Conjuntura

Um quarto dos jovens de 15 a 29 anos não estuda nem trabalha, aponta FGV

Situação dessa parcela da população ficou mais difícil com os impactos econômicos da covid. Especialista defende melhores programas de inclusão no mercado de trabalho

Rosana Hessel
Alexia Oliveira*
postado em 18/05/2021 06:00
 (crédito: Fernando Lopes/CB/D.A Press)
(crédito: Fernando Lopes/CB/D.A Press)

Os impactos econômicos da pandemia de covid-19 têm afetado ainda mais os jovens, grupo dos mais vulneráveis neste momento de crise. Um levantamento feito pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV Social) concluiu que a quantidade de pessoas entre 15 e 29 anos que não estudam nem trabalham — os chamados “nem-nem” — continua em franca expansão. Chegou a bater recorde histórico, de 29,33%, no segundo trimestre do ano passado, o maior patamar da série iniciada em 2012.

Na segunda metade do ano passado, a faixa dos jovens “nem-nem” recuou, passando para 25,5%, no quarto trimestre de 2020, conforme o estudo do FGV Social. A percentagem de nem-nem no fim de 2020 é superior aos 23,6% contabilizados no fim de 2019 e está próximo do pico anterior, de 26,3% registrado no fim de 2016.

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Marcelo Neri, diretor do FGV Social e coordenador do estudo, atribui a tendência de alta à falta de políticas inclusivas de jovens entre 15 e 20 anos no mercado de trabalho. “Essa é a má notícia com a chegada da pandemia para os jovens, porque o mercado de trabalho ficou mais difícil. O maior problema do jovem continua sendo o desemprego, desde a recessão anterior, e foi agravado com a retração da economia no ano passado”, destacou.

De acordo com Neri, o Brasil tem cerca de 50 milhões de jovens entre 15 e 29 anos — e mais da metade dessas pessoas está desempregada. No fim de 2020, o percentual ficou em 56,3%, patamar abaixo do pico de 58,6% registrado no segundo e no terceiro trimestres de 2020. “O jovem que não consegue trabalhar acaba não estudando também, e isso prejudica as chances de mobilidade social nessa camada da população”, alerta Neri.

O diretor do FGV Social afirma que, apesar do cenário desolador, um dado positivo no estudo é a queda da evasão escolar. Passou de 62,6%, em 2019, para 57,9%, em 2020 — o menor patamar da série histórica. “Isso mostra que pelo menos parte dos jovens acabou retomando os estudos, mas, infelizmente, não é um reflexo de melhoria na qualidade da educação”, comenta. “A combinação entre falta de oportunidades de inserção trabalhista com menor cobrança escolar, especialmente devido às aprovações automáticas, podem explicar a queda na evasão”, acrescenta o especialista. Na avaliação de Neri, é preciso aproveitar que há mais jovens nas escolas e promover inclusão digital e novos conteúdos educacionais remotos, não apenas durante a pandemia.

Contudo, o especialista reconhece que, além de recursos escassos para a educação, o governo não tem um bom programa focado na inserção dos jovens estudantes no mercado de trabalho. Uma das tentativas oficiais, o Carteira Verde Amarela, lançado no fim de 2019, não emplacou, lembra o diretor do FGV Social. “Os programas de inclusão social do governo não decolam e são abatidos no meio do caminho, como o Renda Cidadã, que só teve um balão de ensaio no ano passado e foi abatido no meio da pandemia”, lamentou. “Falta mais apoio do governo para a educação em geral”, frisa Marcelo Neri.

Procurado, o Ministério da Economia negou que o programa da Carteira Verde Amarela tenha sido ineficaz. Segundo a pasta, o governo federal criou o Programa Emprego Verde e Amarelo, por meio da Medida Provisória nº 905/2019, “mas o Congresso Nacional não apreciou, e a MP perdeu a validade”, informou, em nota. “A ideia do governo era incentivar a contratação de jovens e inserir pessoas com deficiência e reabilitados”, acrescentou o texto enviado pelo ministério.

“Está complicado”

Os dados do estudo do FGV Social mostram que, além de aumentar em quantidade nos últimos anos, o perfil dos jovens “nem-nem” é composto, em grande parte, por pessoas menos privilegiadas no mercado de trabalho: mulheres, negros, pessoas sem instrução e que habitam nas regiões mais pobres do país: Norte e Nordeste (leia quadro ao lado). Quase 67% dos jovens “nem-nem”, por exemplo, não têm instrução — percentual bem acima dos 56% registrados no fim de 2014. E, mesmo nas capitais, o número de jovens que não trabalham nem estudam cresceu, entre 2014 e 2020, passando de 19,1% para 26,5%. Logo, o aumento da população de jovens “nem-nem”, de acordo com Neri, reflete o comprometimento de uma geração inteira, que deve deixar de contribuir para o crescimento do país.

Essa realidade atinge brasileiros como Fernando Pereira, 24 anos, morador do município de São João dos Patos (MA). Ele reclama das restrições. “Onde eu moro, temos poucas oportunidades, tanto no emprego como nos estudos. Uma das maiores dificuldades na busca de um emprego é a falta de experiência em determinadas áreas. A maioria das empresas não oferece oportunidades”, lamentou.

Apesar dos obstáculos, Pereira tenta demonstrar confiança de que vai conseguir dar a volta por cima. “Estou tentando ser o mais otimista possível. Acredito que venha melhorar, mas confesso que está sendo complicado”, frisou o jovem.

*Estagiária sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza

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