LITERATURA

'É preciso romper com a ideia de que as mães são perfeitas', diz a escritora Pilar Quintana

A autora concedeu entrevista à AFP no domingo, horas antes de apresentar o romance na Feira do Livro de Miami

Agence France-Presse
postado em 16/11/2021 12:29
 (crédito: Eva Marie UZCATEGUI / AFP)
(crédito: Eva Marie UZCATEGUI / AFP)

Em seu último romance, "Los abismos", a escritora colombiana Pilar Quintana (Cali, 1973) conta a história de uma menina que descobre a conflituosa realidade do casamento dos pais, uma reflexão sobre a infância e a maternidade com a qual conquistou este ano o prestigioso Prêmio Alfaguara.

A autora concedeu entrevista à AFP no domingo, horas antes de apresentar o romance na Feira do Livro de Miami.

PERGUNTA: Como surgiu a ideia de "Los abismos"?

RESPOSTA: Queria desafiar essa noção que temos de que a infância é o período mais feliz da vida, porque me parece que não é totalmente verdade, mas que é um período com complexidades, como todos os outros. Queria refletir sobre aquele momento da vida e, acima de tudo, explorar meus próprios medos de criança.

P: O romance mostra aquele momento em que os filhos descobrem que seus pais não são tão perfeitos quanto pensavam. Era um assunto que te interessava antes do romance?

R: Sempre me interessei em explorar a infância. Eu também sabia que tinha em meu íntimo um romance sobre o papel da mãe, mas quando comecei a escrever “Los abismos”, não sabia que seria aquele romance. Eu fui descobrindo aos poucos e tive que reinventar no caminho.

Quando refletimos sobre a maternidade, chegamos àquele momento em que a infância se rompe, se a descrevemos do ponto de vista de uma criança. Nossos pais são nossos heróis, mas há um momento na infância em que o véu começa a se rasgar e descobrimos que eles eram heróis com pés de barro, que não eram tão perfeitos ou tão maravilhosos quanto pensávamos.

P: Você descobriu alguma coisa sobre a maternidade enquanto escrevia?

R: Quando meu filho tinha três anos, achava que as palavras "mãe" e "mulher" eram sinônimos, e eu, uma mulher feminista, fiquei escandalizada. Mas, ao escrever o romance, descobri que eu era como meu filho. Julguei minha mãe do ponto de vista da filha, onde mãe é apenas uma pessoa que se entrega aos filhos.

Então, parei por um momento e comecei a ver minha mãe, pela primeira vez, como uma mulher complexa, com poucos privilégios. Uma mulher que cresceu em uma época em que os papéis de gênero funcionavam como uma camisa de força muito mais do que agora. Uma época em que as mulheres ambiciosas no trabalho eram vistas com maus olhos, pois seu papel principal ainda eram os filhos, o marido.

P: Foi importante quebrar a imagem da mãe perfeita?

R: Com certeza, porque acho que essa mãe só existe na fantasia. Nem eu nem minhas amigas mães somos assim. Nem minha mãe e minha avó. Elas eram mulheres imperfeitas, que o tempo todo lutavam para equilibrar os muitos papéis dentro delas. E eu acho que você tem que romper com essa ideia de que as mães são perfeitas e que a mulher é feliz e realizada só por ser mãe.

P: Essa ideia pode criar pressão para as mulheres?

R: Eu senti que a história sobre a maternidade que eles me venderam era falsa. Tiramos o negativo. A maternidade é luz, mas também está cheia de desafios, raiva e escuridão. Na maternidade, você descobre seus próprios monstros como nunca antes.

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