Governo

Para cumprir o teto de gastos do governo, salário mínimo vai aumentar apenas R$ 22 em 2021

Ministério da Economia considera apenas a inflação e propõe o valor de R$ 1.067 para 2021. Secretário Waldery Rodrigues alegou a necessidade de cumprir o teto de gastos. Quase 60% da população brasileira vive com renda familiar per capita de R$ 1,4 mil

Simone Kafruni
postado em 01/09/2020 06:00 / atualizado em 01/09/2020 06:43
 (crédito: Edu Andrade/Ascom/ME)
(crédito: Edu Andrade/Ascom/ME)

O salário mínimo vai passar de R$ 1.045 para R$ 1.067 em 2021. Com reajuste pela inflação calculada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), o piso salarial será apenas R$ 22 maior no ano que vem. Os dados estão no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), divulgado ontem pelo Ministério da Economia. O valor ficou R$ 12 menor do que o previsto pelo próprio governo no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2021, quando o INPC estava em 3,19% e o salário mínimo foi calculado em R$ 1.079 para 2021. Até o ano passado, o reajuste considerava a variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. A regra perdeu validade e, agora, só leva em conta o INPC, apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para corrigir o poder de compra da população assalariada com o mais baixo rendimento.


Segundo o secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, o cálculo levou em consideração apenas o INPC para atender à regra de teto de gastos, que limita os gastos públicos. “Não estamos trabalhando com nenhuma proposta de aumento real do salário mínimo, por estrito atendimento ao teto de gastos. Se tiver algum aumento, outra despesa terá de ser reduzida”, explicou.


Waldery ressaltou que o salário mínimo tem um efeito multiplicador. “Cada R$ 1 a mais representa R$ 300 milhões de despesa. Nosso objetivo é buscar o atendimento ao teto de gastos. Qualquer reforço na política social terá de vir com a robustez do fiscal”, disse.


Para o secretário geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, a decisão de reajustar apenas pela inflação é correta. “Cada R$ 1 a mais no salário mínimo implica elevação de gastos de R$ 355 milhões, uma vez que o mínimo baliza benefícios como aposentadoria, Benefício de Prestação Continuada (BPC), seguro desemprego e abono salarial”, listou, apresentando um impacto ligeiramente maior do que o divulgado pelo secretário de Fazenda.


O professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), José Luis Oreiro, explicou que, desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, passando pelas gestões petistas, houve crescimento real do salário mínimo. “Isso foi limitado com a criação do teto de gastos (no governo Temer)”, afirmou. Uma opção para garantir aumento real, sugeriu o professor, seria desvincular os benefícios do salário mínimo. “Não faz sentido, o benefício ter o mesmo ganho real, porque não garante produtividade. Deveria ter regra distinta”, sustentou. Outra opção seria eliminar o teto de gastos. “Essa regra mata o país por asfixia. É uma restrição fiscal, auto imposta por 20 anos, que não existe em nenhum outro lugar no mundo. É preciso eliminar esse jabuti”, opinou.

Dignidade

O governo anunciou um salário piso de R$ 1.067 para 2021, porém, o valor mínimo para uma família de quatro pessoas viver com dignidade, em julho de 2020, era de R$ 4.420,11, conforme o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), com base no preço da cesta básica. Em Brasília, em julho passado, a cesta para uma pessoa adulta foi calculada em R$ 449,96.


José Álvaro Cardoso, economista e supervisor técnico do Dieese em Santa Catarina, lembrou que, segundo a Pnad do IBGE, 58% da população do país, ou quase seis em cada 10 brasileiros, têm renda familiar per capita de R$ 1,4 mil. “Evidentemente, falta dinheiro no fim do mês. Mal dá para pagar a luz e comer. Por isso, a fome voltou a ser um problema que acomete boa parte dos brasileiros”, lamentou.


O especialista destacou dados de estudo da Universidade de Oxford, segundo o qual, em 2018, mais de 40 milhões de pessoas viviam em insegurança alimentar no Brasil. “Quase 20% da população não sabe o que vai comer na próxima refeição. Isso aumentou em 2019 e deve ter piorado muito em 2020, por conta da pandemia”, ressaltou.

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