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Editais devem respeitar crenças

STF permite que provas de certames públicos sejam aplicadas em datas distintas a candidatos que aleguem motivos religiosos. Relator do caso diz que Estado é laico, mas cidadãos não podem ser impedidos de ter acesso a cargos em consequência da religião

Correio Braziliense
postado em 26/11/2020 23:48 / atualizado em 26/11/2020 23:48

Por sete votos a quatro, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que as provas de um concurso público podem ser aplicadas em datas distintas para candidatos que aleguem motivos religiosos para não fazer os testes nos dias estabelecidos para todos os postulantes. De acordo com a decisão da Corte, a mudança, no entanto, só pode ser realizada quando não representar quebra de isonomia da concorrência com os demais candidatos. O entendimento tem repercussão geral, ou seja, deve ser seguido pelos demais tribunais do país.

O Supremo analisou dois casos distintos. O primeiro, de um candidato que pediu na Justiça para realizar a prova em uma data alternativa, pois o certame foi marcado para o sábado, dia que os adventistas guardam, de acordo com sua crença. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) acolheu o pedido do candidato. No entanto, a União recorreu e o processo foi parar no STF.

No segundo caso, a professora Margareth da Silva, de São Paulo, faltou 90 vezes durante o período de estágio probatório e foi reprovada, tendo que deixar o cargo público. No caso da docente, o governo alegou que ela não avisou previamente o motivo das faltas. A defesa sustentou que exonerar a cliente por motivo de fé afronta a Constituição, e que ela não faltou sem justificativa, mas pediu para repor as aulas em dias alternativos.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, ressaltou que, embora o Estado seja laico, a liberdade de crença é um direito protegido pela Constituição Federal. “O poder público não precisa se prender aos dogmas religiosos. Obviamente que não. Agora, também não seria razoável — sob pena de se afastar totalmente a garantia constitucional da liberdade de culto e de crença —, impedir-se, a priori, que, em virtude de determinada religião, uma pessoa estivesse, na prática, terminantemente impedida de pleitear acesso a determinado cargo público via concurso”, disse Moraes.

O voto dele foi seguido pelos ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Ricardo Lewandowski. Foram contra os ministros Dias Toffoli, Kassio Nunes Marques, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello.

A posição de Marques surpreendeu o setor político, tendo em vista ter sido ele recém-indicado ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro, que sempre ressaltou o peso que motivos religiosos têm em suas decisões.

Apesar de ter chegado ao cargo após aceitação pelo presidente, Nunes Marques é conhecido por decisões técnicas e pelo perfil garantista, ou seja, que aplica as leis com tendência a proteger o direito dos réus, evitando despachos punitivistas.

Igualdade

Na decisão do Supremo, a prova, teórica ou prática, pode ser remarcada, mesmo que não exista previsão nesse sentido no edital. No entanto, para isso, a alteração não deve gerar prejuízos para a administração pública e deve garantir a preservação da igualdade, na seleção, a todos os postulantes.

No entendimento do Supremo, a jornada de trabalho também pode ser alterada em razão de crença religiosa. Servidores públicos que precisam guardar a sexta-feira, por exemplo, podem repor a carga horária em outros dias da semana.

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