Contribuição sobre pagamentos, a nova CPMF, terá base mais ampla

Assessora especial do Ministério da Economia Vanessa Canado diz que ideia do novo imposto é aproveitar economia digital para rastrear melhor o fluxo das operações financeiras

Simone Kafruni
postado em 26/08/2020 17:46 / atualizado em 26/08/2020 18:04
 (crédito: EduAndrade/Ascom/ME)
(crédito: EduAndrade/Ascom/ME)

Apesar de evitar chamar de CPMF, o governo vai apresentar uma proposta de contribuição sobre pagamentos com uma base de arrecadação maior, aproveitando a economia digital que permite um melhor rastreamento do fluxo de operações financeiras. A explicação é da assessora especial do Ministério da Economia Vanessa Canado, que participou, nesta quarta-feira (26/8), de uma live sobre reforma tributária promovida por O Globo e Valor. “Os detalhes, nós vamos anunciar mais próximo do envio da proposta. O objetivo é aumentar a arrecadação ao ampliar a base, aproveitando o fluxo da economia digital, que permite rastrear melhor (as operações)”, disse.

O novo tributo é defendido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para compensar a redução de impostos sobre a folha de pagamentos. “A contribuição sobre pagamentos ganha uma nova conotação por conta da digitalização da economia. Quando torna a economia mais incorpórea, a forma de rastrear é mais fácil por meio do fluxo de pagamentos. Essa é a ideia que está na cabeça do ministro. A legislação está sendo desenhada para refletir esse novo mundo digital rastreável através das transações financeiras”, explicou. “Mas, para ser um tributo de base ampla, tem que capturar também as outras transações da economia”, acrescentou.

Sobre a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), já enviada ao Congresso, e que aumenta a carga para serviços, livros, educação e saúde, Vanessa pontuou que o governo ainda está se reunindo com os setores. “Já nos reunimos com representantes da educação e vamos nos reuniõe com os da saúde”, disse. O setor de serviços, continuou ela, “é absolutamente fundamental para todos os demais e precisa estar integrado nessa cadeia não cumulativa porque é principal insumo da economia”.

“Serviços não são só empresas pequenas que prestam serviços para consumidor final. Essas têm, no Brasil, regimes especiais mais do que em outros países. É preciso separar a demanda do setor de serviços para entender a preocupação deles. Acho ruim que não acompanhe um desenho de um IVA (imposto de valor agregado) não cumulativo, o que vai diminuir muito as expectativas de produtividade e crescimento econômico”, sustentou.

Sobre maior tributação dos livros, a assessora afirmou que “se desperdiça dinheiro público com quem poderia pagar imposto”. “O governo não deu com uma mão para tirar com a outra, só propôs a oneração da CBS sobre setores e pessoas que têm capacidade contributiva”, justificou.

Vanessa comentou que o momento político político é favorável, mas que o governo não consegue olhar isso como “romântico”. “Os estados estão apoiando a reforma porque as finanças estaduais estão ruins há muito tempo. Entraram no jogo da guerra fiscal, na qual todo mundo vai diminuindo as alíquotas e dando regimes especiais para atrair investimentos, e toda arrecadação vai sofrendo com isso. Chegaram no limite de uma alta tributação sobre o que a gente chama de 'blue chips', que é energia elétrica, combustíveis, telecomunicações. Usaram e abusaram do da substituição tributária, inclusive sobre as empresas do Simples Nacional, o que incrementou muito a carga tributária”, afirmou.

Repercussão

Para André Félix Ricotta de Oliveira, advogado, professor de Direito Tributário e presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB Pinheiros, o governo não gosta do nome CPMF, mas não tem outra forma de chamar o imposto proposto. “Essa reforma do governo ele pretende apresentar por fases. A primeira (CBS) já não foi bem aceita”, disse. Segundo o especialista, o governo fala em uma alíquota de 0,2% para a nova CPMF.

“O discurso é para compensar a desoneração da folha, mas não vai adiantar. As contribuições previdenciárias sobre a folha são os tributos que mais arrecadam. No ano passado, do recolhimento total de R$ 1,5 trilhões, R$ 442 bilhões foram em contribuições previdenciárias sobre as folhas de pagamento. A antiga CPMF, cuja alíquota era de 0,38%, arrecadava em torno de R$ 20 bilhões”, lembrou.

O professor criticou também a CBS. “O governo não traz nada de novo. A CPMF é uma solução antiga. A CBS nada mais é que PIS e Cofins em único tributo. Além disso, prejudicou a educação, o livro vai ser tributado, segundo o ministro Guedes, ‘porque é coisa da elite’”, afirmou. “Na verdade, só mexe em imposto sobre consumo que é regressivo e prejudica quem tem pouco poder aquisitivo”, acrescentou.

Eduardo Gonzaga Natal, especialista em Direito Tributário e sócio do escritório Natal & Manssur Advogados, destacou que, quando Guedes falou em imposto sobre pagamentos, se imaginava que iria incidir apenas sobre bens e serviços. “Algo em linha com a CBS. Assim, ficariam de fora outras transações, que a antiga CPMF pegava, ou seja, todo o tipo de operação financeira”, explicou.

 “Qualquer tributo que incide sobre pagamentos é mais simples, mas não quer dizer que é bom. Se impactar sobre todas as transações é CPMF. Por ser similar, tem um defeito de origem. Se a gente quer fazer reforma, não pode partir para simplificação. Tem que fazer uma análise e considerar que todo imposto regressivo atinge os mais pobres”, completou Natal.

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