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Terapia genética pode reverter Alzheimer; entenda a pesquisa

Testada preliminarmente em um pequeno número de pacientes, substância reduziu a produção de uma proteína que, quando danificada, causa demência. Pesquisadores acreditam que nova terapia terá mais sucesso que as duas já aprovadas

Paloma Oliveto
postado em 25/04/2023 06:00 / atualizado em 25/04/2023 20:15
 (crédito: WallpaperFlare/Divulgação)
(crédito: WallpaperFlare/Divulgação)

Uma terapia genética voltada ao Alzheimer leve reduziu os níveis de uma proteína nociva para o cérebro, associada à causa do mal neurodegenerativo. O tratamento tem potencial não só de retardar, mas de reverter a doença, sugere um artigo publicado ontem na revista Nature Medicine. Segundo os pesquisadores, da Universidade College London (UCL) e da Fundação NHS Trust, na Inglaterra, essa é a primeira vez em que se testa um silenciador de genes para demência. Os resultados se baseiam em um estudo de fase 1, que verificou, em humanos, a segurança e a eficácia da substância.

Hoje, estima-se que mais de 55 milhões de pessoas vivam com algum tipo de demência, especialmente Alzheimer, número que deve dobrar a cada 20 anos. "Por isso, tratamentos que modifiquem o curso da doença para prevenir ou retardar sua progressão são uma necessidade significativa, ainda não atendida", destaca a líder do estudo, Catherine Mummery, da UCL.

A neurologista conta que o foco do medicamento em teste é a tau, uma das proteínas que, quando danificadas, causam o Alzheimer. Além dela, a beta-amiloide é conhecida por provocar a doença e já existem dois remédios aprovados — aducanumabe e lecanemabe — que têm essa substância como alvo. Porém, o sucesso de ambos é limitado e, como há risco de efeitos colaterais graves, alguns médicos preferem esperar mais tempo para prescrevê-los. E nenhum deles reverte os danos já causados, diferentemente do que foi visto, agora, com a droga experimental.

Segundo os pesquisadores, a substância, chamada provisoriamente de MAPTRx, aparentemente terá mais sucesso que as anteriores, reduzindo, pela primeira vez, os sintomas da doença. O ensaio de fase 1 mostrou que, em um pequeno grupo de pacientes acompanhados por três anos, a droga impede que o gene induza a formação defeituosa da tau. Assim, haveria menor produção da proteína, o que alteraria o curso do Alzheimer.

"Precisaremos de mais pesquisas para entender até que ponto a droga pode retardar a progressão dos sintomas físicos da doença e avaliar a droga em idosos e grupos maiores de pessoas e em populações mais diversas", admite Mummery. "Mas os resultados são um passo significativo para demonstrar que podemos atingir a tau com sucesso com uma droga silenciadora de genes para retardar — ou possivelmente até reverter — a doença de Alzheimer e outras causadas pelo acúmulo de tau no futuro", acrescenta.

Quarenta e seis pacientes com idade média de 66 anos foram incluídos no estudo, que ocorreu de 2017 a 2020. A pesquisa analisou três doses da droga, administradas por injeção no sistema nervoso, por meio do canal espinhal, em comparação com um placebo. Os resultados preliminares indicam que a substância foi bem tolerada, com todos os voluntários chegando ao fim do período de teses e mais de 90% completando o pós-tratamento. Os efeitos colaterais nos dois grupos foram leves ou moderados, sendo o mais comum dor de cabeça após a injeção.

"Esse estudo de fase 1 é empolgante porque mostra que podemos alterar a quantidade de tau — uma das proteínas que causa a doença de Alzheimer", destaca Liz Coulthard, professora da disciplina de Demência Neurológica na Universidade de Bristol, Inglaterra, que não participou da pesquisa. "Essa redução é alcançada bloqueando as mensagens do DNA que produzem a proteína anormal dentro de cada célula. É um método de alta tecnologia de tratamento de pacientes com Alzheimer. Sabemos que pode ser útil porque uma droga semelhante agora é usada com sucesso para tratar uma condição neurológica rara da infância, a atrofia muscular espinhal", explica. "Ensaios maiores são necessários para testar se esse efeito realmente ajuda os pacientes. Uma grande desvantagem desse tratamento é que ele precisa ser administrado por injeção na coluna lombar, ou seja, por punção lombar", pondera.

Reguladores

Em janeiro, pesquisadores do Hospital Infantil do Texas e da Faculdade de Medicina Baylor do estado norte-americano identificaram novos reguladores da tau que também têm potencial para servir como alvos terapêuticos para Alzheimer e outras doenças associados a essa proteína. Os autores publicaram um artigo na revista Neuron, considerado promissor por especialistas.

O objetivo dos pesquisadores foi realizar uma triagem para encontrar genes cuja inibição pode reduzir os níveis de tau. Com modelagem computacional, os cientistas chegaram a 6,6 mil genes-alvo. Em seguida, eles fizeram testes com células de mamíferos moscas-da-fruta (um modelo comum nesse tipo de pesquisa) para detectar as estruturas do DNA que afetam diretamente a produção da proteína. Por fim, chegou-se a um catálogo de 11 novos alvos para drogas futuras, sendo que três mostraram-se mais promissores.

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Tratamento promissor

 (crédito:  Universidade de Edimburgo/Divulgação )
crédito: Universidade de Edimburgo/Divulgação 

"Esse artigo mostra os resultados de estágio inicial de uma nova droga para tratar a doença de Alzheimer. Ela reduz os níveis de tau, uma das proteínas tóxicas que se acumulam no cérebro de pessoas com Alzheimer. Os pesquisadores descobriram que o novo tratamento era seguro e, curiosamente, também houve uma redução muito promissora de tau no líquido cefalorraquidiano após o tratamento. Embora haja um longo caminho a percorrer em estudos maiores para determinar se esse medicamento ajudará as pessoas que vivem com demência, os dados são muito promissores. Esse tipo de tratamento direcionado à tau tem o potencial de retardar ou mesmo interromper a progressão da doença de Alzheimer",

Tara Spires-Jones, professora de neurodegeneração e vice-diretora do Centro para Descobertas de Ciências Cerebrais da Universidade de Edimburgo, na Escócia 

 

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