A melhora no cenário externo, com avanços nos testes de várias vacinas contra a covid-19, e as medidas recentes anunciadas pelo Banco Central (BC) para o mercado de câmbio, ajudaram na queda do dólar frente ao real nos últimos dias. Entretanto, o aumento dos temores de uma segunda onda de contágio e dos riscos fiscais crescentes jogaram um balde de água fria, ontem, nesse mercado, fazendo a divisa subir 0,13%, para R$ 5,33.
O real figura entre as moedas mais desvalorizadas no ano, principalmente, devido às preocupações sobre a deterioração das contas públicas e a desconfiança sobre a manutenção do teto de gastos, emenda constitucional que limita o crescimento das despesas à inflação. Entre os analistas, inclusive, crescem os temores de um cenário de dominância fiscal — no qual a política monetária não tem efeito para estimular a economia — caso o governo não consiga controlar o forte aumento da dívida pública bruta em relação ao Produto Interno Bruto (PIB).
O diretor de Política Monetária do BC, Bruno Serra Fernandes, reforçou, ontem, em videoconferência do jornal Valor Econômico, que, se necessário, o BC atuará no mercado de câmbio para suavizar a saída dos bancos do overhedge (operações de seguro para ativos no exterior de quase duas vezes o valor em dólar), no fim deste ano, fazendo mais do que as rolagens padrão de contratos de swap cambial, “dando liquidez para o mercado se isso parecer necessário”.
“A fala do diretor do BC trouxe uma certa tranquilidade ao mercado. Foi uma mudança de atitude que reduziu a pressão especulativa sobre o dólar”, avaliou o economista Sergio Goldenstein. Ele lembrou que, na segunda-feira (16), a autoridade monetária emitiu comunicado informando que poderá recalibrar a oferta de dólares no mercado, uma vez que há um grande número de operações de overhedge que devem ser revertidas em dezembro, algo entre US$ 15 bilhões e US$ 23 bilhões. “É um volume expressivo e o que o BC quer dizer é que, caso a reversão das operações de overhedge pressione o câmbio, ele poderá realizar ofertas líquidas de swaps”, explicou.
Riscos
Ao mesmo tempo que tenta tranquilizar o mercado em relação ao câmbio, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, tem dado sinais de que está bastante preocupado com a questão fiscal, lembram os analistas. Segundo eles, as chances de o teto estourar no ano que vem são crescentes, pois o Orçamento de 2021 ainda não foi discutido pelo Congresso.
“O risco de dominância fiscal não se resume ao fato de o governo respeitar ou não respeitar o teto de gastos, que é, hoje, uma coisa indispensável, porque tornou-se a única âncora fiscal do país. Respeitar o teto é fundamental, mas, ao mesmo tempo, é preciso espaço para ampliação de despesas que ainda não estão no Orçamento, como mais gastos com saúde e com o novo auxílio emergencial. Para isso, o governo precisará atuar com muita firmeza contra o crescimento das despesas obrigatórias”, comentou o economista José Júlio Sena, ex-diretor do BC e chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
Um fator positivo para o câmbio e a economia, que permitiu a entrada de recursos de investidores estrangeiros no país em novembro, foi a eleição do democrata Joe Biden nas eleições dos Estados Unidos, que melhorou a expectativa para mercados emergentes. Dados do BC apontam o fluxo cambial positivo de US$ 3,3 bilhões no mês, sendo mais da metade nos últimos dias, após um período de saídas. Só que o Brasil está na lanterna desse novo fluxo devido aos juros baixos e aos riscos fiscais. Logo, as apostas para nova alta na taxa básica de juros (Selic), de 2% ao ano, estão aumentando.
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