Jornal Correio Braziliense

Empreendedorismo

Empresa portuguesa quer abrir 50 lojas no Brasil em cinco anos

Grande potencial do mercado brasileiro atrai a Wink, especializada em beleza dos olhos. O primeiro desembarque no país foi em 2017, mas, agora, a estratégia é acelerar os passos. Investimentos devem superar R$ 11 milhões

Lisboa — Se os brasileiros estão desembarcando com vontade em Portugal, tanto para trabalhar, quanto para empreender, o interesse de portugueses pelo Brasil também é crescente. Não por acaso, a empresária Filipa Munõz de Oliveira definiu planos ambiciosos para ampliar a presença no país de sua marca, a Wink, especializada em sobrancelhas e tudo o que se refere à beleza dos olhos. A meta é abrir pelo menos 50 lojas nos próximos cinco anos, que vão se somar às 17 já existentes. Os investimentos devem passar de R$ 11 milhões, levando-se em conta que cada ponto custa entra R$ 150 mil e R$ 300 mil.

Filipa está entusiasmada com o projeto, que faz parte da consolidação do processo de internacionalização da marca. No Brasil, esse movimento começou em 2017.

De início, não foi como ela esperava, dadas as complexidades e o tamanho do mercado. “Não conhecíamos nada, nem as leis, nem o sistema de imposto, sequer sabíamos como transferir dinheiro de Portugal”, conta.

O quadro se complicou porque a advogada, contratada para auxiliar o processo, não se mostrou empenhada o suficiente para transpor as barreiras. “Além disso, a concorrência com o nosso negócio era enorme, apenas uma empresa tinha quase 400 lojas”, relata.

Passado o susto inicial e vencidas as burocracias, Filipa diz que não tem do que reclamar. Das 18 lojas abertas desde então, duas fecharam — uma, durante a pandemia do novo coronavírus, outra, por incompatibilidade com o franqueado.

Recentemente, foi aberto um ponto em Canoas, no Rio Grande do Sul, reforçando que a presença em território brasileiro é para valer. Além do Brasil, há lojas na Espanha, todas próprias, e em Angola, uma franquia.

Primeiros passos 

A porta de entrada no Brasil foi o Rio de Janeiro, onde está o grosso dos negócios, mas a ideia é estreitar os laços em outros estados. “Chegamos com cuidado, pois o objetivo foi consolidar nossa marca. Nossa grande preocupação foi mostrar que temos serviços diferenciados. E deu certo. Conquistamos nossas clientes, que passaram a nos recomendar”, relembra.

A empresária ressalta que, se houve muitas dificuldades para aportar no Brasil, também houve muito aprendizado, o que fez a empresa, como um todo, inclusive em Portugal, aprimorar seu processo de gestão.

“Foi um aprendizado gigantesco. Aprendemos a lidar com um complexo sistema tributário — em Portugal há apenas o IVA. O mercado de franquia no Brasil é altamente sofisticado e desenvolvido. Os empreendedores querem um bom negócio, portanto, é preciso uma enorme capacidade de convencimento de que nós somos os melhores parceiros. E tudo tem de estar em contrato, ao contrário de Portugal, em que, muitas vezes, uma franquia era fechada porque a pessoa era amiga. Enfim, nos profissionalizamos muito.” 

Funcionárias brasileiras

A ligação da Wink com o Brasil é profunda, afirma Filipa. Das mais de 200 funcionárias espalhadas pelos 36 pontos de Portugal, 95% são brasileiras. “São muito comunicativas e trabalhadoras, e olha que nós somos muito exigentes”, destaca.

A mão de obra, contudo, tem sido um desafio para a empresa, pois há uma grande escassez de profissionais qualificados. “Todas as pessoas que se candidatam às nossas vagas passam por treinamento, contudo, ao final, várias desistem. Isso é um problema”, emenda.

Mas já foi pior. Durante a pandemia, num primeiro momento, “as brasileiras desapareceram”. Para complicar, havia uma dificuldade imensa para os imigrantes conseguirem autorização de residência e de trabalho em Portugal, devido à ineficiência do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e da Segurança Social.

Em 13 de março último, porém, o SEF lançou um portal voltado para cidadãos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), entre eles o Brasil, que concede autorização automática de residência. Somente na primeira semana, foram beneficiadas mais de 76 mil pessoas, 90% delas brasileiras. “Aleluia”, vibra Felipa.

Formação de profissionais 

Ela conta que, no Brasil, especificamente, foi criado um pool para formação de profissionais para a Wink. À medida que as lojas necessitam, o banco de talentos é acionado. Nas lojas brasileiras, há homens trabalhado, ao contrário de Portugal, onde todas as atendentes são do sexo feminino.

Os homens, por sinal, estão na mira da empresa. A meta é atrair cada vez mais esse público para fazer sobrancelhas e cuidar da beleza dos olhos. “Em Portugal, onde o público masculino é mais conservador, fizemos algumas adaptações nas lojas para não deixar o ambiente todo feminino. Mas a nossa preocupação é garantir que as mulheres são o público preferencial, são elas a razão do nosso negócio”, ressalta a empresária.

“No Brasil, a presença dos homens na Wink é muito maior, é uma coisa natural”, acrescenta. Apesar disso, os clientes masculinos representam, hoje, menos de 5% do faturamento. E tem, majoritariamente, entre 20 e 30 anos.

Faturamento maior

Os planos de crescimento estão em andamento, a despeito dos sinais de desaquecimento da economia no Brasil e em Portugal. Segundo Filipa, as lojas ainda não sentiram os efeitos desse movimento, provocado, sobretudo, pela alta da inflação.

“Cuidados com a estética são das últimas coisas que as pessoas cortam do orçamento. As pessoas se sentem melhor quando estão mais bonitas”, assinala. “Além disso, nosso serviço é relativamente barato, custa 12 euros (R$ 68)”, diz.

A empresária ressalta, ainda, que aprendeu a lidar com crises e que é possível tirar proveito delas. Foi durante o estouro da bolha imobiliária dos Estados Unidos, em 2008, que colapsou as principais economias do mundo, quando a Wink deslanchou. Filipa lembra que, naquele momento, ninguém queria investir e os shoppings facilitaram a entrada de lojas. A empresa havia estreado dois anos antes e ainda era uma promessa.

Em 2020, com a pandemia, todo o comércio ficou fechado por dois meses. Mesmo com a reabertura, os clientes ficaram arredios, voltando muito lentamente. No ano seguinte, também houve paralisia dos negócios, mas o retorno foi rápido. As pessoas estavam cansadas e queriam retomar a normalidade da vida.

“Em 2022, faturamos mais do que em 2019, pré-pandemia”, revela Filipa. Foram cerca de 8,5 milhões de euros (R$ 48 milhões). Tudo indica que este ano será ainda melhor. “Estamos confiantes”, reforça a empresária, que pensou em desistir do negócio ante as dificuldades que enfrentou para tirar a ideia do papel.

Nos idos de 2006 e 2007, não encontrava ninguém que dominasse a técnica de depilação de sobrancelhas, muito comum na Ásia. Depois de muito procurar profissionais, conseguiu uma indiana que treinou duas jovens. Aberta a primeira loja, ninguém aparecia. Foi preciso oferecer o serviço de graça por uma semana para atrair a clientela. “Desde então, nunca mais paramos”, orgulha-se.