REGIME MILITAR

'Não tem noção do que foi', diz Zezé Motta sobre quem pede o retorno da ditadura

A atriz se diz indignada com os movimentos pró-ditadura e relembra momento de violência vivido com grupo de extrema direita: "apanhei de verdade"

A atriz Zezé Motta mostrou indignação ao comentar, no programa Roda Viva, sobre os movimentos pró-ditadura que invadiram as ruas brasileiras nos últimos anos. A artista, que tem um passado de forte articulação política, com papel importante na criação do Movimento Negro Unificado (MNU), disse que quem pede a volta do regime militar “não tem noção do que foi” e diz que já apanhou de apoiadores do regime.

“Eu não consigo entender, não consigo entender. Eu fico indignada, é o único sentimento que sinto: indignação. Acho que quem fala isso é porque não tem noção do que foi a ditadura. Será que tem gente na minha idade, que viveu aquele tempo, que acha que foi melhor do que hoje?”, questiona incrédula e consternada. A declaração foi feita na noite desta segunda-feira (15/11), no programa da TV Cultura.

Zezé compartilhou um dos episódios de violência vividos na época do regime militar. Em 1968, a atriz estreou nos palcos do teatro justo em um espetáculo que foi símbolo de resistência contra a ditadura militar: o Roda Viva, de Chico Buarque. No meio da temporada, no Teatro Ruth Escobar em São Paulo, um grupo de extrema direita invadiu o teatro e agrediu a todos.

“Quando eu falo que apanhei (na ditadura), eu apanhei literalmente. Nós apanhamos literalmente. O teatro foi invadido por um grupo de extrema direita, Comando de Caça aos Comunistas, é como se chamava o grupo”, disse.

“Eu me lembro que estava saindo para ir para o meu camarim e só vi os cassetetes da Aeronáutica, pá pá pá, invadindo os camarins. Mas nós continuamos durante muito tempo em cartaz e depois fomos para Porto Alegre e lá foi proibido nacionalmente”, contou.


“Rezo todos os dias”: Zezé Motta afirma que governo Bolsonaro é retrocesso

Em sua biografia Zezé Motta - Um canto de luta e resistência, a atriz conta que foi no curso de teatro Tablado, do Rio de Janeiro, que ela se descobriu de esquerda. No auge da ditadura, ela via a opressão que os brasileiros viviam e tomou um lado.

Poucos anos depois do episódio no Teatro Ruth Escobar, ela não só continuou a lutar contra a ditadura, mas também incluiu a racialidade no combate. Foi uma das fundadoras do Movimento Negro Unificado, no início dos anos 70, e sempre declarou que busca conscientizar que o “o Brasil tem uma dívida com as populações negra e indígena”.

Ela participou de campanhas eleitorais e do movimento Diretas Já. Ao ser questionada por Vera Magalhães sobre como vê a situação política atual, a atriz deu um profundo suspiro antes de dizer que reza todos os dias para a situação mudar. “Ai, eu vejo com tristeza e rezo todos os dias para que haja mudança. É uma sensação de retrocesso, é uma sensação bem desconfortável, mas não podemos desistir”, disse.

Em novembro de 2020, Zezé já criticou, também, o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, que, apesar de negro, nega a luta contra a desigualdade racial. A atriz, que esteve presente na inauguração da instituição, declarou que Sérgio está no lugar errado.

“Eu nunca imaginei que, depois da ditadura, passaríamos por esse momento. Eu estive na inauguração da Fundação Palmares, em 1998, que nasceu em defesa da cultura negra. Sim, eu disse DEFESA! Esse homem está no lugar errado e como eu já disse uma vez, ele é um alienado”, disse.

No programa, Zezé também afirmou que lembra com carinho do passado político, mas que a luta continua. “Todos os movimentos que participei falavam de esperança, mudança para melhor. Foi prazeroso, mas a luta continua. É confortável você pelo menos tentar fazer alguma coisa para mudar seja o que for, para melhor. Mesmo que seja difícil, mesmo se você não sabe se vai chegar lá, não pode desistir. Perseverança, sempre falo isso para os mais jovens, temos que perseverar e não desistir do sonho”, convoca.

 

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