Relator do Orçamento de 2021, o senador Marcio Bittar (MDB-AC) voltou atrás parcialmente na manobra contábil e reduziu em R$ 10 bilhões o volume de emendas parlamentares que havia criado, cortando R$ 26,5 bilhões de despesas obrigatórias.
Em ofício enviado ao presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (31/3), Bittar solicitou o cancelamento de R$ 10 bilhões nas emendas extras do relator, abrindo espaço para um remanejamento de despesas. Fez questão de destacar, ainda, que o relatório "aumentou os recursos para as áreas de saúde e de educação na ordem de R$ 10 bilhões e R$ 2 bilhões", respectivamente.
De acordo com um assessor legislativo da Câmara, o relator pode solicitar o cancelamento de despesas ou concordar com o cancelamento de iniciativa do Executivo e, com isso, o envio de um projeto de lei ao Congresso com reprogramação orçamentária não será necessário. "Pode ser feito com decreto ou portaria, a depender da despesa e do volume", informou.
Na avaliação do especialista em contas públicas Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, esse corte de apenas R$ 10 bilhões proposto por Bittar não refresca em nada o problema que está sendo enfrentado pela equipe econômica em torno do Orçamento. “É uma meia-sola, um remendo novo em um sapato velho”, lamentou. Pelas contas dele, as emendas parlamentares somam R$ 46,3 bilhões antes do ofício e, agora, passariam para R$ 36,3 bilhões.
Técnicos do Ministério da Economia também reconhecem que a medida é insuficiente para sanar os problemas do Orçamento. Inclusive, demonstram preocupação com o fato de o relator sinalizar que o corte só ocorrerá após a sanção da peça orçamentária, o que é impossível no momento. "É um gesto político importante, mas não resolve", disse uma fonte da equipe econômica.
A manobra contábil de Bittar provocou um rebuliço em torno da peça orçamentária que tem tirado o sono da equipe econômica, porque abriu espaço para vários crimes de responsabilidade fiscal, tanto para o presidente quanto para o ministro da Economia, Paulo Guedes, e para os gestores da pasta que são responsáveis por assinar as liberações de recursos, se o Orçamento for sancionado do jeito que foi aprovado pelo Legislativo.
Os crimes enumerados são vários, desde pedaladas fiscais, contabilidade criativa e maquiagem contábil, e parlamentares já acionaram o Tribunal de Contas da União (TCU) para dar um parecer sobre o Orçamento. Vários analistas reconhecem que a situação fiscal atual pode ser considerada pior do que a existente quando foi aberto o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) que foi aprovado na quinta-feira passada (25) é considerado inexequível por não ter atualizado os parâmetros macroeconômicos, subdimensionado as despesas e superestimando as receitas. Nem mesmo o salário mínimo de R$ 1.100 foi atualizado e a peça orçamentária aprovada ainda prevê os R$ 1.067 iniciais.
Buraco
Vale lembrar que o relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas da pasta apontava um buraco de R$ 17,6 bilhões para o cumprimento do teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior —, antes mesmo de Bittar cortar despesas obrigatórias em R$ 26,5 bilhões, incluindo aposentadorias e abono salarial. A Instituição Fiscal Independente (IFI) estima um buraco de R$ 31,9 bilhões para que a regra do teto não seja quebrada.
Logo, a certeza entre os analistas é que será preciso um contingenciamento de despesas elevado para evitar o descumprimento de regras fiscais, mas não está certo se ele será suficiente para evitar uma paralisação da máquina, pois o autógrafo do Congresso ainda não chegou nas mãos dos técnicos da economia. De acordo com o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, o limite das despesas discricionárias para evitar um shutdown é de R$ 70 bilhões.
“Mesmo com essa sinalização do relator, o governo ainda vai ter que fazer um contingenciamento. Mas ele poderá cortar, na mesma proporção das despesas do Executivo, as emendas parlamentares, individuais, de bancada, de comissão e do relator”, aconselhou Castello Branco. “Claro que, politicamente, o presidente não vai querer entrar em atrito com o Centrão e, por conta disso, estão tentando um acordo, de qualquer maneira, e essa sinalização do relator parece ser nesse caminho”, acrescentou.
Contudo, segundo fontes próximas aos assessores de Bittar, a confusão é tamanha que, há quase uma semana da aprovação da LOA, o "autógrafo" com a relação de todos os fatores todas as emendas e despesas do Orçamento não foram entregues ainda, o que impede os cálculos da equipe econômica para definir qual será o real tamanho do contingenciamento que precisará ser feito.
"O Congresso devolve R$ 10 bilhões e o governo deverá contingenciar um valor menor, preservando as emendas", destacou Castello Branco. No entanto, ele lembrou que um dos problemas mais graves da manobra de Marcio Bittar, que cortou R$ 13,5 bilhões de despesas obrigatórias com aposentadorias, ainda não foi totalmente solucionado. "Essa irregularidade é flagrante", frisou.
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