Uma nova subvariante da cepa ômicron preocupa autoridades de saúde nos Estados Unidos e na Inglaterra pelo potencial de alta virulência. Além disso, especialistas temem que a chamada XBB 1.5 seja mais resistente às vacinas contra a covid-19. Atualmente, ela é responsável por quase 41% dos casos confirmados da doença no território norte-americano: na semana do Natal, o percentual era de 21%, segundo os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC). No Reino Unido, uma em cada 25 ocorrências da enfermidade são causadas por essa versão, ainda não identificada no Brasil.
Em Nova York, onde se acredita que a XBB. 1.5 tenha surgido, 71% dos casos confirmados estão associados à variante, uma descendente da XBB, que não se mostrou perigosa. No caso da versão atual, a mutação-chave, chamada F486P, está associada ao escape da imunidade, o que poderia explicar o avanço súbito de infecções nos Estados Unidos. Um estudo recente publicado na revista Cell mostra que as subvariantes BQ.1, BQ.1.1, XBB e XBB.1— esta última detectada no Brasil — são as mais resistentes já identificadas, mas a pesquisa foi feita com células em laboratório, e não se sabe se esse resultado extrapola para o mundo real.
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Reinfecções
Em outubro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou que a XBB, da qual a nova versão descende diretamente, não causa doença mais severa, embora apresente um risco mais elevado de reinfecções que todas as anteriores. Segundo Shan-Lu Liu, autor sênior do estudo e professor de virologia da Universidade Estadual de Ohio, nos EUA, a XBB, originada pela troca de material genético entre duas subvariantes BA.2 da ômicron, tem uma "resistência extraordinária" aos anticorpos neutralizantes produzidos tanto por vacinação quanto por infecções anteriores.
Embora ainda não se tenha dados sobre a XBB.1.5, Liu destaca que o Sars-CoV-2 é um micro-organismo surpreendente. "Esse vírus pode fazer coisas inesperadas. Ainda temos que fazer um bom trabalho de vigilância e ficar de olho nessas variantes emergentes de preocupação (VOCs)", diz. As chamadas VOCs são, na classificação da OMS, as versões que podem aumentar a transmissibilidade ou a virulência, além de desafiarem a eficácia de vacinas e tratamentos disponíveis.
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China
Enquanto Estados Unidos e Inglaterra lidam com o aumento de casos associados à XBB. 1.5, a explosão de novas infecções na China após o cancelamento da política de "zero covid" levanta a preocupação do surgimento de novas variantes. Não se sabe ao certo a situação epidemiológica no país asiático — os testes obrigatórios encerraram no mês passado, impossibilitando, segundo Pequim, rastrear a escala do surto. Oficialmente, desde 7 de dezembro, houve 15 óbitos, mas há desconfiança de que o número seja subestimado, pois hospitais e crematórios, especialmente nas áreas rurais, registram um aumento de pacientes e cadáveres, segundo a agência France-Presse de notícias (AFP).
Como algumas regiões começaram a compartilhar os números diários de novos casos, é possível ter uma ideia da dimensão do surto. Apenas na província de Zhejiang, 1 milhão de pessoas são infectadas por semana. Nas cidades de Quzhou e Zhoushan, ao menos 30% da população contraiu o vírus. Já Qingdao estima 500 mil infecções diárias, e Xangai teria registrado 10 milhões de ocorrências em 22 de dezembro. O vazamento de anotações de uma reunião de autoridades sanitárias indicou que, nos primeiros dias do mês passado, 250 milhões testaram positivo para o Sars-CoV-2. Por enquanto, as subvariantes da ômicron BA.5.3 e BF.7 são as mais comuns em Pequim. As XBB e BQ, mais transmissíveis, ainda não foram detectadas no país.
Vigilância
Fernando González Candelas, especialista em epidemiologia e evolução de vírus e bactérias da Universidade de Valência, na Espanha, afirma que o aumento de casos de covid-19 na China significa uma probabilidade elevada do surgimento de novas variantes com características indesejáveis, como aumento da transmissibilidade, fuga das defesas imunitárias ou gravidade da infecção. "O maior risco decorre do maior número de casos, diretamente ligado à quantidade de mutações que o vírus pode explorar para se adaptar melhor ao seu ambiente, tanto individual quanto comunitário. Além disso, dadas as condições de saúde naquele país, onde vive um número muito elevado de imunocomprometidos, aumenta também a probabilidade do aparecimento de variantes completamente diferentes das que vimos até agora", diz.
