CINEMA

Cinéfilos contam como adaptaram a rotina em meio à pandemia

Em meio a tantas mudanças ocasionadas pela pandemia, o Correio ouviu cinéfilos que contaram como têm acessado produções, na busca pelo entretenimento da sétima arte

Rever um estilo de filmes que o comove levou o professor de educação física Wendell Barbosa, 33 anos, à solução de um problema. Cinéfilo, ele não tem frequentado as salas, mas canalizou a vontade da diversão com os filmes assistidos em casa. “A pandemia nos obriga a não ir”, destaca. Mas, uma maratona na telinha da tevê ajuda Wendell a manter a paixão pela sétima arte. “Gosto muito de assistir a filmes dramáticos; algo que estimula a busca de significado na vida e no cotidiano”, observa. Daí, ele optou por rever uma lista de filmes, como Nasce uma estrela, Em busca de um milagre, A culpa é das estrelas, A última música e Se eu ficar. A meta de Wendell ao reconectar com as produções dramáticas, e que se mistura ao gosto fantasioso por sagas que vão de Os Vingadores a 50 tons de cinza, reflete a diversidade de opções dos espectadores ouvidos pelo Correio para decifrar como anda a rotina dos cinéfilos da cidade, apesar da pandemia. Confira!

» Ana Falcão

De olho em mostras virtuais

Se ainda guarda ótimas lembranças do pré-pandemia, quando assistia a quatro filmes por dia, no Festival do Rio, a tradutora e revisora aposentada Ana Falcão, por meio das transmissões on-line e do acesso a links de filmes, segue impulsionando a rotina diária de acompanhar ao menos um filme por dia. Entre “boas transmissões” do Metropolitan Opera (Nova York) e o ciclo Beethoven propiciado pela Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, Ana reserva espaço na agenda para os filmes.

Além da atenção dispensada às mostras virtuais de embaixadas como Polônia, Rússia e Itália, Ana, que maratonou filmes da Mostra de São Paulo, conta com a assinatura do Mubi e do Belas Artes a la carte, e acrescenta ser espectadora da Netflix. “Na Netflix, assisti ao feel good movie La vita davanti a sé, com Sophia Loren. Não tem aura de um cult, mas agrada. Antes havia sido filmado com a Simone Signoret, com uma interpretação bem teatral. Agora, adaptaram o romance, dando ênfase a temas como drogas e imigração ao sul da Itália”, comenta Ana.

» Indicações

O homem que surpreendeu todo mundo
“É um filme russo bastante ousado. Trata de um pai dedicado que descobre uma doença sem cura. Ele se veste de mulher, numa espécie de escapismo; noutra personalidade busca fuga”

Corpus Christi
“É uma produção polonesa que traz enorme crítica à Igreja. Um homem preso, com o desejo de ser padre, chega ao interior com ideias muito avançadas”

I basilischi
“É um longa da Lina Wertmüller, o primeiro, de 1963, quando ainda era assistente de Federico Fellini. Mostra o sul da Itália, com moços sem empregos, zanzando, e sem perspectivas. Passado o tempo, um deles retorna ao local para as férias e para descobrir a beleza da tranquilidade”

» João Lucas

Escolhas que emocionam

Em meio ao trabalho no segmento administrativo do Conselho Regional de Medicina, o jovem João Lucas Santana, 23 anos, contornava a rotina com as idas regulares de três vezes, por semana, ao cinema. Mas, isso era antes da pandemia. Agora, vai às salas eventualmente. Lá, conferiu produções como Tenet, Mulher-Maravilha 1984, Mank e a nova versão de Francis Ford Coppola para a terceira parte de O poderoso chefão, Lucas dá preferência ao espaço Itaú de Cinema. “Sem muita gente e sessões com espaçamentos, durante a semana. Além disso, opto pelo atendimento on-line”, conta.

No terreno do streaming, a Disney+ ter lançado Soul foi surpreendente, na visão de Lucas. “É um filme que se gostaria de ver na tela grande. Acho que, com ele, a Pixar reencontrou a criatividade e o jeito certo de contar histórias, emocionando. Conferi, numa sessão da meia-noite em casa e sem a vergonha de segurar o choro no cinema. Eu me emocionei de verdade”, admite o espectador que ainda lembra do primeiro filme visto no cinema: a animação Dinossauros, há 20 anos.

A onda de baixar filmes pela internet supera o entusiasmo de João Lucas com o streaming. Ainda que confira as atrações da Amazon Prime Video e da Netflix, ele costuma baixar obras de repercussão limitada ou caráter independente, filmes como First cow e Drunk. No Amazon Prime Video, porém, pode conferir peças raras como o longa A vastidão da noite. “É uma grata surpresa de um filme indie que ganhou alcance maior graças ao poder de transmissão do streaming em um gênero pouco visto nos cinemas, que é o terror de ficção científica”, avalia.

