O anúncio de privatização da Companhia Energética de Brasília (CEB), no último sábado, dia sem movimentação no mercado financeiro, provocou alta nas ações da empresa na abertura do pregão de ontem da Bolsa de Valores de São Paulo (B3). As ações da empresa, que fecharam em R$ 64, após atingirem um pico de R$ 69, na sexta-feira passada, subiram 23,5% ontem, cotadas em R$ 85. No meio do dia, no entanto, chegaram a atingir alta de mais de 30%, precificadas em R$ 94 na máxima.
A companhia brasiliense precisa de investimentos de R$ 200 milhões por ano, mas o movimento do mercado mostrou que a empresa, cujo preço mínimo é estimado em R$ 1,42 bilhão, desperta interesse dos investidores. No sábado, o Correio apurou que, ao menos, seis empresas devem disputar o controle da companhia: CPFL, Neoenergia, Equatorial, Energisa, Enel e EDP. O alto nível de renda da população atendida na capital federal é um diferencial da CEB.
Para o economista-chefe da GWX Investimento, Ciro Almeida, a privatização aqueceu o mercado de ações ao criar expectativa. “A venda traz uma valoração do preço da ação. A discussão e a expectativa fazem com que os papéis da CEB comecem a caminhar de maneira positiva", explicou.
Audiência
A CEB marcou para 14 de outubro, as 11 horas, audiência pública virtual para debater a desestatização, de acordo com informação publicada no Diário Oficial do Distrito Federal de ontem. O objetivo será prestar informações ao público, bem como receber sugestões e contribuições ao processo de privatização. O modelo será a alienação de participação societária, a exemplo do que o governo federal quer fazer com a Eletrobras.
O presidente da CEB, Edison Garcia, não quis comentar sobre os preços das ações da companhia, mas afirmou que a privatização pode reparar problemas estruturais e financeiros enfrentados pela distribuidora. “Precisamos prestar um serviço melhor aos brasilienses. E isso só acontece com investimentos, troca de equipamentos e preparação da companhia para rápidas demandas quando elas ocorrerem”, explicou. “O que temos visto na CEB é uma fadiga de material, incapacidade financeira de fazer novos investimentos, o que leva a um serviço cada vez pior”, reconheceu.
Garcia também afirmou que, quanto mais investimentos, maior a possibilidade de aumento da tarifa. “O movimento para evitar isso precisa ser a redução da inadimplência. E trazer para a legalidade as dezenas de milhares de unidades residenciais que não pagam a conta, as famosas ‘gambiarras’”, assinalou. Segundo Garcia, são cerca de R$ 90 milhões a R$ 100 milhões perdidos por ano com ligações irregulares.
Para o sócio-diretor da Focus Energia Henrique Casotti, mesmo com a possibilidade de aumento da tarifa a curto prazo, a movimentação ainda é positiva, porque haverá melhora tanto na qualidade, quanto no fornecimento e no atendimento aos consumidores. Além disso, na comparação entre empresas estatais e privadas, o melhor desempenho na entrega do serviço é da iniciativa privada, acrescentou. “As companhias do setor privado têm processos bem desenhados e bem mais eficientes. Com a privatização, ganha-se na qualidade e na eficiência do investimento", completou.
Para o presidente da Associação Brasileira de Energia Elétrica (Abadee), Marcos Madureira, o resultado das privatizações no setor de distribuição é positivo. Os estados que entendem que a iniciativa privada tem melhores condições de gestão e de aporte de capital têm tido resultado positivo nos setores de distribuição de energia elétrica. “Isso não significa que as estatais sejam ineficientes, mas há maior facilidade na gestão da empresa com processos facilitados, e que não podem ser feitos nas estatais”, avaliou Madureira.
*Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo
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Dívida pública chega a R$ 4,4 trilhões
A dívida pública federal chegou a R$ 4,412 trilhões em agosto — e deve continuar subindo nos próximos meses, com o governo tendo de emitir mais títulos públicos para cobrir as despesas exigidas pela pandemia da covid-19, além de manter o colchão de liquidez do Tesouro Nacional para garantir o pagamento dos títulos que vão vencer no início do próximo ano. Porém, esse endividamento deve ocorrer sob cada vez mais pressão. Os investidores já vinham exigindo juros maiores e prazos mais curtos no financiamento da dívida por conta da situação ruim das contas públicas. Mas o anúncio da forma de financiar o programa Renda Cidadã, ontem, aumentou as dúvidas sobre a capacidade do governo de colocar o endividamento público em uma trajetória sustentável.
