Para celebrar o Dia do Quadrinho Nacional, comemorado neste sábado, o Diversão&Arte fez uma seleção de lançamentos do gênero, novidades que estão disponíveis on-line no site de editoras e livrarias e também em formato e-book. Instituída em 1984, a data comemorativa celebra a publicação de As aventuras de Nhô Quim ou Impressões de uma viagem à corte. A HQ foi publicada em 30 de janeiro de 1869 na revista Vida Fluminense e inaugura a trajetória dos quadrinhos no Brasil.
O ilustrador Fido Nesti tinha 13 anos quando leu 1984, de George Orwell, pela primeira vez. Coincidentemente, era o ano de 1984, e a ditadura no Brasil chegava ao fim. “Lembro-me que já foi uma leitura bem chocante, impactante, porque, de certa maneira, fazia perceber o que estava acontecendo: era o final da ditadura militar e se sentia um paralelo com a história do livro”, conta. Ao reler o romance para realizar a adaptação para quadrinhos, que a Companhia das Letras acaba de lançar, Fido ficou surpreso: “Achei interessante reler depois de tanto tempo, porque foi ficando mais próximo ainda da realidade”.
O romance de Orwell descreve uma sociedade extremamente vigiada e controlada por um estado autocrático, que pretende ter domínio até mesmo sobre os sentimentos de seus cidadãos. A individualidade é desencorajada, o que se entendia como verdade é substituído por ideias que favoreçam os dirigentes e os relacionamentos interpessoais são apontados como crimes. O governo se empenha, inclusive, na criação da “novalíngua”, uma experiência na qual novas palavras são criadas e sentidos de vocábulos antigos são invertidos na tentativa de realizar uma lavagem cerebral em massa.
No ano de 1984, não havia internet, smartphones, câmeras de segurança espalhadas em todos os cantos nem redes sociais. A tecnologia, muito presente no livro, ajudou a distopia de Orwell a se aproximar da realidade do século 21, quando a vigilância e o compartilhamento da vida privada são cada vez mais comuns. “Enquanto adaptava o livro, lembro de um dia estar pensando em assuntos do governo atual e ficar com o semblante meio pesado e, ao entrar no elevador, por alguns segundos, olhar para câmera e pensar em mudar expressão facial”, conta Fido. No romance, as câmeras vigiam até mesmo os sentimentos expressos nos rostos dos personagens, que podem se encaixar em modalidades como “pensamentocrime” e “rostocrime”, neologismos criados por Orwell para a novalíngua, um dos instrumentos de controle da sociedade em 1984.
Para as ilustrações, Fido Nesti escolheu um universo econômico de cores, com variações de cinza e vermelho. “Essas cores combinam bem com uma distopia, uma coisa mais pesada. Imaginei uma Londres que é de 1984, mas um 1984 atrasado, distópico, ainda cheio de fábrica e fumaça de carvão. E tem muito da arquitetura brutalista, que combina com os ministérios”, explica. Os tons de vermelho ajudam a criar o clima de pesadelo presente em todo o romance.
Uma das condições dos herdeiros de George Orwell era não haver mudanças no texto. As frases que orientam o ilustrador vieram diretamente do romance. “Não inventamos nenhuma palavra, é superfiel, eu meio que me comparo com um montador do filme. Isso foi um grande desafio: escolher o que mostrar com o texto, o que mostrar só com imagens, o que mostrar só com um ou com outro, porque é um volume considerável para adaptar. O texto é tão brilhante que é difícil cortar aqui e ali em alguns trechos”, conta Fido, que também fez questão de manter os 24 capítulos originais do romance. Essa é a primeira adaptação de 1984 para quadrinhos e fez tanto sucesso que já foi vendido para mais de 20 países.
Passeio com Harari
É um passeio guiado pelo historiador Yuval Noah Harari que os ilustradores David Vandermeulen e Daniel Casanave propõem em Sapiens – O nascimento da humanidade. A adaptação em quadrinhos do livro que vendeu mais de 16 milhões de exemplares ao redor do mundo é um convite para explorar os meandros da evolução humana de maneira bem-humorada e lúdica.
