Festival de Cinema

Filme 'Ivan, o TerrirVel' celebra Ivan Cardoso no Festival de Cinema

Diretor de longas que misturam leveza, graça e terror, Ivan Cardoso foi assunto central no mais recente documentário de Mario Abbade

Ricardo Daehn
postado em 20/12/2020 07:29 / atualizado em 20/12/2020 07:30
O diretor Ivan Cardoso em imagem de arquivo de 1987 -  (crédito: Arquivo / CB DA Press)
O diretor Ivan Cardoso em imagem de arquivo de 1987 - (crédito: Arquivo / CB DA Press)

O documentário Ivan, o TerrirVel, com o qual Mario Abbade se debruça sobre a obra de Ivan Cardoso, fecha a competição por prêmios Candango no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro deste ano. Assim como tem acontecido com todo o evento, o longa será transmitido no Canal Brasil, a partir das 23h.

“As pessoas dizem que ele é o mestre do terrir, a mistura de terror com comédia. Mas, no caso do Ivan, há assinatura completamente autoral: ele vem como pornochanchada e ainda tem a Tropicália incluída, que é um movimento único brasileiro. Então, difere de todo o terrir do mundo”, observa o cineasta. Com Ivan, o TerrirVel, Abbade conquistou prêmios até em Sitges (Barcelona), centro mundial para produções sobrenaturais e fantásticas.

Tendo por referenciais obras como o terror de Zé do Caixão (José Mojica Marins) e peças das artes plásticas de Hélio Oiticica, aos 68 anos, o carioca Ivan Cardoso, que fez barulho ao lado de personalidades como Waly Salomão, Rogério Sganzerla e Júlio Bressane, promete protagonizar uma gama de comédia, na nova fita potencializada pelo caldo dos filmes B.

Entrevista // Mario Abbade 

Como se aproximou e estabeleceu confiança com Ivan Cardoso para fazer Ivan, o TerrirVel?

O estabelecimento de confiança não foi muito difícil. Tudo por causa do filme sobre o Neville D’Almeida, meu primeiro longa-metragem, Neville d’Almeida: Cronista da beleza e do caos, em 2018. Ivan assistiu, gostou e se sentiu seguro de me ter como diretor para contar a história dele. No filme de Neville, tem certos filmes dele que se perderam. O Ivan Cardoso, que era mais jovem, quando começou a fazer cinema, fez muito making of. Pegava a câmera dele super 8 e ia filmar o que os caras mais velhos estavam filmando. Eu sabia que ele tinha cenas dos filmes perdidos do Neville. Deixei para colocar muita coisa neste novo filme, porque sabia que Ivan tinha feito filmes sobre outros diretores. Foi lá que meti na cabeça: “Vou fazer um filme sobre o Ivan Cardoso para mostrar coisas que o público não sabe”. As pessoas acham que ele é só As sete vampiras, O segredo da múmia, O escorpião escarlate e Um lobisomem na Amazônia. Mas, não. Ele é um grande fotógrafo. Tirou fotos para capas de discos importantíssimos para o Caetano Veloso, para o Gilberto Gil, para o Raul Seixas. A capa do Fa-tal – Gal a todo vapor é dele! Isso sem dizer que ele é artista plástico.

Que resposta tem obtido com o filme?

O filme nunca foi exibido no Brasil. Ele participou de 11 festivais internacionais. Chegou a ganhar quatro prêmios internacionais, inclusive foi o melhor documentário no festival mais importante e relevante de cinema fantástico do mundo, além de ser o mais antigo. Ganhamos prêmio de montagem no festival de Londres. Ganhamos dois prêmios na Califórnia. O filme está com uma carreira internacional muito boa. Continua sendo convidado e exibido lá fora.

Você teve acesso a trechos de filmes do Ivan e como trabalhou o material inédito cedido?

Ivan cedeu várias coisas inéditas: ele é impressionante, ele guardou tudo que ele fez na vida, até mesmo o que ele não acabou. Curtas que começou a filmar, projetos de longas. Ele é uma pessoa muito imagética, tudo ele pega uma câmera e filma. A gente teve acesso completo e cedeu todo o material inédito que ele tem. Até coisas pessoais, como festas de aniversário. Ele não fez nenhum tipo de restrição. O filme tem um videografismo muito importante. Tentei fazer tudo no estilo da assinatura visual dele. Muitas vezes, o documentário do Ivan parece um filme do Ivan Cardoso. É a melhor maneira de a gente exemplificar.

De onde veio o interesse pela figura dele? Ele é constantemente engraçado? Como buscou originalidade na abordagem?
Quando descobri que o Ivan tinha esse material sobre o Neville, ele me disse: tenho material sobre vários cineastas brasileiros, como o Joaquim Pedro de Andrade e vários outros. Descobri um material incrível. Ninguém sabia que ele tinha: ele estava filmando o que os diretores estavam filmando. Eu disse: “Quero fazer um filme sobre isso”. Obviamente que não é sobre isso. É sobre a vida do Ivan, sobre os filmes e as fotografias. Ele fez curadoria de festival de terror! Ele fez muita coisa na vida, nunca parou, é um cara irrequieto. Ele tem esse humor mesmo: um cara engraçado, por natureza. Brinca, faz muita piada, faz piada sobre ele mesmo, sobre a vida, sobre a morte. Não quer dizer que não seja uma pessoa séria. Não tem como você ficar 10 minutos conversando com ele sem rir. O jeito dele ajudou muito o filme. A grande força do meu filme é exatamente a coisa do humor, de você levar nem tão a sério as coisas. Algo que o Woody Allen faz muito bem. O documentário tem uma montagem muito boa. Ganhamos até prêmio. Sem roteiro para a montagem, ela não aconteceria. O cinema é processo coletivo. A pessoa retratada tem que dar liberdade, confiança, e se entregar. Tudo faz parte de um processo.

A nova geração de espectadores conhece a história de Ivanele? Ele anda esquecido ou permanece?

O Brasil — a gente sabe é um clichê, mas é a verdade é um país sem memória. A gente esquece muita coisa. Agora os estudantes de cinema, os cinéfilos, pessoas que são apaixonadas por cinema sabem quem é Ivan Cardoso. Reconhecem quem são os grandes cineastas. O cinema do Ivan Cardoso para quem estuda cinema e para quem é cinéfilo nunca vai morrer. O grande público, às vezes, não associa o nome à pessoa. Quando fiz o filme do Neville D’Almeida, por exemplo, falava: quem é o sujeito? Quando falava A dama do lotação, Rio Babilônia, todo mundo sabia. Que é o mesmo caso do Ivan. Mas, quando se fala As sete vampiras, dizem: “Vi, é engraçado, tem a música do Léo Jaime”. É o mesmo caso de A dama do lotação — todo mundo pensa na Sônia Braga. Isso acontece no cinema americano, também. Muitas vezes, as pessoas não sabem que tem um grande diretor por trás de um filme. Por exemplo, todo mundo conhece Casablanca, todos conhecem Humphrey Bogart e Ingrid Bergman. Mas, não sabem que quem escreveu aquilo, dirigiu e fez foi o Michael Curtiz. Agora, estudantes de cinema, cinéfilos sabem que é Michael Curtiz. O grande público sabe o que é Casablanca.

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