INOVAÇÃO

Eletrodos implantados no cérebro podem ajudar no tratamento da epilepsia

Solução em desenvolvimento na Suíça também poderá ser usada para avaliar deficits motores e sensoriais

Amanda Gonçalves*
postado em 29/05/2023 06:00 / atualizado em 29/05/2023 06:36
 (crédito: Alain Herzog)
(crédito: Alain Herzog)

Nas últimas décadas, pesquisadores têm buscado criar procedimentos médicos cada vez menos invasivos para aumentar a segurança de intervenções delicadas, como as neurocirurgias. Nesse sentido, cientistas da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), na Suíça, desenvolveram eletrodos que podem ser implantados no crânio e mapear, com maior facilidade, a superfície cerebral. A ideia, a princípio, é usar a tecnologia para fornecer tratamentos para pessoas com epilepsia. Detalhes do trabalho foram divulgados, neste mês, na revista Science Robotics.

Stéphanie Lacour, professora do EPFL, é especialista no desenvolvimento de eletrodos flexíveis, capazes de se adaptar a um corpo em movimento. Ela e a equipe encararam o desafio de inserir um grande feixe de eletrodos por meio de um pequeno orifício, implantando o dispositivo entre o crânio e a superfície do cérebro, sem danificá-los. "Precisávamos projetar uma matriz de eletrodos miniaturizada capaz de dobrar, passar por um pequeno orifício no crânio e, depois, implantar em uma superfície plana sobre o córtex. Em seguida, combinamos conceitos de bioeletrônica leve e robótica leve", relata, em nota, Lacour.

O protótipo desenvolvido pela equipe tem seis braços em espiral, dobrados dentro de um tubo cilíndrico de silicone. Segundo os criadores, o formato ajuda a maximizar a área de superfície do arranjo de eletrodos e, portanto, a atuação deles. "O design em espiral permite atingir regiões distintas do cérebro, o que é difícil de fazer com as grades de eletrodos atuais", compara Lacour.

Antes de chegar ao cérebro, o dispositivo parece uma borboleta ainda dentro do casulo, na metamorfose. Isso porque o conjunto de eletrodos, completo com seus braços em espiral, é cuidadosamente dobrado dentro de um tubo cilíndrico, que funcionará como carregador, pronto para ser implantado através do pequeno orifício no crânio. O protótipo criado pode ser encaixado no córtex cerebral, localizado na parte frontal da cabeça, através de um furo de 2cm de diâmetro. Quando implantado na cabeça, se estende por uma superfície de 4cm de diâmetro.

A escolha pelo silicone se deu porque ele tem propriedades físicas semelhantes à dura-máter, pele protetora do sistema nervoso central, explica Lacour. "Os silicones podem ser usados como substrato de suporte para eletrodos, mas também formar atuadores macios." Os atuadores são dispositivos responsáveis por produzir movimentos. O dispositivo também foi projetado com finas camadas de metal, a fim de permitir interconexões elétricas nos eletrodos. É essa característica, que, segundo os criadores, poderá permitir usar estimulação elétrica em pessoas com epilepsia.

Facilidade

Na avaliação de Antônio Jorge Barbosa de Oliveira, neurocirurgião do Hospital Anchieta de Brasília, a tecnologia poderá facilitar a análise da atividade cerebral, uma vez que o conjunto de eletrodos precisa de apenas um pequeno orifício para ser implantado no cérebro, pode ser expandido e mapear uma área grande do córtex. "Inserir um conjunto de eletrodos em um orifício pequeno e ele se expandir, ocupando no máximo dois, três milímetros do espaço entre o osso e o cérebro, facilitaria muito nosso trabalho", explica.

Até agora, o arranjo de eletrodos foi testado com sucesso em um miniporco, quando registrou-se a atividade cortical sensorial da cobaia. Para o futuro, a equipe planeja implantar o aparelho em humanos e avaliar a sua estabilidade. "Também exploraremos a capacidade de estimulação para que possamos explorar o uso de eletrodos implantáveis em uma interface cérebro-computador", aposta Lacour.

O grupo também cogita a criação de abordagens minimamente invasivas para facilitar a cirurgia de ressecção de lesões e para a avaliação de distúrbios neurológicos, como deficits motores e sensoriais. Para eles, a solução tecnológica tem o potencial de facilitar a adoção de abordagens médicas ajustadas às demandas de cada paciente. "As neurotecnologias minimamente invasivas são abordagens essenciais para oferecer terapias eficientes e personalizadas", afirma a cientista.

*Estagiária sob a supervisão de Carmen Souza

 

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Vestível monitora lesões e doenças

 (crédito: UC San Diego Jacobs School of Engineering)
crédito: UC San Diego Jacobs School of Engineering

Abordagens de monitoramento dos tecidos humanos são fundamentais para auxiliar na detecção precoce de doenças, como cânceres, e para acompanhar lesões musculares. No entanto, os métodos atuais são invasivos, com medições de curto prazo ou têm profundidade de penetração ou resolução espacial insuficientes. Cientistas da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, desenvolveram um dispositivo de ultrassom vestível capaz de gerar imagens tridimensionais não invasivas e seriadas de até 4cm abaixo da superfície da pele humana, com uma boa resolução espacial.

Hongjie Hu, um dos autores do estudo, conta que, para construir a matriz ultrassônica extensível, a equipe utilizou um tipo de elastômero de silicone como material de encapsulamento. "Esse material é muito durável e pode suportar centenas de ciclos de alongamento e flexão sem quebrar, podendo ser usado a longo prazo", explica. O material também é biocompatível e à prova d'água, o que o torna seguro para uso na pele humana e resistente ao suor.

Além do silicone, 79 eletrodos de ativação foram integrados em seis multicamadas do dispositivo. A nova tecnologia, apresentada, neste mês, na revista Nature Biomedical Engineering, fornece informações cruciais sobre a progressão de doenças, além de ajudar a diagnosticar e tratar lesões esportivas a partir do monitoramento de músculos, tendões e ligamentos. O pequeno aparelho vestível também permite que médicos acompanhem, com precisão, a fibrose e a cirrose do fígado e a elasticidade do coração.

Para testá-lo, os pesquisadores mapearam distribuições 3D da elasticidade dos tecidos em amostras vivas. Com isso, puderam detectar danos microestruturais nos músculos dos voluntários antes do início da dor e monitorar o processo de recuperação dinâmica das lesões musculares durante a fisioterapia.

Na análise de Anderson Benine Belezia, radiologista do Hospital Anchieta, em Brasília, o ultrassom vestível poderá fornecer imagens seriadas com resolução espacial e de contraste superiores aos dispositivos disponíveis, de forma a auxiliar na prevenção de doenças. "É possível que essa tecnologia permita detectar patologias de forma mais precoce, o que, consequentemente, influi de forma positiva nos tratamentos das doenças", explica.

A equipe deseja projetar e customizar os circuitos de condução para o tamanho de um cartão de crédito, integrando funções de aquisição de dados e pós-processamento, além de torná-los esticáveis. Assim, o pequeno aparelho poderá ser equipado à beira do leito, em quartos de UTI ou ajudar na detecção de doenças em pontos de atendimento durante serviços ambulatoriais. "Nosso dispositivo mostra grande potencial no monitoramento próximo de grupos de alto risco, permitindo intervenções oportunas em momentos urgentes", enfatiza Hongjie Hu. (AG)

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