Música

Banda Eddie traz som original de Olinda para o Chicão do Conic no sábado

Dos mangues de Pernambuco ao Planalto Central: neste sábado, às 21h, a banda Eddie deixa a lama dos mangues para aterrissar no caos da capital

Neste sábado, às 21h, a banda Eddie deixa a lama dos mangues para aterrissar no caos da capital. O grupo pernambucano se apresenta na festa Delírio, no espaço Chicão do Conic. Os DJs Ops, Kaká e La Ursa também abrilhantam a noite. Os ingressos estão à venda on-line.

No início dos anos 1990, um caldeirão cultural borbulhava nas vielas de Olinda. Em um encontro entre o antigo e o novo, o maracatu rural e o hip-hop, o frevo e as batidas eletrônicas, os jovens músicos da pequena cidade colonial adjacente ao Recife moldaram em lama uma corrente cultural que marcaria toda uma geração. Nascia o manguebeat. A ideologia revolucionária da nova leva de artistas olindenses extrapolou os limites da música e gestou um fecundo movimento de contracultura. Longe dos ares acadêmicos e elitistas, as ideias por lá confabuladas cheiravam a cerveja de boteco e a caranguejada. Os quatro cantos de Olinda testemunharam nomes como Chico Science e Fred Zero Quatro desorganizarem as estruturas pré-concebidas do que era cultura olindense e reorganizá-las em uma viagem psicodélica que brotava dos manguezais, passava pelo carnaval de rua e chegava à ficção científica. Entre os artistas emergentes da época, a banda Eddie, formada em 1989, tornou-se um dos representantes do movimento e chega a Brasília neste sábado para despejar o conteúdo do caldeirão que, ainda hoje, sobe fervura.

Fábio Trummer, vocalista e guitarrista da banda Eddie, relembra que o sentimento intimista de cidade pequena que pairava em Olinda colaborou para que o movimento desse liga e se espalhasse: "Não existia internet, nem celular nem nada. O sentimento era esse: a gente estava isolado ali. Mas, de repente, começou a surgir um monte de bandas e algumas pessoas muito talentosas". Entre os nomes que encabeçavam o movimento, estava Fred Zero Quatro, vocalista da banda Mundo Livre S/A, responsável por escrever o manifesto Caranguejos com cérebro, marco do movimento. Fred explora, no documento, as motivações dos artistas, a relação com a fauna e flora pernambucana e os interesses dos participantes: "Os mangueboys e as manguegirls são indivíduos interessados em hip-hop, colapso da modernidade, caos, ataques de predadores marítimos (principalmente tubarões), moda, Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo não virtual, sabotagem, música de rua, conflitos étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons e todos os avanços da química aplicados no terreno da alteração e expansão da consciência".

É impossível falar do manguebeat sem falar de Francisco de Assis França, o Chico Science. Baluarte do movimento, o artista era o rosto e o coração da nova música do Recife. Os dois álbuns lançados por ele com a banda Nação Zumbi, Da lama ao caos e Afrociberdelia, configuram em todas as listas que se propõem a elencar os melhores álbuns da história do Brasil. Chico teve a vida interrompida de forma precoce, em 1997, vítima de um acidente de carro, mas os anos ativos na cena olindense foram suficientes para entrar para história e marcar todos à volta, a exemplo de Fábio Trummer: "Ele projetou uma ideia de cena musical. Nos mostrou o que seria uma cena. A gente não conhecia. Não tinha vivência. Acima de tudo, Chico apresentava uma musicalidade fora da curva". Trummer rememora o clima vivido no início da banda e o prazer de estar ao lado de pessoas inspiradoras, como Science: "Foi genial. Foi o melhor ambiente pra gente começar com a banda. Era música autoral, música própria, com gente muito talentosa ao seu lado. Nós éramos amigos que ensaiavam no mesmo estúdio e se encontravam para sair e ir aos bares". Fábio, por fim, revela que deu depoimentos para um filme vindouro, ainda sem data prevista de lançamento, que deve levar a história de Chico Science às telas.

Durante a pandemia, Fábio Trummer deixou para trás as impressionantes estruturas de lama do Recife, passou um tempo em São Paulo e se instalou em Brasília. A esposa recebeu um convite de trabalho na capital e o artista viu na cidade uma oportunidade de dar uma infância tranquila para os dois filhos. Não foi a primeira vez, porém, que ele pisou por aqui. Em 1994, a banda Eddie veio à capital para tocar em um encontro de estudantes de arquitetura. Desde então, voltou várias vezes para tocar por aqui, mas nunca sem desbravar o conceito urbanístico pensado por Lúcio Costa. Quando veio morar, se encantou: "A gente passava pelo Eixão quando vinha fazer show, mas eu não sabia como funcionavam as superquadras. Quando cheguei aqui para morar, achei o esquema das quadras genial. Para mim, é como morar naqueles subúrbios americanos. Aquele lugar com gramado seguro. A minha sensação é essa". Fábio completa: "Eu queria oferecer para os meus filhos essa coisa de árvores, animais, passarinhos, formigas e besouros. Nos outros centros, é mais difícil. Eu ganho tempo de vida, porque eu desço do apartamento e dou de cara com um parque que fica literalmente na porta de entrada do prédio".

O ânimo para a apresentação de sábado se ampara na surpresa que Fábio Trummer teve ao descobrir a cena cultural local e a alma festiva dos brasilienses: "eu estou louco para tocar. Eu adoro o público brasiliense. Apesar de a cidade não ter praia, o povo tem o mesmo tipo de luz solar que a música da gente tem. O brincar, dançar". Apesar de há pouco ter trocado as ladeiras pernambucanas pelas avenidas planas da capital, Fábio é categórico ao afirmar: "Posso dizer que, dessa vez, nesse show, já me sinto em casa".

*Estagiário sob a supervisão de Severino Francisco

Show da banda Eddie

Dia 18 de junho, às 21h, no Chicão do Conic — 
Setor de Diversões Sul, Conjunto Baracat, Loja 29, Asa Sul. Ingressos on-line no site sympla.com.br.

 

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Clara Gouveira - Banda Eddie
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Clara Gouveira - Banda Eddie: o mangue beat aterrissa no Conic