SOCIAL

Auxílio emergencial melhora renda da parcela mais pobre da população

Regiões Nordeste e Norte concentram o maior número de brasileiros que saíram da miséria, segundo levantamento da FGV Social. Especialista alerta, no entanto, para risco de inflação

Vera Batista
Fernanda Strickland
Jailson R. Sena*
postado em 06/09/2020 07:00 / atualizado em 06/09/2020 09:22
Fila da Caixa: 13,1 milhões deixam grupo que vive com menos de meio mínimo -  (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
Fila da Caixa: 13,1 milhões deixam grupo que vive com menos de meio mínimo - (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Qual foi o impacto imediato da pandemia da covid sobre as classes econômicas brasileiras? Estudo da FGV Social esmiúça dados por regiões do Brasil e por estados até julho de 2020. Graças ao auxílio emergencial, a redução da pobreza foi maior nas regiões onde havia mais necessitados, aponta a pesquisa coordenada pelo economista Marcelo Neri. O número de pessoas que ganhavam até meio salário mínimo caiu 28,7% no Nordeste, no Norte (-25,12%) e no Centro-Oeste (-17,01%). Já no Sudeste, baixou 9,67%; no Sul, 9,32%.

Segundo o levantamento de classes econômicas, a partir de dados factuais coletados durante a pandemia, a quantidade de pessoas consideradas pobres no Brasil (renda per capita menor do que meio salário-mínimo) caiu para 13,1 milhões entre 2019 e julho de 2020. Isso representa queda de 20,69%, ritmo muito superior ao observado em momentos de boom social no Brasil, como nos períodos seguintes ao lançamento dos planos de estabilização, como o Cruzado, em 1986; e o Real, em 1994.

Em julho de 2020, o total de pessoas que ganhavam até meio salário-mínimo era de 52,1 milhões de brasileiros, ou 24,62% da população. Em 2019, eram 65,2 milhões de pobres, ou 31,04%. “A taxa de pobreza na pandemia caiu 20,69% e cerca de 13,01 milhões de pessoas cruzaram essa linha de renda”, constata a estatística.

Já os estratos com rendas per capita acima de dois salários-mínimos perderam 5,8 milhões de pessoas em plena pandemia. “Ambos os movimentos impulsionam o contingente populacional intermediário compreendido entre os dois intervalos. Portanto, o miolo da distribuição de renda tupiniquim cresceu em cerca de 20,5 milhões de pessoas, quase meia população argentina”, afirma o levantamento.

O especialista em investimentos Marcos Laplechade concorda com o fato de que ocorreu uma diminuição na pobreza no sentido restrito de renda, quando se olha que os mais pobres, uma camada da população que convivia com rendimento abaixo de meio salário-mínimo, passou a receber o auxílio emergencial de R$ 600. “É nítido que há pessoas saindo da miséria. Mas, a partir desse ponto, concluir que reduziu a pobreza, na minha concepção, é um pouco precipitado. O que retira as pessoas da pobreza é um sistema de produtividade, pois o dinheiro é um sistema de troca.”

Ele reforça que o benefício é temporário. Se fosse mantido, haveria impacto expressivo nos índices de inflação, o que afetaria justamente a parcela de baixa renda e anularia esse efeito de riqueza. “Podemos observar, por exemplo, o setor de alimentos puxando bem forte os preços para cima. A alimentação é uma base que consome muitos recursos das famílias brasileiras. Então, mesmo que o governo conseguisse manter o auxílio, em breve a inflação subtrairia esses ganhos das famílias que têm as rendas mais baixas”, conclui o economista.

Pnad Covid-19

Para além das mudanças de renda, a Pnad Covid-19 de julho aponta efeitos diferentes da pandemia nos diferentes estratos econômicos. E o resultado do estudo revelou algo inesperado, de acordo com Marcelo Neri. O estrato mais pobre, alvo do auxílio emergencial, apresenta taxas mais altas de isolamento social: 27,8% (com renda inferior a meio mínimo) do grupo mantiveram-se rigorosamente isolados e 48,3% ficaram em casa, saindo apenas por necessidade básica.

“Estes resultados sugerem que o auxílio emergencial impactou não só a renda, mas também os comportamentos mais ajustados às necessidades impostas pela pandemia. Porém, a manutenção deste auxílio não se mostra fiscalmente sustentável”, destaca o responsável pelo levantamento. Ao considerar o total da população, as estatísticas são de 23,3% e 43,6%, respectivamente.

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Fora do mercado de trabalho

Por unidade da federação, as maiores quedas nos índices de pobreza, entre 2019 e 2020, foram registradas em Tocantins (-36,8%), Pernambuco (-32,45%) e Mato Grosso do Sul (-31,56%). As unidades mais ricas, com menores elos com o auxílio emergencial, não conseguiram isolar suas respectivas populações do aumento da taxa de pobreza. Como em São Paulo, onde a taxa de pobreza aumentou em 3,83%; Rio Grande do Sul (2,47%) e DF (2,37%).

Na capital do país, muita gente ainda está fora do mercado de trabalho. É o caso de Francisco Chagas de Oliveira, 45 anos. Ele mora na Cidade Ocidental, Goiás, mas fazia seus eventos no DF, como chefe de cozinha. Ha seis meses, em razão do isolamento social, vários eventos foram cancelados, dificultando o acesso ao trabalho. Ainda desempregado, o empreendedor diz que está muito complicado pagar as contas, e mesmo mandando currículo, não consegue emprego. “Por mês, meu rendimento era de R$ 5 mil a R$ 6 mil reais. Por isso, tenho buscado outras alternativas para não acumular os boletos.”

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