hidratação

Quantidade de água ideal para manter corpo hidratado não é universal

A dica é de cientistas que demonstram, em estudo, que a quantidade do líquido necessária para manter o corpo hidratado não é universal. Segundo eles, o número certo depende de fatores individuais, como gênero, peso e prática de atividades físicas

Paloma Oliveto
postado em 25/11/2022 06:00
 (crédito: FRED TANNEAU)
(crédito: FRED TANNEAU)

Oito copos de água por dia. Quem nunca ouviu dizer que essa é a quantidade ideal para se manter hidratado? O problema é que, por trás da recomendação, não existe qualquer suporte científico. É o que sustenta um estudo publicado na revista Science, realizado com dados de mais de 5,6 mil pessoas. De acordo com os pesquisadores norte-americanos, asiáticos e europeus, o volume necessário para a execução das funções corporais é individual e depende do metabolismo de cada pessoa.

Os resultados foram coletados em 26 países (o Brasil ficou de fora), e o estudo abrange dados de bebês de apenas 8 dias a de idosos com 96 anos. A média diária de ingestão de água variou bastante: de 1 litro a 6 litros, sendo que, em alguns casos, os cientistas registraram até 10 litros de consumo por dia. "Não existe uma média. Muitas coisas estão relacionadas às diferenças na ingestão e na eliminação de água do organismo", conta um dos autores do estudo, Dale Schoeller, da Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos.

O professor de ciências nutricionais estuda a relação da água com o metabolismo há décadas. "Esse trabalho é o melhor que fizemos, até agora, para medir quanta água as pessoas realmente consomem diariamente e os principais fatores que impulsionam a rotatividade de água para dentro e fora do corpo", destaca Schoeller. De acordo com ele, estudos anteriores foram, em grande parte, elaborados com base no autorrelato dos participantes ou na observação de um número muito pequeno de voluntários, não sendo representativos da maioria das pessoas.

Agora, os pesquisadores mediram objetivamente o tempo que a água levou para se mover pelo organismo dos participantes. Os voluntários tomaram uma quantidade determinada da chamada "água rotulada", que contém isótopos de hidrogênio e oxigênio rastreáveis. Isótopos são átomos de um único elemento que têm pesos atômicos ligeiramente diferentes, fazendo com que os cientistas consigam distingui-los em uma amostra.

"Se você medir a taxa com que uma pessoa está eliminando esses isótopos estáveis por meio da urina ao longo de uma semana, o isótopo de hidrogênio pode dizer quanta água eles estão substituindo. Já a eliminação do isótopo de oxigênio pode nos dizer quantas calorias eles estão queimando", explica Schoeller. O pesquisador conta que seu laboratório na universidade norte-americana foi o primeiro a usar água rotulada no estudo do metabolismo humano.

Troca hídrica

No total, mais de 90 pesquisadores participaram do estudo, liderado por Yosuke Yamada, que fez pós-doutorado no laboratório de Schoeller e, hoje, chefia o Instituto Nacional de Inovação Biomédica, Saúde e Nutrição no Japão. John Speakman, professor de zoologia da Universidade de Aberdeen, na Escócia, coliderou o estudo. Os pesquisadores coletaram e analisaram os dados dos participantes comparando fatores ambientais — como temperatura, umidade e altitude das cidades onde viviam os voluntários — com volume de água medido, gasto de energia, massa corporal, sexo, idade e grau de atividade física.

Nos homens, o volume de renovação da água corporal atingiu o pico na faixa etária dos 20 anos, enquanto as mulheres mantiveram um platô dos 20 aos 55 anos. Os recém-nascidos foram os que apresentaram o maior índice de troca hídrica, repondo 28% da água de seu organismo diariamente. De acordo com o estudo, o nível de atividade física e o preparo físico dos participantes foram os itens que mais influenciaram as diferenças na renovação, seguido por sexo, índice de desenvolvimento humano do país (que mede o status socioeonômico) e idade.

Em média, homens e mulheres com perfis semelhantes diferem em cerca de meio litro de água no organismo. Um homem não atleta, mas que pratica atividade física moderada, de 20 anos, pesa 70 kg, vive ao nível do mar em um país bem desenvolvido, em um ar médio temperatura de 10ºC e uma umidade relativa de 50% absorveria e perderia cerca de 3,2 litros de água todos os dias. Uma mulher da mesma idade e nível de atividade, pesando 60 kg e morando no mesmo local consumiria 2,7 litros, exemplificam os autores.

Dobrar a energia utilizada pelo organismo aumenta o volume diário de água em cerca de 1 litro. Cinquenta quilos a mais de peso corporal adicionam 0,7 litro por dia. Um aumento de 50% na umidade eleva o consumo em 0,3 litro. Além disso, atletas usam cerca de 1 litro a mais do que os não atletas.

Aspectos sociais

Ao todo, quanto menor o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do país de origem, mais água a pessoa gasta em um dia. "Essas pessoas em países com IDH baixo têm maior probabilidade de viver em áreas com temperaturas médias mais altas, são mais propensas a realizarem trabalho braçal e menos a ficarem dentro de um edifício climatizado durante o dia", justifica Schoeller. "Isso, além do menor acesso a um gole de água potável sempre que precisar, aumenta a rotatividade de água."

Segundo o coautor, as medições feitas no estudo poderão melhorar a capacidade de prever necessidades futuras de água, especialmente em circunstâncias de calamidade pela escassez do líquido. "Quanto melhor entendermos o quanto as pessoas precisam, mais preparados estaremos para responder a uma emergência. Determinar quanta água os humanos consomem é de importância crescente por causa do crescimento populacional e das crescentes mudanças climáticas", disse, em nota, Yamada. "Como a renovação da água está relacionada a outros indicadores importantes de saúde, como atividade física e percentual de gordura corporal, ela tem potencial como biomarcador para a saúde metabólica", completa.

De acordo com Tamara Hew-Butler, cientista do esporte na Universidade Estadual Wayne, nos Estados Unidos, a hiper-hidratação pode ser tão perigosa quanto a desidratação. Autora de várias pesquisas sobre água e metabolismo corporal, ela concorda que os oito copos por dia não são um parâmetro científico. "Não se sabe bem de onde saiu isso. Talvez, sejam interpretações erradas de diretrizes de saúde", cogita. "Se você está com sede, você precisa tomar água. Mas se não estiver, não precisa. O cérebro tem sensores que identificam a necessidade de reposição hídrica. Dizer que todo mundo precisa de oito copos por dia para ser saudável é como dizer que todo mundo precisa ingerir uma dieta de 2 mil calorias", afirma.

Segundo Hew-Butler, o líquido perdido diariamente precisa ser reposto, mas não necessariamente com copos de água. "Quase tudo que você bebe ou come contém água, o que compensa essa perda diária. Café, chá, sopa, frutas, legumes — tudo isso conta", afirma.

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