O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se disse pessimista sobre o cenário econômico que o Brasil enfrentará em 2021. Isso, por conta da demora do governo em definir as prioridades econômicas e pelo atraso da pauta da Câmara, obstruída pela base do governo em uma disputa pela presidência da Comissão Mista de Orçamento. Segundo o parlamentar, o ministro da Economia, Paulo Guedes, está isolado no governo, na defesa da necessidade de encontrar soluções para enfrentar a crise econômica provocada pelo coronavírus, “respeitando as regras do jogo” – isto é, o teto de gastos.
Maia falou pouco menos de uma hora em uma live, na tarde de hoje, para o jornal Valor Econômico. Logo de início, confrontado com o cenário atual em relação ao de julho, no qual havia uma grande tensão entre parlamentares e governo, o presidente da Câmara disse estar "mais preocupado hoje que em julho". Alertou que o país entrará no próximo ano com uma dívida muito alta, com o desemprego batendo recorde e a inflação “voltando com força”. Para ele, a responsabilidade pela busca de soluções não pode vir somente dos parlamentares, mas do Executivo e do Legislativo juntos. “E nosso tempo já passou”, avisou.
O deputado voltou a insistir na aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), no início de dezembro. Mas, antes, quer ver aprovada a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 186/19, que regulamenta e cria gatilhos para a manutenção do teto de gastos.
“Se fizermos a conta dos prazos, para aprovar o orçamento é fundamental que a gente tenha a PEC Emergencial aprovada antes. E não é simples. Tem pontos muito polêmicos, muitos parlamentares ficam assustados. Um líder experiente disse que, de 17 a 19 pontos em que se pode cortar o orçamento, destacou que tem 10 ou 11 que não aceita nem conversar. É um momento muito difícil, de insegurança grande. Ninguém sabe o que vem e há uma falta completa da organização da agenda”, criticou.
O parlamentar destacou que o orçamento primário será de cerca de R$ 1,48 trilhão, mas que as despesas correntes representarão R$ 1,41 tri. "E a projeção dos técnicos é de que precisamos de mais R$ 80 bilhões nas (despesas) discricionárias para a manutenção da máquina”, observou.
“Precisamos de um limite do teto de gastos. É claro que tenho uma expectativa muito grande, acho que a reforma tributária é o caminho para fazer o Brasil crescer. Conseguimos aprová-la (na comissão). Falta organizar o texto com o governo, que o ministro Paulo (Guedes) às vezes tem dúvida em relação ao fundo, que queremos um fundo que vai tirar dinheiro do governo. De forma nenhuma. Temos um acordo com ele", salientou, para acrescentar:
"Vamos escrever a redação juntos, que os novos recursos podem ser os recursos que vêm do petróleo. A tributária está pronta: é só fechar esse acordo e terminar de redigir o texto e pode ir para o plenário. Mas não adianta avançar na tributária se não soubermos o que vai acontecer a partir do dia 16, no Senado, com a PEC Emergencial relatada pelo o senador Márcio Bittar”, insistiu Maia.
Participação presidencial
Para Maia, vai ser difícil falar em cortes sem que o presidente Jair Bolsonaro participe do debate. O receio é que um processo nesses termos passe a ideia que o Legislativo quer tomar decisões à revelia do governo, incluindo apenas o ministro da Economia.
“O momento não é bom, não é fácil, e não tem solução fácil. Na política, muitas vezes, é assim. Nós representamos a sociedade para tomar as decisões difíceis, mas precisa organizar. Para mim, o calendário já estourou para este ano. Se quisermos a PEC Emergencial e o orçamento, precisamos andar rápido e com coragem para que a Câmara possa ter condições de fazer o debate e promulgar a matéria”, sugeriu.
O temor de Maia é que o relatório da PEC Emergencial só seja apresentado depois de 29 de novembro, quando ocorrerá o segundo turno das eleições. Assim, a aprovação e promulgação só viria, nos cálculos do deputado, em fevereiro.
“Aí, fica mais complicado e com uma maior insegurança. O prazo está exíguo. No meu cronograma, teremos que entrar em janeiro”, destacou.
O presidente da Câmara elogiou o secretário de Governo, ministro Luiz Eduardo Ramos, e os líderes do governo na Casa. Para Maia, o problema não é a articulação no Legislativo, mas a indecisão do Palácio do Planalto sobre o que será feito.
“Nenhum de nós tem certeza do que o governo vai fazer. Cada semana tem uma linha de atuação. Numa, é balão de ensaio em prorrogar o auxílio emergencial; noutra, prorrogar o estado de calamidade. E você não vê uma posição de governo em relação à PEC Emergencial e à agenda das próximas semanas. Isso tudo atrasa e gera insegurança em todos”, disse.
Redução do deficit
Segundo Maia, “aqueles que, como eu, têm estudado e tentado aprender em relação à questão do orçamento, têm ficado preocupados. Além da questão do teto (de gastos), temos outra pressão grande, que é como reduzir o deficit primário. A dívida pública está chegando a 100% do PIB e sua estabilização, nos próximos anos, será um ponto cobrado por investidores de longo prazo no Brasil. Temos que resolver o auxílio emergencial, o teto de gastos, e pensar em uma solução para reduzir o deficit primário. Vai ter que se cortar. Não para o próximo ano, mas para dois, três anos”, previu.
O alerta, explicou Maia, é para o risco de criação de novos impostos para suprir a falta de receita. Nessas circunstâncias, o peso da carga tributária recairia sobre a população.
“Estamos em um momento muito difícil. Precisamos organizar, votar a LDO no início de dezembro, para deixar claro quais são as diretrizes do governo para o próximo ano. Do meu ponto de vista, vai ser difícil votar o orçamento antes de votar a PEC Emergencial, que organiza o teto de gastos, além de gatilhos e cortes”, lembrou.
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