MÚSICA

No Dia Mundial do Rock, artistas defendem protagonismo do estilo em Brasília

Maduro, o gênero disputa a preferência de públicos jovens, e luta para se conectar com as realidades que podem alimentar o espírito contestador

Em 13 de julho de 1985 acontecia o festival de música Live Aid, com shows simultâneos em Londres, na Inglaterra, e na Filadélfia, nos Estados Unidos. O objetivo do evento era combater a fome na Etiópia e contou com diversos nomes reconhecidos do rock, como Led Zeppelin, Queen, David Bowie, Elton John, entre outros. Phil Collins, um dos artistas convidados, chegou a declarar publicamente que a ideia era que o dia 13 de julho se tornasse o Dia Mundial do Rock, feito obtido com sucesso. O estilo remonta aos idos de 1950, Elvis Presley massificou o ritmo, mas de lá pra cá, muita coisa mudou. De um som típico de adolescentes, o rock fidelizou públicos de todas as idades e em todo o planeta. Tanto que em Brasília, por exemplo, se tornou um traço da história e cultura locais e é por isso que neste dia 13 de julho, o Correio traz algumas percepções de artistas da cidade e do cenário nacional sobre como o gênero musical sessentão viceja na capital federal e no país.

O ceilandense Ari de Barros é uma das figuras que conhece bem a trajetória do rock em Brasília. Na verdade, como um dos fundadores do tradicional Festival Revolução e Rock (Ferrock), que dá nome à praça onde ocorreu a primeira edição do evento, ainda em 1986, no P Norte, Ari tem sua trajetória pessoal e profissional entremeada pela evolução da música no DF. Atuando como produtor musical, ele reclama de quem diz que a história local começou a partir do Aborto Elétrico, nos anos 1980. Para ele, Matuskela, Os Quadradões, Os Primitivos e Elson 7 são alguns dos nomes que ele considera como precursores do rock brasiliense ainda nos anos 1960 e 1970.

Ele analisa que esses grupos já se espelhavam no fenômeno do momento. Internacionalmente, os Beatles estavam no ápice e no Brasil, quem dava o ritmo era a Jovem Guarda. A banda Matuskela começou a embalar bailes e festas da cidade em 1967. Segundo Anapolino, guitarrista e fundador da banda, Matuskela foi a primeira banda brasiliense a gravar um LP totalmente autoral.

O álbum em questão leva o mesmo nome da banda e foi lançado em 1973. Lino, como é mais conhecido na cena, confessa que tem sido procurado por gravadoras para um relançamento da obra. Na internet, é possível encontrar exemplares do LP no valor de até R$ 4.700 para venda. Apesar de considerar Brasília a capital da música, pela diversidade de ritmos, o guitarrista vê problemas atualmente. “O rock não está conseguindo acompanhar as novas linguagens da juventude. Está defasado”, define.

Que país é esse?

Nos anos 1980, o rock dominou o cenário musical do país com bandas que cantavam letras influenciadas pela situação política e social da época, no contexto da ditadura militar. Na capital, foi o momento da formação de grupos que construíram carreiras sólidas e que ressoam até os dias de hoje. “Isso veio do inconformismo e da inquietação de uma juventude aqui em Brasília”, opina Philippe Seabra, vocalista e guitarrista da banda Plebe Rude, que nasceu em 1981 como um grupo de punk rock com várias críticas sociais nas composições.

A banda Capital Inicial também surgiu nesse cenário com os irmãos Fê e Flávio Lemos, após o encerramento do grupo Aborto Elétrico, no qual os artistas participavam ao lado de Renato Russo e André Pretorius. Com 15 álbuns de estúdio, Dinho Ouro Preto, os irmãos Lemos e Yves Passarel seguem até hoje com o grupo. “É difícil saber exatamente a importância do seu legado, o que a gente vê hoje é que, passados tantos anos, essas canções todas da nossa geração continuam vivas. Elas fazem parte da memória afetiva dos brasileiros”, declara Dinho Ouro Preto sobre o reflexo do Capital Inicial em outras bandas brasilienses.
Perguntado se ainda considera Brasília a capital do rock no Brasil, Ari de Barros, fundador do Ferrock é enfático: “Absolutamente sim! Ainda temos um número expressivo de festivais voltados para o gênero. Acho que deveria haver uma organização para que produzíssemos um catálogo com todos esses eventos. Brasília tem potencial para ser um polo turístico do rock”, argumenta.

Música que permanece

Paulo Veríssimo, integrante da Quatro estações — considerada uma das maiores bandas cover nacional da banda Legião Urbana — acredita no poder dos grupos de Brasília para o cenário do rock nacional. “Essas bandas são muito importantes porque elas abriram o caminho para todas as outras que vieram depois. Elas ainda existem, a Legião é cultuada até hoje, os Paralamas e Capital estão na ativa, além de Plebe Rude, Raimundos. Graças a essas bandas, o rock brasileiro se fortaleceu muito e eu acho que elas vão durar por muito tempo”, declara Paulo. Além do grupo cover, o artista possui outros projetos autorais, como a banda Distintos Filhos, com mais de 15 anos e dois discos lançados, e a Rockália, que mistura o ritmo do rock com o carnaval.

A banda Rock Beats também está presente no cenário brasiliense há 16 anos e aposta na mistura entre covers de sucessos do gênero e composições autorais. Daniela Firme, vocalista do grupo, acredita no objetivo de trabalhar com disciplina para renovar o rock e mostrar novos talentos. “Na pandemia, a gente está gostando muito de reunir pessoas do Brasil inteiro que gostam de rock. Assim, por meio das lives, nós levamos música para a casa das pessoas com uma boa frequência e com o esforço de trazer novidades. Nosso objetivo é fazer um trabalho com consistência para mostrar a nossa qualidade musical, de composições e muita vontade de levantar as bandas de rock”, afirma Daniela. A Rock Beats realizará uma live em comemoração ao Dia Mundial do Rock, neste sábado, às 17 horas, no canal do YouTube da banda (@ontherocksdf).

*Estagiários sob a supervisão de Juliana Oliveira

Autocrítica

Vocalista do Detonautas Rock Club, Tico Santa Cruz enxerga algumas urgências para o rock nacional. Para o artista, o rock corre risco de virar um gênero elitizado, principalmente porque não está havendo um diálogo com a juventude, que é, segundo ele, quem dá o gás para o sucesso. Outro ponto levantado pelo cantor é que muitos rockeiros não se enxergam como classe trabalhadora e acabam se identificando com uma elite mais conservadora. Para ele, essas características explicariam a guinada do gênero para a direita do espectro político no Brasil. “Se o rock não se renovar, com a adesão de pessoas LGBTQI+, mulheres, pretos e periféricos, ele vai se afastar cada vez mais do público. Nas plataformas digitais já vemos que o rock está bastante segmentado. Não está sendo um bom momento para o gênero no Brasil”, pondera.
Tico está na leva de grupos nacionais que têm alinhado suas músicas com discursos políticos mais contundentes. Com críticas ao atual governo, lançou o single Roqueiro reaça, uma crítica aos roqueiros reacionários que, segundo o vocalista, proliferam dando voz a “autoritarismo e a negação”, como diz a letra da música. A faixa está incluída no politizado Álbum Laranja, que vai ser lançado pela banda em 23 de julho.

*Estagiários sob a supervisão de Juliana Oliveira