Mercado financeiro

Ibovespa cai para pior patamar desde junho e dólar dispara a R$ 5,58

Possibilidade de novos recuos na Europa, riscos fiscais domésticos e aumento do desemprego derrubam bolsa brasileira. Respeito ao teto de gastos nas contas públicas é ponto chave para atrair novamente o interesse de investidores estrangeiros

Israel Medeiros*
postado em 23/09/2020 21:14
 (crédito: NELSON ALMEIDA/AFP)
(crédito: NELSON ALMEIDA/AFP)

Cautela é a palavra do momento no mercado financeiro. Isso porque a apreensão entre investidores de todo o mundo com a possibilidade de um novo fechamento da economia na Europa tem dado o tom nas bolsas estrangeiras há pelo menos uma semana. Além disso, a falta e estímulos monetários à vista tem afetado o humor nas bolsas. Nesta semana, alguns dos principais índices globais registram quedas expressivas dia após dia. É o caso da B3, onde o Ibovespa teve uma quarta-feira de realização de lucros com tombo de 1,6% aos 95,7 mil pontos — pior patamar desde o dia 30 de junho.

A queda não foi maior graças ao anúncio da fusão entre as empresas de aluguel de carros Localiza e a Unidas, que fez as ações subirem 13,9% e 17,2%, respectivamente. Além dos agravantes do cenário externo, a bolsa brasileira teve outros motivos para mais um dia de queda. É o que explica Renan Silva, economista da Bluemetrix Ativos. Ele destaca, por exemplo, os dados de desemprego no país, divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IGBE). A taxa de desocupação aumentou 0,5% em agosto, na comparação com o mês anterior.

"Batemos 13,6%, o que realmente aumenta a incerteza quanto à velocidade da recuperação da economia, uma vez que o consumo das famílias representa mais de 60% do PIB. Com desemprego alto, isso significa menor renda dos consumidores e também um endividamento maior das famílias. Isso acaba afetando as expectativas sobre o valor das empresas na bolsa", detalha.

Além disso, as contas públicas preocupam. De acordo com dados do Ministério da Economia, o déficit no fim do ano deve ultrapassar os R$ 860 bilhões, número superior aos R$ 787,5 bilhões previstos em julho. O aumento deve-se à extensão do auxílio emergencial. Na avaliação de Silva, apesar de o governo ter injetado dinheiro no consumo com o benefício, o momento atual é de recessão — algo que já era esperado.

"O estímulo econômico do governo ajudou a melhorar a economia, mas agora temos uma recessão. A bolsa no último mês foi mais lateral com volume baixo. Neste momento, há realização. Não acredito que seja um pânico, mas é um ajuste mais intenso, até que se tenha uma retomada mais consistente", diz ele.

O economista também acredita que o discurso negacionista de Bolsonaro na ONU agrava a "aversão a Brasil", o que significa que o país se torna menos atrativo para investimentos. A saída de capital estrangeiro do país, inclusive, tem pressionado o câmbio e levou o dólar ao valor mais alto desde agosto: a moeda americana disparou 2,18% e foi a R$ 5,58.

Também no cenário doméstico, há discussões sobre a possível criação de um novo imposto nos moldes da antiga CPMF — algo defendido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes — e a possibilidade do furo no teto de gastos. Nesta quarta, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), reafirmou o comprometimento com a manutenção do teto. Na ocasião, ele saía de uma reunião com Bolsonaro que tratou do futuro substituto do Bolsa Família, inicialmente chamado de Renda Brasil e que deve ganhar um novo nome. Além disso, ao falar de reforma tributária, afirmou que o governo não encaminhará proposta para aumentar tributos.

Para Renan Silva, apesar da agenda de reformas, a situação fiscal parece crítica aos olhos de investidores. "A gente entende que tem uma agenda mais positiva, que é de reformas, mas ao mesmo tempo tem esse questionamento sobre a capacidade de o governo lidar com o rombo. Ele está propenso a estourar o teto de gastos. A todo momento, há uma negativa por parte dele dizendo que o teto de gastos é crucial, primordial e não deve ser desrespeitado. Me parece pouco provável que isso ocorra, mas a possibilidade gera instabilidade", completa.

*Estagiário sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza 

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