Defesa e segurança

Entidades do setor aeroespacial protocolam ação contra Boeing

A empresa é acusada de captura sistemática e contratação de engenheiros de outros grupos

Raphael Pati*
postado em 24/11/2022 13:02 / atualizado em 24/11/2022 21:09
 (crédito: JUSTIN TALLIS)
(crédito: JUSTIN TALLIS)

Duas entidades que representam o setor de defesa aeroespacial brasileiro protocolaram uma ação contra a empresa multinacional Boeing por cooptação de funcionários de outras corporações brasileiras, como a Embraer.

A Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (ABIMDE) e a Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (AIAB) são as autoras da ação que tem como objetivo “fazer com que a companhia norte-americana interrompa o processo de captura sistemática e contratação de engenheiros de empresas que fazem parte da Base Industrial de Defesa (BID) do país”, como explica uma nota publicada pelas associações.

A Base Industrial de Defesa (BID), como cita a nota, é um grupo formado por mais de mil empresas do setor de defesa aeroespacial. Eles criticam a cooptação de funcionários altamente qualificados, geralmente formados por universidades de excelência — como ITA, UFMG e UFSCar — para integrar o plantel da multinacional norte-americana, o que gera, em contrapartida, riscos à sobrevivência das empresas nacionais, como aborda o advogado do escritório Tojal Renault, Leonardo Bissoli.

"Qual está sendo o resultado disso? É a retirada dos ‘cérebros’ dessas companhias que formam a base industrial de defesa. Isso tem uma consequência, de um processo degenerativo que está se formando, que é , em curto momento, continuar dessa forma, essas empresas teriam dificuldades operacionais”, analisa.

O advogado ainda rebate o argumento de que a entrada massiva da Boeing no país seria apenas uma consequência da livre competição dentro do mercado. Para Bissoli, não há regulação do mercado, quando o assunto é a defesa do país.

“Isso não existe no mercado de defesa. Principalmente no setor aeroespacial. Primeiro, você tem escassez de mão-de-obra, como em qualquer lugar do mundo, e, segundo, você tem um único cliente, que é, pelo menos em território nacional, que é o Estado brasileiro. Então essas condições e aspectos, impõem a obrigação ao Estado brasileiro de resguardar essas empresas”, completa Bissoli.

As entidades também afirmam que todas as empresas relevantes do setor no Brasil foram afetadas, entre elas a Embraer, Akaer e a Avibras. No caso da primeira, a situação é ainda mais preocupante, visto que ela esteve perto de assinar um contrato em conjunto com a Boeing para a criação de uma joint venture, que acabou não se concretizando após a empresa dos EUA, em decisão unilateral, ter desistido do acordo.

O principal impacto disso para a Embraer foi o acesso da multinacional a dados confidenciais da companhia. “A Boeing teve acesso a informações confidenciais da empresa e dentre essas informações, ela teve acesso não apenas ao perfil dos profissionais, mas mais do que isso: como que a engenharia da Embraer estava estruturada, em termos de desenvolvimento integrado de um produto complexo, como é o produto aeroespacial”, explica o presidente da AIAB, Júlio Shidara.

As associações ainda reforçaram que as empresas que integram o BID possuem um impacto expressivo nas contas do país. Somente o setor nacional de defesa é responsável por aproximadamente 285 mil empregos diretos e 850 mil indiretos, de acordo com dados do próprio Ministério da Defesa. Além disso, o setor representa 4% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil e movimenta cerca de R$ 200 bilhões na economia nacional.

“Independente de quais sejam as intenções da Boeing, o fato é que a vinda dela, a mobilização da sua força de trabalho inicial, para ela começar as suas operações no Brasil está causando a evasão da ‘nata’ da engenharia. O processo de head hunting, desta busca ativa de um perfil específico é que está causando danos que daqui a pouco poderiam ser irreversíveis”, avalia Shidara.

Procurada pelo Correio para comentar as acusações de cooptação de funcionários, a Boeing Brasil afirmou que, neste momento, não tem nada a dizer a respeito. 

*Estagiário sob a supervisão de Ronayre Nunes

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