O mercado financeiro já precificou a alta das contas de luz em consequência da situação de emergência hídrica vivida nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, responsáveis por 70% da geração hidrelétrica do país. A falta de chuvas contribuiu para que economistas de instituições financeiras aumentassem pela oitava vez seguida as projeções para a inflação deste ano, levando a estimativa do índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para este ano a superar o teto da meta fixada pelo governo. De acordo com o Boletim Focus, do Banco Central, a mediana das previsões passou para 5,31%, ante 5,24% no levantamento anterior. O teto da meta para 2021 é de 5,25%.
“O mercado já incorporou a elevação das tarifas da energia elétrica”, afirmou Alex Agostini, economista-chefe da classificadora Austin Rating. “A cada ponto percentual na energia elétrica, temos uma contribuição de 0,4 ponto da energia. Em maio, somente por causa da bandeira vermelha, a energia foi responsável por 0,16 ponto percentual no IPCA”, lembrou Agostini. O temor de que possa ocorrer um novo apagão no país também passou a fazer parte do receio de alguns analistas.
Ontem, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, garantiu, porém, que o país não corre o risco de sofrer um apagão ou passar por um racionamento severo de energia. No entanto, admitiu que o quadro exige cuidado e o consumidor terá de economizar, enquanto o governo busca fontes disponíveis para gerar eletricidade em substituição à que vai faltar em boa parte das usinas hidrelétricas. Em evento com investidores no Fórum de Investimentos 2021, da Apex Brasil, ele ouviu demandas dos empresários sobre investimentos no setor, principalmente em fontes renováveis, e disse que a situação é muito complexa. “Precisamos da colaboração de todos. Não tenho dúvidas que vamos superar”, afirmou o ministro.
De acordo com analistas, a estiagem vai afetar o bolso do brasileiro em duas frentes. Por um lado, o consumidor terá que conviver com conta de luz mais caras, em consequência da crise hídrica. Por outro, perceberá uma significativa perda do poder de compra, porque todos os setores da economia vão repassar os custos para os clientes.
Efeito cascata
Adriano Gomes, consultor da Méthode Consultoria, destacou que, além da alta das matérias-primas, a crise hídrica adicionou mais risco ao cenário. “Não vejo a probabilidade de ocorrência de racionamento, visto que há como reequilibrar a oferta de energia por outras fontes. Porém, o uso dessas outras fontes tornará mais cara a energia para empresas e pessoas”, reiterou Gomes. Felipe Queiroz, economista e pesquisador da Universidade de Campinas (Unicamp), reforçou que a energia é um bem fundamental e envolve quase todas as etapas do processo produtivo. “A alta na conta de luz produz um efeito-cascata que interfere em todos os setores da vida”, disse.
O deputado Édio Lopes (PL-RR), presidente da Comissão de Minas e Energia (CME) da Câmara, vê riscos, mas considera que “apagão é improvável”, porque o governo já se prepara para fazer leilões de energia de termelétricas. “O cenário não é bom. Até o fim do ano, temos risco de falta de energia. É lógico que, com essa baixa nos reservatórios, o aumento da tarifa será inevitável. Depois da queda, vem o coice”, disse o parlamentar.
Diante das críticas de especialistas sobre a falta de investimentos em energia eólica e solar, o deputado ponderou que “já houve muito recurso, principalmente nos dois últimos anos. “Investimento em energia renovável não se faz de uma hora para outra, principalmente em nosso país, por questões ambientais. É uma coisa horrível, até para a implantação de uma pequena unidade. Há casos de que um plano de controle ambiental demora 12 anos. Um problema para quem quer investir”, destacou.
Estagiário sob a supervisão de Odail Figueiredo
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Matriz suja sofrerá taxação
Na contramão do governo Bolsonaro, que acumula recordes de desmatamento da Amazônia, afugenta fundos internacionais em favor do meio ambiente e tem um ministro acusado de conluio com madeireiros ilegais, o chefe da equipe econômica, Paulo Guedes, partiu em defesa da sustentabilidade, pelo menos no discurso. Em evento para investidores estrangeiros, ele prometeu reduzir incentivos à energia suja, como gasolina e diesel, e dar mais benefício fiscal às fontes de energia renovável na reforma tributária.
“Nossos incentivos não serão mais em cima de energia suja. Com nossa reforma tributária, estaremos avançando na isenção para economia verde e digital”, prometeu o ministro, na manhã de ontem, no segundo painel da quarta edição do Fórum de Investimentos Brasil, organizado pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o governo federal.
Segundo os organizadores, o evento virtual registrou 5.203 inscrições, dos quais 1.435 foram de estrangeiros. O país com maior número de participantes, depois do Brasil, com 3.768, foram os Estados Unidos, com 275 inscritos, e, na sequência, veio a China, com 142. O fórum termina hoje.
Ao defender no discurso de cerca de 30 minutos a adoção de medidas para proteger o meio ambiente, uma exigência de grandes investidores e de importadores europeus, principalmente, Guedes assegurou que o país vai se tornar “o centro da economia biossustentável”. “O Brasil, entre as economias do G20 (grupo das maiores economias do planeta), tem a matriz energética mais limpa do mundo e está avançando na energia eólica e estamos dando os primeiros passos na economia do hidrogênio”, disse. “A Amazônia será um centro de provisão de serviços para a economia do meio ambiente. Nós sabemos que uma árvore vive vale mais do que uma árvore morta”, acrescentou o ministro.