VIAGENS

Após retração pela pandemia, férias impulsionam crescimento do turismo

Após dois anos de crise causada pela pandemia de covid-19, setor comemora. Mesmo com o alto preço das passagens, brasileiros vão aproveitar as férias

Com a chegada do inverno e do mês de julho, muitas famílias decidem viajar para visitar os parentes distantes ou apenas aproveitar o passeio em pontos turísticos. As férias escolares prometem ser mais movimentadas que nos anos anteriores, devido ao avanço da vacinação contra a covid-19 em todo o Brasil. No entanto, alguns fatores podem atrapalhar o crescimento do turismo no país, como o preço alto dos combustíveis e das passagens aéreas.

O casal Bruna Uaqui, de 25 anos, Daniel Santos, vão passar a lua de mel na cidade de Caldas Novas, em Goiás — destino turístico do Centro-Oeste, para quem gosta de aproveitar as altas temperaturas das águas que correm pela região.

Daniel pediu Bruna em casamento na noite de Natal do ano passado e o casamento ocorreu neste sábado (25), na Paróquia Nossa Senhora da Saúde, na 702 Norte. A noiva conta que planejava passar os primeiros dias de casamento em um destino mais frio, comum nesta época de inverno no país. No entanto, os preços salgados foram um impeditivo para o casal.

"Primeiro pensamos em alugar um chalezinho no Airbnb em algum lugar frio, como Gramado. Mas não encontramos um lugar bonito e confortável. Também não achamos que o local estava valendo o custo", revela Bruna.

A opção, então, passou a ser um lugar mais próximo a Brasília. "Decidimos passar a lua de mel no resort de Rio Quente, pois, além de sair mais em conta, eu gosto muito de piscina e não sou muito fã de mar e cachoeiras", conta.

As férias de julho também são uma oportunidade para rever os familiares. A arquiteta Anna Angélica Bento, 31, vai aproveitar o período para visitar os avós e parentes que vivem em Imperatriz, no Maranhão. A viagem servirá para reencontrar os familiares após os dois anos mais críticos de pandemia, e para aproveitar as atrações turísticas da região.

"Pretendo ir ao Poço Azul (destino famoso pelas cachoeiras de água cristalina) e ao complexo da Pedra Caída, na cidade de Carolina (MA), que fica a 220 km, umas 3h30 de carro, de onde vou estar", diz.

Anna também aproveitou para utilizar as milhas que ganhou do pai para viajar de avião. Ela diz que, se não fosse isso, provavelmente não conseguiria utilizar o transporte aéreo, devido ao alto custo das passagens. "A princípio não iria (de avião), porque as passagens estavam muito caras. Os preços subiram muito. Mas meu pai conseguiu me dar as milhas que ele tem e pude comprar as passagens de ida e volta", esclarece.

Alta demanda

Mesmo com o aumento dos preços dos bilhetes aéreos, o turismo volta a crescer no Brasil e recupera os mesmos patamares do início de 2020, quando a pandemia de covid-19 começou. O custo médio das passagens acumula alta de 123,26% em 12 meses, de acordo com a prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para o mês de junho.

Outro dado, no entanto, revela que o turismo nacional cresceu 47,7% em abril, em comparação com o mesmo mês do ano anterior. O faturamento total no período foi de R$ 15,3 bilhões. A presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens (ABAV), Magda Nassar, explica que, como há uma alta demanda por viagens, após um longo período de pandemia, o setor cresce, mesmo com todas as dificuldades.

"O desejo do brasileiro de viajar faz com que ele procure alternativas aos empecilhos que fazem parte da economia do país, e não só do setor de viagens. Nos últimos anos, viemos de uma pandemia que estava impossibilitando muitas pessoas de viajarem. Julho é um período de férias e os brasileiros estão com um desejo muito grande de viajar. Vemos voos, tanto internacionais, quanto nacionais lotados e as procuras estão bem alta", analisa a presidente.

O crescimento também deve permanecer no segundo semestre, destaca Magda, já que o período é, historicamente, mais intenso para as agências de viagem que a primeira metade do ano.

De acordo com a plataforma de reserva de hospedagens Booking.com, para as férias de julho, os brasileiros optam por destinos mais frios, com o objetivo de aproveitar as temperaturas baixas do inverno. A plataforma apurou que Campos do Jordão (SP), na Serra da Mantiqueira, é o destino mais procurado nas pesquisas. O lugar é conhecido por ser a cidade mais alta do Brasil, localizada a 1.620 metros acima do nível do mar.

Em segundo lugar, aparece Gramado (RS), na Serra Gaúcha, que, assim como a cidade paulista, é considerada um dos roteiros preferidos dos casais. No Centro-Oeste, a melhor colocada no ranking, que aparece na sétima colocação nacional, é Caldas Novas (GO) — destino escolhido por Bruna e Daniel para a lua de mel —, localizada no sudoeste goiano.

