. "É necessário ter em conta as situações particulares decorrentes da gravidez, mas também as diversas dificuldades (hábitos alimentares, gostos, situação social, financeira, profissional e organizacional etc.) da paciente", justificam.

O trabalho também confirmou que o diabetes gestacional aumenta o risco de parto prematuro, de pré-eclâmpsia e de peso anormalmente elevado no recém-nascido, além de possível desconforto respiratório ao nascer. Os resultados são tranquilizadores em termos de uma eventual morte do recém-nascido. Segundo os autores, "não há diferença aparente" de risco de aborto espontâneo entre grávidas com e sem diabetes gestacional.