Cinema

Com atmosfera assustadora, 'Holy spider' encanta, no Festival de Cannes

Em competição na mostra oficial do Festival de Cannes, o filme dinamarquês Holy spider aponta as origens iranianas do diretor Ali Abbas

Soraya Ursine*
postado em 24/05/2022 11:50 / atualizado em 27/05/2022 10:39
A equipe de Holy spider, no tapete vermelho de Cannes -  (crédito: Soraya Ursine/ Diversão)
A equipe de Holy spider, no tapete vermelho de Cannes - (crédito: Soraya Ursine/ Diversão)

Admiração e aplausos vieram a partir da exibição do longa Holy spider, no festival de Cannes. O filme conta a história de um serial killer. inspirada em fatos reais transcorridos na cidade de Mashhad, no Irã. Um pai de família operário, ex-combatente no Iraque, fervoroso muçulmano, acredita ter como missão matar as prostitutas da cidade onde mora. Como um serviço de limpeza, ele passa as noites nos locais onde ficam, atrai as vítimas e as elimina.

O filme tem personagens que transgridem seus papéis sociais. O pano de fundo de um país dilacerado pelo regime, e uma sociedade corrompida estão em foco. A iconografia com tons de verdes, que para o Islã significa santidade, e o negro em alguns planos, para nos lembrar da obscuridade dos fatos, são linguagens visuais utilizadas pelo diretor.

Os crimes acontecem sem que a mídia ou a sociedade fiquem alarmadas, até que uma jornalista de Teerã chegue a cidade e, indignada pelo que vê, começa a desvendar a história. A personagem da jornalista no filme, interpretada pela atriz Zar Amir, também iraniana, em seu primeiro longa-metragem, é uma mulher forte que pediu justiça e se indignou pelo fato de que a população apoiava estes crimes. Na pele desta jornalista, Zar que passou pela área de produção em jornalismo em Paris, quando chegou exilada do Irã, e se inspirou em jornalistas amigas que conheceu neste período, conduz a enquete da história que todos sabiam, mas que a mídia ignorava. Em determinado momento, ela transgride o papel de jornalista e exige que as leis sejam cumpridas. Proibida de retornar ao Irã, Zar mostrou grande talento e compromisso com uma história que faz parte de sua vida.

Em coletiva, o diretor Ali Abbasi, que vive há mais de 20 anos na Dinamarca, enfatizou o caráter universal da história. Para ele, o filme foi construído a partir de fatos reais registrados no Irã, mas traz um enredo que se repete mundo afora. Mostrar a fome que cresce em seu país e a miséria nas ruas através destas mulheres que se prostituíam, e a sociedade sigilosa e cúmplice deste crimes é o mais importante.

Ele falou que não se trata da história de um serial killer, mas da narração de uma sociedade assassina.
O filme foi rodado na Jordânia, durante a crise sanitária, com muitos problemas para locação, visto que
o Irã não concordou que fosse rodado por lá. Na produção do filme, um brasileiro que começa a ganhar a cena internacional, Fred Burle, mineiro de Pirapora e que é morador de Berlin há 12 anos, atuando na área de produção com seu sócio Jacob Jarek, acredita no cinema independente e procura histórias como estas, e novos talentos.

O encontro dos amigos produtores com Ali Abbasi aconteceu em Cannes em 2018, e a partir daí, começaram a produzir o filme que, após muitas dificuldades para locação, acabou ganhando o tapete vermelho na mostra oficial de Cannes, com direito a aplausos da critica e do público.


O orçamento de 3,8 milhões de euros, que é considerado um filme de médio porte, para o cinema
independente europeu representa um valor importante. “Procuramos cinema inteligente, mas que possa sensibilizar um grande público. No cartaz, colocamos todos os elementos provocativos do filme, com a imagem de uma mulher, com maquiagem exagerada, coisa proibida no Irã, mas que existe e é escondido”, diz o brasileiro. Um dos objetivos do produtor é encontrar um projeto verde-amarelo que caiba no modelo dos filmes que produzem. “Mas a situação do cinema no Brasil é triste, tudo que se construiu nos últimos 20 anos foi por água abaixo, nos últimos três anos. Sem fomento, o cinema não acontece. Isso é no mundo inteiro, com exceção dos Estados Unidos, todo o cinema produzido no mundo recebe fomentos, o que não está acontecendo no Brasil. Temos esperança de que isto mude”, observa. O filme será distribuído na França, com o título As noites de Mashhad e, no Brasil, já está com distribuidor, mas sem data prevista para estreia.

*Especial para o Correio



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