Dívida pública

Emissão recorde de títulos públicos não deve se repetir, veem analistas

Em fevereiro, o Tesouro Nacional emitiu R$ 177 bilhões em títulos da dívida pública, o que permitiu um colchão de liquidez robusto. Mas a situação pode se complicar entre março e maio, deixando as contas públicas em situação mais vulnerável

Rosana Hessel
postado em 25/03/2021 00:19

O Tesouro Nacional realizou um volume expressivo de emissões em fevereiro, mas, segundo analistas ouvidos pelo Correio, não deve repetir desempenhos semelhantes nos próximos meses, em razão do agravamento da pandemia e do aumento da desconfiança no governo pelo mercado.

Em fevereiro, o Tesouro emitiu R$ 177,96 bilhões em títulos da dívida pública, o segundo maior da história e “o melhor mês de fevereiro” da série, de acordo com Luis Felipe Vital, coordenador-geral de Operações da Dívida Pública do Tesouro. Descontados os R$ 66,46 bilhões em resgates, as emissões líquidas somaram R$ 115,5 bilhões.

Por causa dessas emissões robustas, o governo conseguiu garantir a necessidade de financiamento para os próximos seis meses, segundo Vital. Em fevereiro, o colchão de liquidez cresceu R$ 127 bilhões, somando R$ 933 bilhões, montante 15,8% superior ao de janeiro. “Esse volume é suficiente para mais de seis meses de vencimentos à frente”, garantiu Vidal, nesta quarta-feira (24/3), durante a apresentação virtual a jornalistas do relatório mensal da dívida pública. Ele contou que a rolagem antecipada ajudou a incrementar o montante de emissões, pois o Tesouro trocava os títulos vincendo por Letras Financeira do Tesouro (LFTs), indexadas à taxa básica de juros (Selic).

Novas emissões

Contudo, há um volume grande, de R$ 581 bilhões, de papéis vencendo entre março e maio. Esse montante pode ser um problema para o órgão conseguir fazer novas emissões para cobrir o rombo das contas públicas, na avaliação de analistas consultados pelo Correio. “A rolagem dessa dívida será um desafio este ano, em meio ao recrudescimento das incertezas econômicas e políticas, que aumentam a percepção de risco e pressionam as taxas futuras de juros, encarecendo assim o custo de novas emissões para o Tesouro”, afirma o economista Fabio Klein, da Tendências Consultoria.

Ele prevê um rombo de R$ 249 bilhões neste ano, dado acima da meta fiscal, de R$ 247,1 bilhões. O analista destacou que o custo médio das emissões aumentou de 4,6% ao ano, em janeiro,para 4,7% ao ano, em fevereiro, e "a tendência é de que o custo da dívida continue aumentando".

O economista Sergio Goldenstein, consultor independente da Ohmresearch Independent Insights, também acredita que o Tesouro terá mais dificuldade para fazer grandes emissões em meio às turbulências atuais. “Fevereiro teve um aumento discreto nas taxas de juros dos títulos prefixados, mas março está mais significativo e essa abertura foi intensificada após a decisão do Banco Central em elevar a Selic (taxa básica da economia) em 0,75 ponto percentual e soltar um comunicado duro”, avalia.

Ele lembra que a curva de juros futuros já está bastante inclinada devido ao aumento da desconfiança do mercado no governo e no BC, mostrando uma Selic de 6,5%, no fim deste ano, e de 9%, no fim de 2022.

Estoque crescente

O volume de títulos da União emitidos nos mercados interno e externo e que compõem o estoque da DPF registrou crescimento de 2,7% em relação ao mês anterior, totalizando R$ 5,198 trilhões.

Vital reconhece que o custo aumentou em março, mas evita qualificar como uma tendência. “Março foi um mês com um pouco de mais turbulência nos mercados e de elevação das taxas de juros. Podemos observar custos maiores, sim. Mas não significa uma tendência”, analisa. O técnico lembra que o Tesouro trabalha com devoluções programadas dos aportes da União no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que somam R$ 100 bilhões neste ano, e que devem ajudar a reduzir a necessidade de emissões. Em março, foram pagos R$ 38 bilhões.

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