Sem perder a ironia de Harari, que consegue dar um tom palatável a temas áridos como biologia, física e química, a HQ pontua os momentos mais intrigantes do livro, mas também aqueles mais didáticos, que servem de introdução para compreender questões complexas do desenvolvimento da espécie humana. Para dar vida ao roteiro, os ilustradores criaram um conjunto de personagens. A professora e bióloga Saraswat, o Bill Pré-Histórico e o detetive Lopez levam ao leitor por esse roteiro que tem de reality show a mergulho em arte e filme.
O belga David Vandermeulen é um especialista em quadrinhos de não ficção. Responsável pelo roteiro desse primeiro volume de Sapiens — seriam quatro, segundo o artista — ele também foi um dos idealizadores da série La petite bibliothèque des savoirs (“A pequena biblioteca dos saberes”), coleção de quadrinhos sem tradução no Brasil e que tem como proposta ajudar os jovens a compreender várias áreas do conhecimento humano. Harari também participou da adaptação de Sapiens junto aos ilustradores. Em entrevista a um canal francês, Vandermeulen conta que o historiador ajudou nas anedotas e que a linguagem dos quadrinhos contribui para tornar mais simples alguns temas muito espinhosos, como o da própria evolução.
Personagem solitário
Um cachorro perdido, um colono que retorna à terra, um robô desorientado. O guardinha que patrulha a Lua precisa conviver mais com a solidão do que com possíveis contravenções na HQ Guarda lunar, que a editora Todavia lança em 5 de fevereiro. Assinada por Tom Gauld, cultuado quadrinista da ficção científica, o livro acompanha um personagem que, aos poucos, se vê abandonado na paisagem lunar enquanto as poucas formas de vida ali existentes são retiradas e devolvidas à Terra. Se a depressão e a solidão são alguns dos temas de Gauld, há também uma certa esperança nas histórias do artista. Nessa HQ, um encontro improvável marca a narrativa, sempre pontuada por um desenho muito simples e econômico.
Ficção medieval
Publicado por Frank Herbert em 1965 e um clássico da ficção científica, o romance Duna ganhou as tirinhas graças ao filho do autor. A adaptação se mantém fiel ao texto e à narrativa na qual clãs formados por famílias que dominam o universo se preparam para conquistar os planetas espalhados pela galáxia. Brian Herbert, filho de Frank, também ajudou a criar prequels e spin offs da série de cinco volumes de Duna. Na HQ, ele contou com os ilustradores espanhóis Raúl Allén e Patricia Martín, responsáveis por elaborar uma escala cromática que acompanha a narrativa em seus diversos núcleos. Esse é o primeiro volume da adaptação do romance, que também vai virar série sob a direção de Denis Villeneuve com Timothée Chalamet no elenco.
» Feirinha de HQ
Para celebrar o Dia do Quadrinho Nacional, comemorado hoje, a Galeria de Arte Oto Reifchneider realiza uma feirinha com venda de HQs assinadas por nomes como Angeli, Laerte, Glauco, Adão Iturrusgarai, Fernando Gonsales, entre outros. Na plataforma Social Comics, o foco será a história dos quadrinhos no Brasil com o lançamento do piloto de uma série de minidocumentários que estarão disponíveis no canal do YouTube e no Facebook. Mais de 20 artistas deram entrevistas para a série, que será lançada hoje, às 14h.
» Dia do Quadrinho
Hoje, das 10h às 18h, na Galeria de Arte Oto Reifchneider (302 Norte, bloco E loja 41 – virada para a residencial). Acesso livre. Informações: (61) 9 9906-3317 e (61) 9 8168-4293 ou livraria@escritorioarte.com.
Duna – Volume 1
De Frank Herbert. Adaptado por Brian Herbert e Kevin J. Anderson. Ilustrado por Raúl Allén e Patricia Martín. Intrínseca, 176 páginas. R$ 34,90
Guarda Lunar
De Tom Gauld. Tradução: Hermano Freitas. Todavia, 96 páginas. R$ 54,90
Sapiens – O nascimento da humanidade
Yuval Noah Harari, David Vandermeulen e Daniel Casanave. Tradução: Érico Assis. Quadrinhos na Cia., 248 páginas. R$ 69.90
1984
De George Orwell. Ilustrações: Fido Nesti. Tradução: Alexandre Hubner e Heloisa Jahn. Quadrinhos na Cia., 224 páginas. R$ 84,90
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