As ações da Eletrobras desabaram mais de 10% ontem, na volta do feriado na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), seguindo a queda dos ADRs (American Depositary Receipts) na véspera, depois do anúncio da saída de Wilson Ferreira Jr. da presidência da companhia. Na outra ponta, as ações da BR Distribuidora, empresa que Ferreira irá presidir, saltaram 9,52% e 10,24%. Para os especialistas, o temor do mercado é de que o governo tente emplacar um nome político na estatal de energia elétrica. Agentes do setor elétrico lamentam a mudança, mas não acreditam que isso possa comprometer o abastecimento de energia, mesmo que a Eletrobras seja responsável por 30% da geração e 45% da transmissão no país.
Ferreira deixou a estatal alegando insatisfação com a demora na privatização da companhia, que tramita no Congresso desde 2019. O Conselho de Administração da empresa pretende avaliar profissionais do mercado, com a contratação de uma consultoria de headhunter. O próprio Ferreira defendeu que há funcionários da companhia capacitados para substituí-lo. Nesse caso, o nome da diretora Financeira, Elvira Presta, é o mais forte, uma vez que ela já ocupou a presidência nas férias de Ferreira. A área econômica do governo, por sua vez, busca um executivo que acredite no projeto de privatização da Eletrobras.
Para Pedro Serra, gerente de research da Ativa Investimentos, a saída de Ferreira é duplamente negativa. “Ele estava fazendo um bom trabalho. Ao colocar que o motivo para sua saída foi a menor visibilidade da privatização da Eletrobras, derrubou as ações, porque muitos investidores estavam carregando suas posições em cima da capitalização da companhia”, avaliou. “Além de deixar a incerteza em relação à privatização, a saída de Ferreira aumenta o risco de intervenção do governo”, alertou.
Segundo Serra, o conselho de administração atual é considerado técnico e são eles que aprovam o próximo presidente. Porém, os membros do colegiado foram indicados ainda no governo Temer. “Se o governo Bolsonaro, por acaso, quiser indicar uma pessoa e o conselho disser não, existe a possibilidade de forçar uma assembleia e formar um novo colegiado. Isso seria péssimo e colocaria em xeque o plano estratégico da estatal”, advertiu. “No entanto, existe uma boa chance de a Eletrobras conseguir colocar um nome técnico”, estimou.
Na opinião de André Cesar, cientista político da Hold Assessoria Legislativa, há interesses políticos fortes na estatal, como em todas as outras empresas públicas. “Isso é legítimo em um ambiente de presidencialismo de coalizão, onde essas instituições são usadas para se distribuir poder, porque é preciso apoio dos partidos para governar”, disse. “Como o governo está trabalhando muito forte na candidatura do Arthur Lira (PP-AL) para a Presidência da Câmara, faz sentido uma ação desse modo”, avaliou.
Suprimento
Apesar de desagradar o mercado e o setor elétrico, a mudança na presidência da Eletrobras não ameaça o suprimento de energia do país, mesmo que a empresa não seja privatizada e fique sem condições de fazer investimentos necessários para ampliar a geração e a transmissão. O presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape), Mário Menel, disse que a saída de Ferreira é uma perda significativa para o setor elétrico. “A decisão de um cargo como o dele é sempre política. Esperamos que seja substituído por alguém técnico. Porém, isso não deve afetar o abastecimento”, sustentou.
Menel lembrou que, no último leilão de transmissão, a própria Eletrobras entrou com lances conservadores. “Não levou, porque havia competidor mais agressivo, mas sinalizou que já tem condições de participar de leilões porque a dívida diminuiu. Além disso, o setor elétrico é relativamente organizado, e o investimento estrangeiro quer maior participação.”
Alexei Vivan, presidente da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE), também lamentou a saída de Ferreira, mas concordou com Menel de que isso não representa risco de desabastecimento de energia. “A Eletrobras tem necessidade de realizar investimentos. Ainda tem o maior parque gerador brasileiro e uma importância muito grande para o setor energético. Mas, o suprimento de energia não está só na mão dela. O setor privado vem assumindo essa função e já tem participação significativa”, afirmou.
O executivo alertou, contudo, que a privatização da empresa é necessária para que mantenha sua participação, uma vez que não tem recursos para fazer os investimentos necessários. “O país precisa aumentar a geração e a Eletrobras tem de investir na manutenção dos empreendimentos em operação e tem restrição orçamentária. Com a retomada da economia, precisaremos de mais fontes perenes, como hidrelétricas e térmicas, que garantam a segurança e deem confiabilidade ao setor.”
