Incerteza fiscal afasta investidor

Correio Braziliense
postado em 26/06/2021 21:56

Analistas reconhecem que, apesar de o cenário de 2021 ser mais benigno para a dívida pública bruta — que deverá encolher em comparação com os dados de 2020 —, o endividamento continua elevado em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), os riscos fiscais não desapareceram e poderão ter efeitos ruins no mercado ao longo do ano que vem.

Além disso, como a regra do teto de gastos já foi burlada em 2020 e neste ano, por conta da pandemia, com a retirada do cálculo do limite das despesas emergenciais contra a covid-19, especialistas reconhecem que essa única âncora fiscal continua sob ameaça em 2022.

Não à toa, os investimentos estrangeiros diretos no país desabaram 61,3% em maio, para US$ 1,2 bilhão, o menor volume para mês desde o início da série histórica, em 2007, conforme dados do Banco Central.

De olho nesse movimento, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, chamou a atenção para o risco, na quinta-feira, na apresentação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI). Ao defender que a inflação não é temporária, ele mostrou maior preocupação com os riscos fiscais, apesar da queda da dívida pública bruta neste ano, e reconheceu haver ameaças ao teto de gastos. “A mensagem não é só inflacionária, mas temos um arcabouço do teto de gastos que tem sido desafiado com frequência. Temos um ano de eleições pela frente e entendemos que, apesar da trajetória da dívida vivendo números melhores, isso (ano eleitoral) é um risco de possível rompimento do teto e de aumento de gastos”, afirmou.

Fatores

“Estamos em uma situação que é combinação de três fatores muito desfavoráveis. Primeiro, a perspectiva de alta de juros lá fora ajuda a tirar o capital estrangeiro do país. Segundo, a inflação mais alta exige juros mais elevados e, claramente, isso vai contra a popularidade do governo. E, por último, o ambiente político está muito incerto e, quando o investidor de longo prazo olha para esse cenário, fica mais cauteloso”, explica o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves.

Na avaliação do analista, essa conjuntura com incertezas maiores na economia e na política, combinada com a perspectiva de piora do quadro fiscal, não deverá ajudar o dólar a manter-se abaixo de R$ 5 por muito tempo. “Ainda precisamos saber como a economia vai se comportar no segundo semestre. Se nada acontecer, o PIB poderá crescer 5%, mas, se o quadro for mais adverso, não podemos descartar uma taxa de 4,5%”, afirma.

A queda na popularidade do presidente Jair Bolsonaro também deverá colocar mais em xeque a credibilidade do ministro da Economia, Paulo Guedes, que não consegue pôr de pé a agenda econômica liberal prometida em campanha. “A credibilidade do ministro Guedes junto ao mercado está encolhendo enquanto Bolsonaro está mais propenso a tomar atitudes populistas e a ceder às pressões do Centrão diante da queda da popularidade”, alerta a economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria.

Para ela, as propostas de reformas encaminhadas por Guedes ao Congresso estão desidratadas, com efeitos muito pequenos ou na contramão da agenda liberal, como ocorreu com a medida provisória da privatização da Eletrobras (MP 1031/2021), aprovada pelo Parlamento, na terça-feira, com uma série de jabutis — emendas não relacionadas ao tema principal. (RH)

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