» Indicações

Os 7 de Chicago
“Vi na Netflix. É do diretor e roteirista, Aaron Sorkin, responsável por roteiros marcantes como os de A rede social e a cinebiografia de Steve Jobs. Ele consegue ter a mesma identidade e ritmo da sua escrita ao investir na direção”

Mank
“David Fincher (o mesmo de Clube da luta e Garota exemplar) é o diretor e ele revisita e homenageia uma das obras mais clássicas do cinema que é Cidadão Kane (1940). Foge, assim, totalmente do suspense de sua filmografia”

» Túlio Villafañe

Perspectiva satisfatória

“Sinto falta do cinema”, admite o produtor cultural e escritor Túlio Villafañe, 32 anos, que acredita atualmente ser um luxo nada fundamental a ida às salas de cinema. “Antes da pandemia, ia de três a quatro vezes por semana, com meu namorado Michel”, comenta. Mulan, A dama e o vagabundo e Soul estão na lista de filmes com “cara de cinema”, que foram assistidos em streaming, por Túlio, que conta com serviços da Netflix, HBO+, Disney+ e da Amazon Prime Video. “A experiência não é a mesma. Preferia ver no cinema, mas tá válido. Vejo muito filme e série, pela facilidade. Vivemos este período de muito estresse. O streaming tem forte quantidade de ofertas”, opina Túlio, atualmente, no dia a dia do home office.

» Indicações

Soul
“Disponível na plataforma da Disney, tem uma sensibilidade única. Parece uma resposta e um remédio para a alma frente ao problema
da pandemia”

Mulher-Maravilha 1984
“É um filmão para tela grande e que vi nessas circunstâncias”

» Giselle Coutinho

Visão concentrada

Ainda hoje, a servidora pública Giselle Coutinho, 38 anos, sente saudades das idas no antigo complexo de cinemas desativado da Academia de Tênis, no Setor de Clubes. “Sempre gostei do fator tranquilidade ao assistir a um filme. Nas grandes redes de cinema, a meninada conversa muito”, opina Giselle, que curte filmes, ao lado da esposa Letícia, num apartamento do Sudoeste. Antes da pandemia, ela conseguiu organizar um quarto tomado por colchão “de parede a parede” e uma telona de 55 polegadas. Sempre interessado pela pipoca, o yorkshire Ollie tenta roubar a atenção dos filmes do catálogo da Netflix e da Amazon Prime Video.

Com as saídas para rua muito espaçadas, Giselle tem aproveitado para colocar em dia a demanda de “500 filmes que esperava ter tempo para ver algum dia”. Acostumada a catalogar, mês a mês, o que assiste, com direito à classificação em estrelas de zero a cinco, Giselle tem aproveitado para rever clássicos como Os Goonies e Tubarão. Isso ao lado de atrações como a série Superstore, num momento de alívio para a realidade em que, como opina, “o noticiário está pesado demais”.

» Indicações

Uncle Frank
“Um tio de família interiorana é visto como dissidente e ele vem a incentivar a sobrinha a buscar o mesmo: partir para construção de maiores oportunidades. Já em Nova York, ela perceberá o conflito dele, gay, de sair ou não do armário, perante os parentes”

Borat: Fita de cinema seguinte
“Acho o humor fantástico. Politicamente, inova ao revelar fatos improváveis aliados à extrema direita conservadora norte-americana. Mesmo como cenas reais, quase não acreditei no que vi”

» Carlos Augusto de Castro

Olhar com filtro

O analista de sistemas Carlos Augusto de Castro, 51 anos, não tem coragem de voltar às salas de cinema e prefere, neste momento, a programação montada nas plataformas Netflix, Amazon Prime e Apple TV. “Tenho, ainda, o on demand da Net. Sinto falta do cinema, embora tenha uma tevê de 70 polegadas. O bom é poder deixar o streaming por outra coisa, quando o filme não atende a expectativas”, comenta.

» Indicações

Emicida: AmarElo — É tudo pra ontem
“Nunca gostei de rap ou hip-hop, mas este documentário dos bastidores do show mudou minha ideia, ao mostrar que a música da periferia é carregada de desabafos, gritos de socorro e orgulho de serem quem são. Excelente!”

Greyhound
“Um filme rápido e ágil, coisa nem tão comum em filmes de guerra. Escrito e estrelado por Tom Hanks. Não é profundo como 1917 ou Dunkirk, mas a excelente atuação e a história fazem ser perfeito para assistir em casa”.

Arquivo Pessoal - Ana Falcão
Cinefilo/Divulgação - João Lucas
Cinefilo/Divulgação - Túlio Villafañe
LUIS TAJES - Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
Marcelo Ferreira/CB/D.A Press - Carlos Augusto de Castro