Mais lazer

O Vice-Presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo e especialista no turismo e setor aéreo, Gilson Garófalo, ressalta que, pelo fato de novas tecnologias terem ganhado força na pandemia, como a reunião on-line, as viagens a trabalho serão cada vez menos frequentes.

"Desnecessário dizer que as viagens a negócios não voltarão ao nível pré-pandemia, dando lugar a outras modalidades, tais como as que reúnem negócios e lazer, ou seja, além de viajar para realizar um trabalho, o profissional pode aproveitar as atividades de lazer e entretenimento do destino", comenta.

Em contrapartida, as viagens turísticas devem continuar impulsionando todo o setor. O especialista explica que na pandemia, e, mais especificamente durante o período de isolamento social, muitos brasileiros reavivaram o desejo de encontrar novos lugares e conhecer outras realidades.

"Nestas viagens por lazer, domesticamente, se efetuadas em veículo próprio, o preço do combustível pode levar à escolha de locais mais próximos. Quanto à questão das viagens aéreas, seja dentro do país, como para o exterior, certamente muitos aproveitarão as passagens que tiveram que ser remarcadas durante a pandemia ou, então, uma poupança foi realizada para justamente realizar o sonho de 'descansar e arejar'", avalia Garófalo.

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190 mil empregos até o fim do ano

Uma pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Comércio (CNC), apresentada na última semana, indica que o setor de turismo deve gerar, até o fim deste ano, em torno de 190 mil empregos. Desde maio de 2021, mais de 290 mil vagas foram preenchidas no setor, que espera encerrar este ano com uma saldo de 258,1 mil novos postos de trabalho formal.

Com isso, o turismo retoma ao mesmo patamar de quando a pandemia assolou o mundo, em fevereiro de 2020. A recuperação do setor é resultado do avanço da vacinação em todo o país e o desejo que já dura um longo tempo para muitos brasileiros de voltarem a viajar.

"Com este fato, toda a cadeia envolta na seara turística voltou a se movimentar, desde os meios de transporte rodoviário e aéreo, a hotelaria e a infraestrutura específica. As companhias aéreas tiveram que aumentar as frequências, o emprego na rede hoteleira se elevou com as vagas abertas para recepção, arrumadeiras, lavanderia, manutenção, houve crescimento na demanda por restaurantes, nos grandes centros a vida noturna retomou o seu agito", explica o especialista Gilson Garófalo.

"Eventos suspensos nos últimos dois anos ressuscitaram — veja a recente Parada do Orgulho LGBT em São Paulo que reuniu milhões de pessoas, incluindo de todos os estados brasileiros e do exterior — e assim por diante. Todo este conjunto contribuiu e continua a contribuir para a elevação do emprego no turismo", conclui.

Para o diretor do Conselho Empresarial de Turismo e Hospitalidade (Cetur) da CNC, Alexandre Sampaio, o crescimento também deve atingir maiores patamares com a chegada das férias de julho e as festas tradicionais, como o São João no Nordeste e o Festival de Parintins, no Amazonas, que ocorrem no final deste mês de junho.

"Muitos eventos, como o São João, vão gerar um faturamento bem grande para o setor no Nordeste. Tem a festa de Parintins, também. Então todas essas festas pontuais nos dão muito otimismo para esse ano", declara.

A expectativa da CNC também é que a receita para este ano supere em 2,8%, em relação a de 2021. Apenas no mês de abril, o faturamento total do setor alcançou R$ 1,04 bilhão. O dado indica um saldo negativo de apenas -3% em comparação com o patamar às vésperas da crise sanitária, já descontados os efeitos da inflação. Logo, nos próximos meses, a balança já deve ficar positiva, de acordo com as previsões.

O setor engloba não só os hotéis e as agências de viagem, mas todos que estão envolvidos diretamente nos gastos realizados por um turista, como restaurantes e locadoras de veículos. Bares e restaurantes ( 220,5 mil) e serviços de hospedagem ( 61,2 mil) foram as áreas com mais empregos recuperados desde maio de 2021.

O diretor do Cetur, no entanto, comenta que a situação poderia ser ainda melhor, não fosse a crise mundial no petróleo, decorrente da guerra na Ucrânia, e a consequente alta dos combustíveis e das passagens aéreas pode afetar um crescimento ainda maior do setor.

"Isso está tudo sendo levado em conta pela nossa equipe econômica e de inovação e é por isso que a gente tem a projeção de elevação em torno de 3%, porque se não tivéssemos esses problemas, teríamos um aumento significativo no faturamento comparativo da receita deste ano com a do anterior", diz.

*Estagiário sob a supervisão de Michel Medeiros — especial para o Correio.