Recado
“Tente de novo. Falhe de novo. Falhe melhor.”
Samuel Beckett
De geladeira, banho-maria e fritura
Paulo Guedes era o todo-poderoso do governo Bolsonaro. O presidente o apelidou de Posto Ipiranga. Mandachuva da economia, tinha o poder de fazer e desfazer sem questionamentos. O tempo passou. Cadê? O ministro falou muito e entregou pouco. A última foi o pacote prometido pra ser aberto na terça-feira. Não foi. O chefão vetou.
Culinária na manchete
A imprensa falou em fritura do ministro. Logo, logo seria frito. Pintou a curiosidade. Como o termo da culinária ampliou o significado? Ele faz companhia a outros. Um deles: banho-maria. Outro: pôr na geladeira. Dizem que frito, sinônimo de quem se deu mal, vem de longe. Nasceu nos tempos da Inquisição. A Igreja torturava as pessoas até queimá-las na fogueira. Uiiiiiii!
Por falar em todo-poderoso...
Guedes era todo-poderoso. E Teresa Cristina? Todo, no caso, funciona como advérbio (= totalmente). Mantém-se invariável: Guedes ainda é todo-poderoso na economia? Teresa Cristina é todo-poderosa na agricultura. Ambos ainda jogam no time dos todo-poderosos. Há, também, equipes de todo-poderosas.
Alto lá!
No pacote de Guedes, figuravam cortes em benefícios destinados aos mais necessitados. Bolsonaro não concordou. E, sabido, criou uma frase de efeito pra ganhar uns pontinhos nas pesquisas de opinião: “Não podemos tirar do pobre pra dar ao paupérrimo”.
A fala ganhou espaço em jornais, rádios e tevês. A razão: Sua Excelência fugiu da mesmice. Usou paupérrimos em vez de muito pobres. O significado é o mesmo. Mas surpreendeu. E a surpresa, sabe-se, é uma das qualidades do estilo.
Supersuper
O adjetivo tem graus. Um deles é o superlativo. Como o nome diz, ele joga no time dos mais mais. Trata-se do elevado grau de determinada qualidade. O supersuper tem duas formas. Uma sintética, formada por uma só palavra. A outra analítica, formada por mais de uma.
Há exemplos pra dar, vender e emprestar. Um deles foi usado por Bolsonaro. Outros: inteligente (muito inteligente, inteligentíssimo), elegante (muito elegante, elegantíssimo), fácil (muito fácil, facílimo), difícil (muito difícil, dificílimo), amigo (muito amigo, amicíssimo), amável (muito amável, amabilíssimo), bom (muito bom, boníssimo), fiel (muito fiel, fidelíssimo).
Jeitos de dizer
A língua é pra lá de criativa. Às vezes quer dar ideia de superlativo sem usar o superlativo. Há jeitos. Um deles é repetir o adjetivo. Veja o exemplo de Castro Alves:
Teus olhos são negros, negros
Como as noites sem luar...
Mais do mesmo
A Polícia Federal deflagrou mais uma operação. Na mira, o tráfico internacional de drogas. Que nome dar para a caçada? Procura daqui, palpita dali, eureca! Chamou-a de Fato Real. Baita pleonasmo.
Todo fato é real assim como todo país é do mundo e todo elo é de ligação. Por isso, quando alguém duvida de algo, dizemos para convencê-lo de que estamos certos “é fato”. Conclusão: o adjetivo sobra. Basta fato.
Furacão
O furacão Laura chegou aos Estados Unidos. Atingiu a Louisiania. Ventos pra lá de fortes castigaram a costa do estado. O fato virou notícia. Muitos escreveram “ventos de 240km por ora”. Bobearam. Hora e ora se pronunciam do mesmo jeitinho. Mas têm significados diferentes:
Hora = 60 minutos: Ganha R$ 50 por hora. A velocidade da via é de 80km por hora. O rendimento de muitas pessoas se mede por horas trabalhadas.
Ora = agora: Por ora, tem três saídas. Guedes não tem propostas a apresentar por ora. A velocidade, por ora, é de 80km por hora.
Leitor pergunta
Li no jornal “O pessoal foram”. Tropeço, não?
Ricardo Silva, Brasília
Senhor tropeço. A língua, coitada, é a vítima. Pessoal, como multidão, pede verbo no singular: O pessoal foi. A multidão se dissolveu.
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