Casa Gucci

Filme de Ridley Scott debocha do clã Gucci

Com atuação de Lady Gaga, Casa Gucci traz a sagacidade do retrato nada ameno da classe endinheirada

Ricardo Daehn
postado em 25/11/2021 09:14
Lady Gaga domina cada cena de Casa Gucci -  (crédito: Universal/Divulgação)
Lady Gaga domina cada cena de Casa Gucci - (crédito: Universal/Divulgação)

Crítica // Casa Gucci ###

Estilo e sarcasmo

É quase uma sitcom o mais novo longa do diretor inglês Ridley Scott, que, aos 84 anos, se mantém em plena atividade. Baseado em livro de Sara Gay Forden, o filme teria desenho de drama pesado, uma vez que a trama é extraída da realidade em que vinganças e até assassinato sedimentam a passarela para o desfilar da crueldade por trás do mundo da moda. Esqueça o teor informativo de O império de Pierre Cardin, o colorido da trama de Yves Saint Laurent e o rigor do belo Coco Chanel & Igor Stravinsky. Casa Gucci traz uma disposição sarcástica de Ridley Scott em verter para cartoon e caricaturas as personagens nutridas a astúcia e excentricidades.

Adam Driver, na pele de Maurizzio Gucci, personifica o tolo e paspalho herdeiro de uma empresa que reluz a soberania dos remanescentes irmãos Rodolfo (Jeremy Irons) e Aldo Gucci (Al Pacino). Pacino brilha, ao dar vida ao bon-vivant e galhofeiro ricaço e que comporta a aura do ator sempre associado à saga de O poderoso chefão. Maurizio terá a vida entrecortada pela raposa vulgar Patrizia (Lady Gaga), clara alpinista social que se diz "muito sociável".

Com a gramatura das notícias de tabloide será costurado um escândalo que embala a empreendera família, desenhada, no filme, com a heresia de se comparar ao Vaticano e até entrar como trindade da execução do sinal da cruz (ao lado "do Pai e do Filho"). Os excessos comportamentais que aproximam o clã Gucci estão
bem canalizados na lunática figura de Paolo (Jared Leto, que entrega mais um overacting), uma espécie de expurgo da fábrica de estilo fundada nas relações familiares.

Sempre versátil, com filmografia estabelecida no desenvolvimento de histórias futuristas, bélicas e policiais, além da investida em fitas de época, Ridley Scott se sobressaiu no drama da cinebiografia Todo o dinheiro do mundo (2017), distante do resultado de Casa Gucci. O chique ostentado pela disputa de "coroas ou terras", em certas castas e dinastias, como bem descreve uma das personagens, no caso dos Gucci, é trocado pela disputa "pela pele" — o negócio de família estará, portanto, ameaçado por enxertos no clã como Patrizia.

Curiosamente, ao falar de poder, rede de falsificação e conquistas de mercado, Casa Gucci rende boas oportunidades para coadjuvantes, caso de Salma Hayek, que assume Pina, vidente adotada como guru por Patrizia, e Domenico (Jack Huston), um advogado onisciente. Outro grande acerto do filme de Ridley está na escolha de músicas da estatura de Baby, can I hold you?, Faith (calibrando irônica cena na Igreja) e ainda dançantes peças de Eurythmics e Donna Summer, tudo mesclado a trechos de ópera.

Ainda no imaginário musical, a estatura cênica de Lady Gaga (atriz de ponta em Nasce uma estrela) não se comprova com uma personagem plana e dona de enorme semelhança (física) com Marisa Tomei. Por fim, em Casa Gucci fica frustrada a perspectiva do retrato de uma moda que habite corredores de altos museus (como aspiraram os Gucci) ou dos encorpados dramas de cinema: na tela, a jornada do espectador tende mesmo ao entretenimento espalhafatoso e que tenha a cara do arremedo dos artigos de feira vendidos a preços bastante acessíveis.

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