CARESTIA

Consumidor gasta mais, mas enche menos os carrinhos de supermercados

Custo da cesta de produtos mais vendidos nos supermercados aumenta 21,88% em um ano. Clientes estão tendo cada vez mais que diminuir a quantidade de mercadorias colocada no carrinho, ou substituir itens habituais por outros mais em conta

Vera Batista
Gabriela Chabalgoity*
postado em 11/06/2021 06:00
Vendas caíram 4,82% em abril, devido ao impacto dos preços mais altos -  (crédito: Ed Alves/CB)
Vendas caíram 4,82% em abril, devido ao impacto dos preços mais altos - (crédito: Ed Alves/CB)

O setor de supermercados registrou, no primeiro quadrimestre deste ano, um crescimento real (descontada a inflação) de 4,06% nas vendas, de acordo com dados do Índice Nacional de Consumo dos Lares da Associação Brasileira de Supermercados (INC Abras), que abrange uma cesta dos 35 produtos mais consumidos pelos clientes. No entanto, mesmo com os supermercados vendendo mais, o consumidor está enchendo menos o carrinho, devido ao aumento dos preços.Em abril, segundo a Abras, houve queda de 4,82% em relação a março.

O impacto da inflação no bolso dos consumidores tem sido severo e vem crescendo desde o ano passado, pelos reflexos da pandemia e pelo sumiço de alguns itens das prateleiras. O Índice Abrasmercado, revela que, desde abril de 2020, quando o custo para adquirir os 35 produtos era de R$ 528,14, houve incremento no desembolso de 21,88%. Agora, para levar para casa os mesmos produtos, o consumidor vai ter que gastar R$ 643,67. A quantia é também superior à do mês de março (0,92%), quando o custo total era de R$ 633,38.

Os produtos com as maiores altas, em grande parte, são os mais demandados nas mesas dos cidadãos, principalmente os de baixa renda. Em 12 meses, a margarina cremosa subiu 19,87%; o biscoito cream cracker, 8,77%; a cebola, 5,59%; e o papel higiênico, 0,40%. Somente o tomate ficou 22,31% mais barato. “Ai vai uma dica para usar o tomate nos seus preparos”, aconselhou Marcio Milan, vice-presidente institucional e administrativo da Abras. A batata também caiu 13,03% nos últimos 12 meses encerrados em abril.

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Dinheiro curto

O aumento dos preços já interfere no consumo das famílias, que ficaram sem ter para onde correr. O ovo, quase sempre um dos escolhidos no processo de mudança forçada de hábitos alimentares quando o dinheiro é curto, deu um salto. Subiu 11,43%, entre janeiro e abril de 2021. Diante do cenário, Marcio Milan aconselhou uma nova substituição, por exemplo, para a carne suína, que teve queda de 8,91% no preço, no primeiro quadrimestre de 2021.

A pedagoga Ivoneide Dias, 50 anos, está espantada com os preços. “Comprava verdura e fruta toda semana, um pouco de cada. Agora, procuro a fruta da estação, porque normalmente está mais barata. Antes, eu tinha variedade. Isso mudou. Compro uma ou duas, quando está em promoção”, contou.

Ivoneide conta que, nas idas ao supermercado, passou a usar uma lista de produtos para evitar comprar mais do que pode. Mesmo assim, teve que substituir produtos. “Não uso mais azeite, voltei para o óleo de girassol. A gente sempre comia de 15 em 15 dias filé mignon, camarão, essas coisas. Não temos mais condições nenhuma de comprar”, acrescentou.

Já a professora Viviane Bosso Pancheri, 38 anos, tem ido mais a mercados menores que, segundo ela, ainda estão com preços mais razoáveis. “Tenho uma alimentação vegana. Apesar do surgimento de vários produtos para esse público, não noto baixa de preço, diante de concorrência. Sobre produtos mais básicos da cesta, tenho dado preferência para os minimercados de bairro, onde os preços estão melhores, e costumo comprar o necessário apenas para a semana”, disse.

Entre os produtos da cesta da Abras que tiveram maior aumento no preço, entre janeiro e abril, estão ovos, com 11,43%, carne (dianteiro), 6,32% e feijão, 5,02%. Os preços do pernil (-8,91%), do leite longa vida (-4,48%) e do (-3,60%) tiveram queda nos quatro primeiros meses do ano. Mas, nos últimos 12 meses, a soja foi a campeã, com alta de 88,2%, seguida do arroz (64,3%) e da carne (40,1%). “Isso aconteceu devido ao aumento do custo de produção e também ao câmbio favorável às exportações”, assinalou o vice-presidente da Abras.

Impacto global

O economista William Baghdassarian, do Ibmec Brasília, afirma que é preciso analisar o que aconteceu em 2020, com relação à inflação e à perda de renda. “No ano passado, a pandemia do coronavírus causou vários impactos macroeconômicos locais e globais. O efeito do câmbio nos produtos agrícolas e em uma série de outros bens levou o Índice de Preços ao Consumidor Amplo IPCA a 4,3%. Mas a inflação do Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M) ficou muito alta, em 23%. O IGP-M provocou, então, esses preços exorbitantes”, destacou o economista.

Baghdassarian explicou, ainda, sobre a substituição por itens que cabem no bolso. “No começo deste ano, devido à expansão da renda com o auxílio emergencial, as pessoas puderam comprar um pouco além. Mas a crise que vivemos é debilitante. A inflação veio da expansão da dívida pública e da política fiscal descontrolada. O que está acontecendo agora no mercado é a representação final de um processo que começou lá atrás”, ressaltou.

A Região Norte se mantém como a primeira no ranking dos preços mais altos na cesta de 35 produtos da Abras, com R$ 728,76 (alta de 29,53% em 12 meses). Em seguida, vem o Sul, com R$ 694,99 (18,49%), o Sudeste, R$ 622,87 (20,78%), o Centro-Oeste, R$ 601,93 (20,09%) e o Nordeste, R$ 569,78 (20,04%). Brasília se manteve no topo do preço mais salgado das unidades da Federação. Em abril, a capital tinha uma cesta no valor de R$ 726,22, o maior do país, com variação positiva de 0,91% em relação a março e de 22,15%, nos últimos 12 meses.

*Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo 

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