“!Além de deixar a incerteza em relação à privatização, a saída de Ferreira aumenta
o risco de intervenção do governo”
Pedro Serra, gerente de research da Ativa Investimentos
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Mercado em clima volátil
A Bolsa de Valores de São Paulo (B3) operou em clima de volatilidade, ontem, ao reabrir o pregão depois de um feriado prolongado. O Ibovespa, principal indicador do pregão, operou com altas e baixas durante o dia e chegou a bater 119 pontos, mas fechou a terça-feira aos 116.664 pontos, uma queda de 0,78%, a quinta consecutiva. O dia também teve queda no dólar comercial que recuou 3,3% e fechou cotado a R$ 5,327 para venda.
O mercado foi impactado pela renúncia de Wilson Júnior da presidência da Eletrobrás, que fez as ações da companhia recuarem mais de 10%. Por outro lado, o anúncio de que o executivo assumirá a gestão da BR Distribuidora levou a uma alta de 16% nos papéis da ex-subsidiária da Petrobras,
O fator que mais influencia os negócios, contudo, é a difícil situação das contas públicas. “Basicamente, a preocupação do investidor está em torno da situação fiscal do país, com a chance de extensão do auxílio emergencial, e como isso pode acontecer dentro da regra do teto de gastos. Há uma série de incertezas que preocupam os investidores”, ressaltou a economista-chefe da Reag Investimentos Simone Pasianotto
O economista da BlueMetrix Ativos Renan Silva afirma que o mercado entende não haver espaço para a extensão do auxílio emergencial e se preocupa com as reformas. “Elas podem trazer um alento, uma descompressão da dívida pública, para que depois se possam fazer planos para atender pessoas de baixa renda, ou utilizando os canais que já existem, como o Bolsa Família”, afirmou.
Câmbio
O analista de investimentos Daniel Medeiros diz que, de maneira geral e em cenário macroeconômico, há uma expectativa de que recursos externos continuem entrando no mercado financeiro do país, mas lembra que “qualquer medida que venha a estressar os investidores pode fazer esse dólar sair daqui”. Medeiros também destaca a importância das reformas. De acordo com ele, tanto a reforma tributária, quanto a reforma administrativa são os pontos-chaves para melhorar de fato o cenário econômico brasileiro.
*Estagiárias sob a supervisão de Odail Figueiredo
Tesouro Direto tem crescimento
Relatório do Tesouro Nacional indicou avanço no investimento no Tesouro Direto em 2020. O ano marcado pela pandemia do novo coronavírus mostrou um crescimento de 5,13% no programa, que fechou o ano com um montante de R$ 62,70 bilhões em aplicações. A pandemia também abriu portas para novos investidores e registrou um aumento de 20,19% de pessoas investindo no programa, fechando o ano com 1.443.685 investidores.
O último ano mostrou um avanço de investidores ativos no Tesouro Direto, conforme indica o relatório. Na comparação do mês de dezembro com novembro, o programa alcançou a máxima da série histórica com 67.839 pessoas, um aumento de 4,93%. Em relação aos cadastros, o programa também registrou alta de 2,91% na comparação com novembro e atingiu um total de 9.200.747 pessoas.
Fugindo do padrão, os jovens e as mulheres investiram mais no Tesouro Direto no ano passado. A participação feminina registrou aumento de 1,22% e alcançou 32,59%, ante 31,37% registrado em 2019. Os jovens com idade entre 16 e 25 anos também enxergaram uma possibilidade no programa, e sua participação atingiu o maior valor da série, com 20,6% do total de investidores.
Os títulos indexados à taxa Selic foram os mais demandados pelos investidores em 2020, totalizando R$ 11,47 bilhões ou 46,62% das vendas no programa. Já os títulos indexados à inflação somaram R$ 8,10 bilhões e corresponderam a 32,92% do total, enquanto os títulos prefixados totalizaram R$ 5,03 bilhões em vendas, ou 20,46%.
O motivo para isso pode ter sido a zeragem da taxa de custódia da B3 para os investimentos de até R$ 10 mil no Tesouro Selic, anunciada em agosto. A iniciativa motivou investidores a iniciarem investimentos no programa, que totalizou R$ 11,47 bilhões em 2020 em vendas.
Na quantidade de operações, 2020 registrou uma queda de 17,02% na comparação com 2019. No último ano, totalizou 4,57 milhões de operações, cerca de 381.329 mil por mês. As emissões somaram R$ 24,61 bilhões, com queda de 20,30.
As operações de resgate registraram queda de 13,62% na comparação com 2019. Em 2020, os resgastes somaram R$ 26,70 bilhões, ante R$ 30,91 bilhões no ano anterior. (Carinne Souza*)