
Crítica // Medusa ###
Filme de atmosfera, quase sem o fôlego de roteiro para sustentar um longa, a mais nova produção assinada por Anita Rocha da Silveira impressiona. Esteve na Quinzena dos Realizadores no Festival de Cannes (2021) e faturou prêmios de direção e filme no Festival do Rio. Com respeito, e sem ferir a fé de terceiros, Anita investe nos destinos das chamadas Preciosas do Altar, um unido núcleo dentro da Igreja sob a guarda do pastor (Thiago Fragoso, com forte poder de convencimento).
Curioso que Medusa chegue aos cinemas praticamente junto com o impecável Entre mulheres, já que tem pedigree similar. Subjacente a ambos títulos está um ideal de controle, e que, no caso de Medusa, traz a exigência de mulheres formatadas no padrão "bela, recatada e do lar". "Devotas e submissas ao Senhor", as personagens , não por acaso, habitam um filme com fortes contornos da leva de fitas de suspense dos anos de 1980. Há angústia latente no filme que aloja, ralo abaixo, crimes que tocam homofobia e feminicídio.
Mariana (Mari Oliveira) é a devota inserida num maquinário que arranja para a sociedade, moças reguladas e oprimidas. Ela, como muitas das cristãs, se compraz com as fofocas que cercam a figura da intrigante Melissa, cujo sumiço se explica pelo seu desgraçado
comportamento: agia como "carnaval", em plena Sexta-feira Santa.
Entre números musicais perfeccionistas, as jovens que reagem e regem onda de moralidade se descolam das "pessoas do mundo" e reprovam as "más conversações". Operam ainda na consolidada estrutura social — em que muitas buscam "casamento com homem de bem" — Michele (Lara Tremouroux, melhor atriz coadjuvante, pelo Festival do Rio), habilitada a ensinar as benesses de "uma selfie cristã". Entre seitas de beleza e outras que catapultam eleições no páis, Medusa — um símbolo mitológico associado a proteção e a salva-guada — paulatinamente se pronuncia. Instila a desobediência entre os exércitos de seres que acatam uma deplorável coreografia que se vale não apenas do sincronismo, mas ainda de movimentos apresentados nas narrativas do recente cinema grego.
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