Segundo o especialista, caso isso ocorra, levará semanas ou mesmo meses até que a existência de uma nova versão do vírus seja notada. "Isso é importante para poder atualizar a composição das vacinas, como já foi feito na segunda dose de reforço com a variante ômicron. No entanto, vale lembrar que as vacinas atuais ainda fornecem proteção altamente eficaz contra infecções e transmissões graves. A vigilância genômica do Sars-CoV-2 nos permite acelerar a resposta à evolução do vírus, caso ocorra", tranquiliza.
Paul Hunter, professor de medicina da Universidade de East Anglia, na Inglaterra, lembra que a covid é uma doença com a qual a humanidade terá de conviver. "A pandemia não acabou, pois o Sars-CoV-2 está aqui para sempre. Os netos dos nossos netos vão pegar a infecção. Mas, pelo menos no Ocidente, estamos vendo o impacto nos serviços de saúde diminuir a cada onda de infecção", diz.
No caso da China, o epidemiologista afirma que o país "está, claramente, em uma situação muito difícil", pois, desde fevereiro passado, houve uma queda nas imunizações e, consequentemente, a maioria da imunidade se esgotou. "Como a população chinesa até recentemente não tinha passado por muitas infecções, poucas pessoas teriam imunidade híbrida (conferidas pela infecção e pela vacinação). Portanto, grande parte da proteção contra doenças graves também foi perdida agora."
No Ocidente, como a maioria das pessoas tem imunidade híbrida, as taxas de mortalidade são muito mais baixas do que há um ano, observa Hunter. Além disso, é relatado que a vacinação da população mais velha fica atrás da dos mais jovens e os idosos sofrem de doenças mais graves. "A China está em um lugar sombrio no momento e não sei quanto tempo vai durar, mas não acho que isso represente uma grande escalada de ameaça para o mundo em geral. Diz-se que é a variante BF.7 da ômicron que está impulsionando a onda na China, mas em escala global ela está em declínio."
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UE oferece ajuda à China
A União Europeia anunciou ontem que está disposta a enviar vacinas anticovid-19 para a China. O porta-voz da UE Tim McPhie disse que a comissária de saúde do bloco, Stella Kyriakides, "estendeu a mão e já fez essa oferta às autoridades chinesas", mas que "dependerá da reação" de Pequim. Muitos países europeus têm um excedente de vacinas de mRNA, especialmente a produzida pela BioNTech/Pfizer. Segundo vários estudos, as fórmulas são mais eficazes contra formas graves da doença do que as desenvolvidas e usadas pelo país asiático.
Vacina após síndrome inflamatória é segura
Um estudo financiado pelos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos demonstra que crianças e jovens que sofreram síndrome inflamatória multissistêmica (MIS-C), uma reação imunológica potencialmente letal decorrente da infecção por Sars-CoV-2, podem tomar a vacina contra a covid-19. O artigo, publicado na revista Jama Network Open, é o maior do tipo para estudar a segurança da imunização nesse grupo.
A MIS-C é uma condição mal compreendida que afeta 1 em cerca de 3 mil a 4 mil crianças e adolescentes que tiveram covid, surgindo algumas semanas após a infecção. Os sintomas podem variar de dor de estômago, febre e erupção cutânea a inflamação do músculo cardíaco, uma condição grave chamada miocardite, com potencial falência múltipla de órgãos. As causas exatas são desconhecidas.
Algumas famílias e profissionais de saúde questionaram se as vacinas para covid poderiam levar a reações adversas mais graves em pessoas com histórico de MIS-C, incluindo a recorrência da doença, mas faltavam dados sobre esse assunto. O estudo incluiu 22 centros médicos (21 nos Estados Unidos e um no Canadá), com 385 pacientes acima de 5 anos que tiveram a condição e eram elegíveis para o imunizante.
A mediana de idade foi de 12,2 anos e 73,5% eram do sexo masculino. Os participantes eram etnicamente diversos — 24,3% eram negros, 31,9% hispânicos e 28,6% brancos. Daqueles que receberam a vacina após MIS-C, reações adversas leves — principalmente dor no braço e fadiga — ocorreram em 49%, semelhante à população em geral. Não houve relatos de complicações graves, incluindo miocardite ou recorrência da doença, disseram os pesquisadores.
"Estamos muito tranquilos com os resultados e esses dados de segurança devem confortar as famílias e os profissionais de saúde ao considerar e recomendar a vacinação", disse o colíder do estudo Matthew D. Elias, MD, cardiologista pediátrico do Hospital Infantil da Filadélfia. A recomendação é que os pacientes com histórico de MIS-C recebam a vacina pelo menos 90 dias após o diagnóstico.