Guedes descarta renda básica para todos os brasileiros

Ministro da Economia descarta implementação de programa para garantir rendimento mínimo a todos os brasileiros, diz que governo promoverá empregos e perde a paciência ao criticar a pressão de estrangeiros contra o país em relação à preservação da Amazônia

Marina Barbosa
Rosana Hessel
postado em 07/08/2020 06:00
 (crédito: Edu Andrade/Ascom/ME)
(crédito: Edu Andrade/Ascom/ME)

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse ontem que, dos 38 milhões de brasileiros em situação de vulnerabilidade que eram invisíveis para o governo — e que foram identificados com o programa do auxílio emergencial de R$ 600 —, apenas 6 milhões devem ser contemplados com o novo programa que está sendo elaborado para substituir o Bolsa Família. Com isso, o número de beneficiários deverá passar dos atuais 20 milhões para 26 milhões.

“O Brasil está tentando socorrer essas pessoas vulneráveis e estamos descobrindo que, dos 38 milhões de invisíveis, 6 milhões deles, pelo menos, realmente precisam de assistência social”, afirmou o ministro, na manhã de ontem, em videoconferência com estrangeiros organizada pela Fundação Internacional para a Liberdade (FIL), sediada em Madri e presidida pelo prêmio Nobel de Literatura Mario Vargas Llosa, que intermediou a palestra virtual.

Guedes não deu valores do novo benefício e fez questão de descartar um programa de renda básica universal. “Estamos desenhando um novo programa, mas ele não será de renda básica universal”, afirmou. “Vamos tentar ajudar os outros 32 milhões a conseguirem empregos em um novo sistema trabalhista”, acrescentou. Ele ainda criticou os encargos sobre a folha, voltando a classificá-los como “máquinas de destruição em massa de emprego”. E destacou que os recursos para o novo programa virão de fundos e programas que serão extintos.

O ministro disse que o governo pretende adotar medidas para promover emprego, mas não deu detalhes. Contudo, sinalizou que essa medida estaria atrelada ao novo imposto que ele pretende criar como compensação para a desoneração da folha de pagamentos. “Queremos substituir o imposto cruel sobre folha, mas não haverá aumento de carga tributária”, respondeu Guedes, ao ser questionado por Llosa sobre o assunto.

O novo tributo para operações digitais é parecido com a antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e, na véspera, o ministro recebeu um recado bem claro dos parlamentares, durante audiência pública da comissão mista da reforma tributária: o novo imposto precisa ser melhor explicado, mas não terá apoio se implicar aumento de carga tributária.

Ao longo da videoconferência da entidade espanhola, Guedes destacou que, com o auxílio emergencial, o presidente Bolsonaro “tirou os pobres das ruas”, e voltou a afirmar que o país vai ter uma recuperação econômica forte e “vai surpreender o mundo”.

Na avaliação do ministro, a elite brasileira é responsável pela desinformação sobre o Brasil no exterior em relação ao desmatamento e o enfrentamento da pandemia. Segundo ele, os mais ricos não entendem por que o chefe do Executivo tem uma popularidade crescente entre os mais pobres. “Quem não pode ficar em casa dois ou três meses está compreendendo o que o presidente diz quando defende que é hora de voltar para as ruas. Se ele ficar em casa, não vai ter comida”, afirmou. Para Guedes, a elite é que conversa com os europeus, mas não entende o que o pobre pensa.

General Custer

Quando o assunto foi meio ambiente, o ministro partiu para o ataque. Um dia depois de a rede de supermercados britânica Tesco anunciar que não comprará mais carne do Brasil devido ao desmatamento da Amazônia estar relacionado a grandes frigoríficos, e ainda pressionar o governo do Reino Unido a rastrear cadeias de suprimentos, Guedes passou a se queixar dos europeus. Afirmou que eles precisam ser mais compreensivos com o Brasil, porque não tiveram capacidade de controlar um incêndio em um quarteirão, citando o acidente que destruiu a catedral de Notre-Dame, no centro de Paris, no ano passado.

“É uma pena. Os europeus deveriam ser mais compreensivos quando não foi possível conter um incêndio em um bloco”, disse, aos quase 180 participantes do evento. Ele ainda demonstrou inquietação sobre o posicionamento de países protecionistas, como França e Bélgica, contra o avanço do acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia usando como “desculpa” as queimadas das florestas. O ministro destacou que, pelo Acordo de Paris, o Brasil tem estoque de crédito de carbono que poderia ser comprado pelos europeus.

Mais tarde, em uma outra videoconferência, Guedes encontrou uma plateia mais crítica do que a da manhã sobre a questão ambiental, e chegou a perder a paciência. Disparou contra os norte-americanos, dizendo que os militares brasileiros entendem as preocupações deles, porque eles “desmataram suas florestas” e eliminaram, e não se miscigenaram com os índios.

O ministro afirmou que o Brasil compreende a preocupação internacional com a preservação da floresta e não precisa desmatar a Amazônia para expandir sua produção agrícola. Porém, acabou se exaltando diante da insistência dos participantes ao questionarem o desmatamento no Brasil.

“Nós entendemos a preocupação de vocês, porque vocês devastaram suas florestas. Vocês querem nos poupar de desmatar a floresta, como vocês desmataram seus países”, criticou Guedes, na videoconferência realizada pelo Aspen Institute. Ele assegurou, ainda, que “o Brasil não é um caso de extinção de florestas” e que os militares brasileiros “são pessoas gentis”. De acordo com ele, o presidente Jair Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão e o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, “amam a floresta”, porque foram treinados lá. E concluiu que eles são diferentes do “general (George Armstrong) Custer, que matou os índios”.

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Poupança capta R$ 27,1 bilhões

Apesar de a rentabilidade estar em queda e perder para inflação, a caderneta de poupança vem batendo recordes de depósitos por ser vista como um porto seguro para os brasileiros, segundo analistas. Eles destacam que ela ainda é vista como alternativa para quem não quer arriscar na Bolsa de Valores em meio à recessão provocada pela pandemia de covid-19.

Em junho, segundo o Banco Central, os depósitos superaram as retiradas em R$ 27,1 bilhões. É o maior volume para o mês desde 1995, início da série histórica. No acumulado do ano, o saldo entre depósitos e retiradas ficou positivo em R$ 111,6 bilhões, dado 220% superior ao total das entradas líquidas em todo o ano de 2019, de R$ 34,8 bilhões.

O volume do estoque total da poupança, incluindo o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) e a poupança rural, somou R$ 972,7 bilhões até o mês passado, outro recorde histórico desde o início da série, superando o anterior, de junho de 2020, segundo o BC.

O aumento nos depósitos na poupança é curioso quando, com a redução da Selic, para 2% ao ano na última quarta-feira, o rendimento passou de 1,58% para 1,40%, abaixo da expectativa de inflação do mercado, de 1,60%. “Apesar de a poupança já perder para a inflação, o rendimento dos fundos atrelados ao CDI está um fracasso, porque pagam Imposto de Renda e taxa de administração. Além disso, a chance de o pequeno investidor ganhar na Bolsa, agora, com ela acima de 100 mil pontos, é remota, porque esse patamar é alto e não reflete a atual realidade de uma economia em recessão”, explicou a economista Juliana Inhasz, professora do Insper.

“Em época de crise, o importante é não perder o que poupou e, pelo menos, manter o valor investido. Muitos investidores acabam voltando para a poupança para, pelo menos, não perderem o poder de compra do dinheiro”, comentou o economista Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor executivo de Estudos e Pesquisas Econômicas da Associação Nacional dos Executivos de Finanças Administração e Contabilidade (Anefac).

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