Crise

Petrobras está valendo R$ 100 bi a menos

Perda de valor de mercado reflete a fuga dos investidores dos papéis da companhia, após decisão do presidente Jair Bolsonaro de trocar o comando da estatal. Com temor de que a empresa perca autonomia, ações da petroleira caem mais de 20% na Bovespa

Marina Barbosa
postado em 22/02/2021 23:55 / atualizado em 23/02/2021 01:35
 (crédito: MAURO PIMENTEL)
(crédito: MAURO PIMENTEL)

A Petrobras perdeu mais de R$ 100 bilhões em valor de mercado após a decisão do presidente Jair Bolsonaro de fazer mudanças na estatal. E, segundo analistas, ainda pode sofrer novas desvalorizações. É que, além da troca do comando da empresa, o mercado teme mudanças na política de preços da petroleira, que poderiam reduzir a lucratividade da companhia, sob o argumento de que é preciso controlar o valor dos combustíveis no Brasil. Além disso, a decisão do presidente foi vista como uma guinada na política liberal que ele sempre prometeu defender.

O resultado foi que, depois de cair 6% na sexta-feira, as ações da Petrobras despencaram mais de 20%, ontem, na Bolsa de Valores de São Paulo (B3). Os papéis da empresa, que eram negociados a R$ 29 na semana passada, recuaram para R$ 21. “A empresa perdeu 1/4 do valor de mercado por conta da possibilidade de que haja uma mudança significativa na forma da Petrobras definir preços e estratégias operacionais, que podem implicar resultados menores”, explicou o economista-chefe da Nova Futura Investimentos, Pedro Paulo Silveira. A queda das ações impôs fortes perdas aos acionistas e reduziu o valor da estatal de R$ 382 bilhões, na semana passada, para R$ 280 bilhões.

E o mercado teme que as ingerências políticas não parem por aí. A percepção é de que a troca do economista Roberto Castello Branco pelo general Joaquim Silva e Luna na presidência da Petrobras se repita em outras estatais, como o Banco do Brasil e a Eletrobras, enterrando a agenda liberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, que fez o mercado em peso apoiar a eleição de Bolsonaro em 2018.

Gestores de diversos fundos brasileiros recomendavam ontem a venda das ações da Petrobras e muitos investidores estrangeiros também preferiram se desfazer dos papéis da empresa. Mesmo depois de prometer que não vai interferir nos preços dos combustíveis, Bolsonaro deixou claro o incômodo com o aumento do diesel, da gasolina e do gás de cozinha, que vem disparando em função da elevação das cotações do petróleo no mercado internacional e da alta do dólar. Analistas lembram que medidas mencionadas pelo presidente para conter os preços, como a eventual redução de tributos, podem piorar a já delicada situação fiscal do país, se não forem compensadas. “O Brasil é um país considerado grau especulativo pelas agências de avaliação de risco. E toda essa incerteza interfere muito na performance dos nossos ativos”, afirmou a economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack.

As perdas de ontem, porém, foram generalizadas, e não se limitaram à Petrobras. As ações do Banco do Brasil (BB) sofreram um baque de 11,65%, diante do temor dos investidores de que a instituição, que quase teve o presidente, André Brandão, demitido neste ano, seja o próximo alvo de Bolsonaro. Com a insegurança tomando conta do mercado, o Ibovespa, principal indicador dos negócios na B3, fechou o pregão em queda de 4,75%, o maior tombo diário desde março do ano passado, no início da pandemia de covid-19. Já o dólar disparou 2,5% no início do pregão, batendo em R$ 5,51. Para segurar as cotações, o Banco Central (BC) vendeu US$ 1 bilhão em contratos de swap cambial, e a moeda fechou o dia com alta de 1,27%, cotada a R$ 5,45.

“O mercado vai ficar nessa volatilidade até ter uma definição clara do que vai acontecer. A maior perda da Petrobras parece ter passado, mas, se alguma coisa ruim for anunciada em relação à política de preços da empresa, ainda pode haver um efeito bem negativo”, afirmou o head de renda variável da Speed Invest, Rafael Gouveia. “É natural que o mercado ainda fique avesso ao risco nos próximos dias, até porque houve a promessa de novas mudanças”, reforçou Camila. Ela lembrou que, após a nomeação de Silva e Luna, Bolsonaro também prometeu “meter o dedo” na energia elétrica.

De acordo com os analistas, apesar de parecer justificada, o país perde com a postura intervencionista do presidente. “A Petrobras, ao se tornar uma empresa menor, vai ter menos capacidade de fazer investimentos — direta e indiretamente, a empresa responde por mais de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) —, melhorar a capacidade de refino de petróleo e gerar emprego. Isso afeta a percepção de risco do Brasil, tanto que o dólar e a curva de juros já subiram”, afirmou Silveira. Ele lembrou que a alta do dólar pressiona ainda mais o preço dos combustíveis e dos alimentos e frisou que a subida dos juros pode deixar a economia brasileira andando de lado por mais algum tempo, já que vai elevar o custo dos investimentos produtivos no país.

Deputado pede investigação
O vice-presidente do Cidadania, deputado Rubens Bueno (PR), encaminhou ontem ofício à CVM pedindo para que sejam investigados indícios de manipulação de mercado com as declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre a troca de comando na Petrobras. Na quinta-feira, Bolsonaro disse que haveria mudanças na estatal e, na sexta, indicou o nome do general Francisco Silva e Luna, para a presidência da companhia. No sábado, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) instaurou um processo administrativo para investigar o caso, mas não deu detalhes. A autarquia informou apenas que o processo trata de “notícias, fatos relevantes e comunicados”, mas não deu detalhes.

 

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