Segundo o Tesouro, a dívida já cresceu 3,86% neste ano. Só em agosto, o saldo teve um incremento de R$ 67,8 bilhões, ou 1,56%. Desse total, R$ 35,93 bilhões representaram acréscimo de juros e R$ 31,89 bilhões, emissão de novos títulos — o maior volume de emissões para agosto desde 2004. A alta deve se repetir em setembro, depois que, no último dia 10, o Tesouro fez o maior leilão da história, ofertando mais de R$ 46 bilhões em papéis de uma vez.
“O volume de emissões tem aumentado por conta do aumento de gastos. É uma consequência da pandemia”, lembrou ontem o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, em audiência na comissão mista que acompanha o enfrentamento da covid-19 no Congresso Nacional.
Levantamento do Ministério da Economia mostra que a pandemia da covid-19 provocou aumento de R$ 586,6 bilhões nas despesas públicas, ao mesmo tempo em que reduziu em R$ 20,6 bilhões a arrecadação federal. Por isso, o deficit primário do setor público consolidado deve chegar a R$ 895,5 bilhões neste ano, o equivalente a 12,5% do PIB. Com isso, a dívida bruta alcançará 93,89% do PIB. Segundo analistas, pode encostar em 100% do PIB.
Esses números e a falta de medidas para conter a escalada da dívida preocupam investidores e analistas. “Elevar o endividamento é inevitável, mas o que gera incerteza é a condução disso para os próximos anos. Falta aos agentes a confiança de que o governo tem condições de contornar essa situação. Reformas podem levar as contas para uma trajetória mais saudável, mas não estamos vendo uma coordenação entre o Executivo e o Legislativo para que isso avance”, explicou a economista da Veedha Investimentos Camilla Abdelmalack.
A desconfiança ficou ainda maior ontem. Além de adiar o anúncio da reforma tributária, o governo informou que o programa de renda básica que deve ser criado até 2021 poderá ser financiado com recursos reservados ao pagamento de precatórios, ou seja, com mais dívida. “Acreditava-se que esse programa seria financiado por cortes de gastos”, destacou o economista Guilherme Cadonhotto, da Spiti. “Isso gerou uma incerteza ainda maior, uma vez que a tramitação das reformas está devagar.”
O mau humor do mercado fez a Bolsa cair e a cotação do dólar disparar ontem. Além disso, os juros voltaram a subir, principalmente nas operações mais longas, que chegaram a avançar 0,75 ponto percentual na máxima do dia. Nesse cenário, o Tesouro tem sido obrigado a pagar taxas superiores a 7% ao ano nos títulos que vão vencer em 2030, apesar de a taxa básica de juros (Selic) estar na mínima histórica de 2% ao ano.
FT vê risco fiscal alto no Brasil
Embora tenham conseguido evitar uma “catástrofe fiscal”, economias emergentes podem estar caminhando para uma trajetória de dívida insustentável, em meio aos esforços para atenuar os efeitos da crise provocada pelo coronavírus. É o que mostra a reportagem divulgada, ontem, pelo Financial Times.
A matéria cita o Brasil como exemplo de país que enfrenta o risco de esgotamento da capacidade de endividamento. Segundo o texto, o governo brasileiro terá de decidir “em breve se irá controlar seus generosos programas de apoio social, arriscando uma reação social e política, ou pedir emprestado e gastar além de suas restrições, arriscando uma reação de investidores internacionais que enviariam sua moeda ao colapso, com disparada das taxas de juros”.
O jornal britânico destaca que, em março, havia o temor de que a pandemia jogaria emergentes em uma crise de dívidas de grandes proporções. “Em vez de inadimplência, entretanto, houve novos empréstimos. Desde 1º de abril, os países em desenvolvimento levantaram mais de US$ 100 bilhões nos mercados internacionais de títulos”, ressalta.
O problema, aponta a reportagem, é que a situação fiscal de várias nações já chegou ao limite. O diário cita levantamento da agência Moody's que prevê avanço médio de 10% na relação dívida/PIB dos 19 maiores mercados emergentes apenas este ano. “Até agora, no entanto, os pedidos de ajuda foram poucos. Embora dezenas de países tenham recebido financiamento de emergência do FMI e do Banco Mundial, a maioria tem sido em pequenos montantes”, ressalta.
Bolsa cai e dólar sobe
Pressionado pela retomada dos receios sobre a situação fiscal do país, o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (B3) caiu ao menor nível desde 26 de junho e fechou em baixa de 2,41%, aos 94. 666 pontos. “Caiu muito mal a falta de acordo na reunião de líderes sobre as reformas. Bolsonaro volta a se mostrar mais preocupado com a reeleição que com o ajuste das contas”, disse Luiz Roberto Monteiro, operador da mesa institucional da corretora Renascença. “A agenda econômica está emperrada”. O clima de decepção também fez o dólar disparar: subiu 1,44%, cotado a R$ 5,635 para venda, o maior patamar desde 20 de maio.