CONJUNTURA

Desemprego: para especialistas, dados do IBGE suavizam a realidade

Após o instituto divulgar pesquisa mostrando que 14,6% da força de trabalho — ou 14,8 milhões de pessoas — estão sem emprego no país, o ministro da Economia contesta a validade dos dados e diz que o órgão está "na idade da pedra lascada"

Rosana Hessel
postado em 31/07/2021 06:00
 (crédito: Edu Andrade/Ascom/ME)
(crédito: Edu Andrade/Ascom/ME)

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou, ontem, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua referentes ao trimestre móvel de março a maio, que registrou 14,8 milhões de desempregados no país e uma taxa de desemprego de 14,6% da força de trabalho.

Esses dois dados foram os maiores para o período desde o início da série histórica, em 2012, e não agradaram ao ministro da Economia, Paulo Guedes, que resolveu criticar a metodologia do órgão. “O IBGE ainda está na idade da pedra lascada”, disse o ministro, ontem, em um evento no Rio de Janeiro.

Analistas saíram em defesa do IBGE. Eles reforçaram que os dados apurados pelo instituto são confiáveis e mostram a realidade do mercado de trabalho — que continua fraco e vai demorar para se recuperar da crise provocada pela pandemia da covid-19.

Segundo o IBGE, apesar de o percentual de desocupados em revelado pela Pnad ter ficado levemente abaixo dos 14,7% registrados na pesquisa anterior, houve aumento de 2,1 milhões de pessoas desempregadas em relação ao mesmo período de 2020, quando o índice de desemprego estava em 12,9% — no auge da primeira onda da covid-19. Estimativas do banco Haitong mostram que um patamar parecido só deverá voltar no fim de 2023, quando o desemprego chegará a 12,8%.

A Pnad mostrou, ainda, que a informalidade cresceu no trimestre encerrado em maio, chegando a 40% da população ocupada. São 34,7 milhões de pessoas, acima das 34 milhões contabilizadas no trimestre encerrado em fevereiro. O número de trabalhadores subutilizados também aumentou na comparação com o mesmo período de 2020, alcançando 29,3% — maior patamar da série histórica para o período.

Vale lembrar que o rendimento médio do trabalhador está encolhendo a olhos vistos, enquanto a inflação dispara e corrói o poder de compra do cidadão. Chegou a R$ 2.547 no trimestre encerrado em maio, valor 3,2% abaixo do registrado no mesmo período de 2020.

De acordo com os especialistas, os dados do IBGE, na verdade, suavizam a realidade, porque contabilizam apenas pessoas que procuram emprego e não encontram, deixando de fora as que desistiram de sair em busca de trabalho. O contingente de desalentados somou 5,7 milhões em maio, ou 5,3% da força de trabalho. Logo, seria mais coerente considerar que o número real de desempregados é 20,5 milhões, com taxa de desocupados de 20,1%.

“A taxa de desemprego do IBGE atenua a questão do cálculo tradicional feito por vários países, que consideram as pessoas que estão procurando emprego no momento e as que desistiram de buscar trabalho. Com isso, a taxa de desemprego seria bem maior do que a divulgada pela Pnad, de mais de 20%”, alertou o economista Rodolpho Tobler, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre).

Na avaliação de Tobler, uma recuperação robusta do mercado de trabalho “só vai ocorrer quando houver retomada de fato da atividade por conta do avanço da vacinação e do controle da pandemia”. Ele lembrou que os dados positivos do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) para o mercado formal de trabalho divulgados na véspera pelo governo e comemorados por Guedes, não são comparáveis com os dados da Pnad.

Pelas estimativas do economista e ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman, o desemprego ainda está elevado, em torno de 20%, e a base de pessoas ocupadas em maio ainda tem 7 milhões de pessoas a menos do que em fevereiro de 2020. “Os empregos com carteira assinada ainda estão longe da recuperação e 4,3 milhões inferiores aos dados de fevereiro de 2020”, acrescentou. Ele citou uma nota técnica do Ministério da Economia que reconhece lacunas na nova metodologia do Caged, “como a falta prestação da informação, ou inconsistências causadas por migrações de sistemas ao longo do seu ciclo de vida”. “Se o ministro lesse o que sua pasta produz, talvez não passasse vergonha”, disse Schwartsman.

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