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Classe alta aposta em compras no atacado para contornar inflação

Consumidor recorre à compra em maiores quantidades para contornar o aumento da inflação

Deborah Hana Cardoso
postado em 16/04/2022 06:00 / atualizado em 16/04/2022 06:44
 (crédito: Fort Atacadista)
(crédito: Fort Atacadista)

Pesquisa realizada pela NielsenIQ, divulgada ontem, mostra que as famílias das classes mais altas estão optando pelos chamados atacarejos — hipermercados que fazem venda de produtos tanto no atacado como no varejo — como forma de se proteger contra a inflação dos alimentos. De acordo com o levantamento, dois em cada três lares brasileiros — ou seja, 66% — vêm optando por comprar em maior quantidade para evitar os seguidos aumentos de preços.

Mesmo depois da estabilização da moeda, a formação de estoques caseiros permanece um hábito entre os brasileiros. Economistas atribuem isso à memória da hiperinflação, quando as pessoas compravam mais produtos do que realmente necessitavam apenas para não pagarem mais caro — às vezes no dia seguinte — por eles. Até a entrada em vigor do Plano Real, em 1º de julho de 1994, somente em 1989 a inflação no Brasil alcançou 1.782%.

O diretor de varejo da NielsenIQ, Roberto Butragueño, explicou que a opção pelos atacarejos vem crescendo de cinco anos para cá. "O atacarejo passou de 47% para 67%, ganhou 20 pontos percentuais em penetração no consumo. Isso veio da classe média e da alta, além das outras classes que já eram clientes. Desde a crise de 2015 e 2016, o consumidor vem buscando economizar", observou.

Segundo Butragueño, a pandemia ajudou a turbinar ainda mais os atacarejos, pois o consumidor queria fazer compras maiores para sair menos de casa. "Mas a inflação causou grande impacto. Tem o consumidor que precisa economizar, pois seu lar perdeu renda. Mas há lares que, embora não tenham sofrido um impacto direto, se adaptam e incorporam a cultura da economia. A Nielsen calculou que os só os preços dos alimentos dos últimos três anos estão 30% mais caros", observou. De acordo com a pesquisa, o segmento de atacarejo movimentou R$ 200 bilhões em 2021.

Para Marcelo Neri, diretor do FGV Social, da Fundação Getulio Vargas, no começo da pandemia houve perda de poder de compra. Mas, agora, o problema é o empobrecimento geral da população.

"A renda do trabalho desvalorizou 10%. Então, é natural que as pessoas da classe média busquem o desconto, uma redução de preços, pontos de distribuição mais em conta", disse. Ele acrescenta que a maior procura pelos atacarejos também se deve à memória inflacionária de mais de 30 anos atrás.

"O consumidor diversifica, muda o ponto de compra para tentar baixar sua inflação. Quem compra carne não vai deixar de comprá-la. Pode diminuir a frequência ou tentar achar locais mais baratos. Nesse ponto, é importante tentar entender o hábito de consumo, pois é normal que se mude o local de compra em vez de deixar de consumir", observa.

Presente caro

Para a Páscoa deste ano, os ovos de chocolate apresentam um aumento de preço em torno de 40% a mais que em 2021. É o que mostra uma pesquisa realizada pela Associação Paulista de Supermercados (Apas). Por causa disso, ovos menores, como os de 250 gramas, vêm ganhando mais espaço nas gôndolas.

A confeiteira brasiliense Naiara Cordeiro, 24 anos, percebeu isso e vem tentando se adaptar à situação para manter os clientes que tem e conquistar novos. Apesar da menor quantidade de produção, ela tem oferecido ovos de Páscoa com preços mais competitivos do que os encontrados nos supermercados. Mas ela reconhece que foi preciso fazer adaptações.

"Deixei de fazer recheios por causa dos preços, pois teria que cobrar mais caro e ninguém se interessaria. A Nutella é o único produto caro que todos querem e que vale a pena manter (nos produtos que fabrica)", disse.

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