REUNIÃO DO COPOM

Banco Central deve manter juros em 13,75%, apontam analistas

Apesar da pressão do governo, Copom não deve alterar política monetária na reunião desta semana, mas pode reconhecer melhora das expectativas de inflação e indicar queda da Selic em agosto ou setembro

Rosana Hessel
postado em 19/06/2023 03:55
 (crédito:  Ed Alves/CB/DA.Press)
(crédito: Ed Alves/CB/DA.Press)

O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, volta a se reunir nesta terça e quarta-feiras para deliberar sobre a taxa básica de juros da economia, a Selic. O consenso entre analistas do mercado é de que não haverá surpresas e que a taxa deverá ser mantida em 13,75% ao ano, mesmo com o arrefecimento da inflação nos últimos meses. Será a 7ª reunião seguida com os juros básicos no mesmo patamar de agosto de 2022.

O fato é que o Banco Central tem mantido o discurso e a direção da política monetária, e não tem se abalado com as críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Especialistas avaliam, contudo, que o Copom deverá fazer um ajuste na comunicação, diante da queda das expectativas de inflação, que estão sendo revisadas para baixo, com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) podendo até ficar negativo entre junho e julho. Eles lembram, no entanto, que o período tradicionalmente é de deflação, e que o índice tende a subir mais à frente.

Dessa forma, o Comitê poderá sinalizar um corte de juros em agosto ou em setembro. Mas não há muita certeza de que isso poderá ocorrer, porque um dos fatores que pode contribuir para os juros começarem a cair em agosto será a manutenção da meta de inflação em 3,25% para 2024, e em 3% para os anos seguintes, na reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), marcada para o próximo dia 29. Como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou a cogitar uma meta maior, de 4% ou 4,5%, as projeções para a inflação de 2024 e 2025 subiram para 4% e só registraram um ligeiro recuo na semana passada.

As estimativas para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano estão sendo revisadas para cima, enquanto as do ano que vem, para baixo. Na semana passada, as medianas do boletim Focus, coletadas pelo BC, ficaram em 1,84%, para 2023, e 1,27%, para 2024.

Apesar do resultado surpreendente do PIB dos primeiros três meses do ano, com alta de 1,9% puxada pela agricultura, em abril, a produção da indústria, as vendas do varejo e serviços recuaram 0,6%, 0,1% e 1,6%, respectivamente, conforme os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E, para confundir as análises e dar argumentos ao Copom manter os juros onde estão, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), apresentou crescimento de 0,56% em abril, dado acima das expectativas.

BC inabalável

O Banco Central segue inabalável, recomendando paciência, apesar das pressões de Lula e aliados, da indústria e de empresários, como Luiza Trajano, dona do Magazine Luiza. Em uma reunião de varejistas no Palácio do Planalto, ela contou que ligou mais de 20 vezes ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, pedindo para ele baixar os juros, porque muitas empresas correm o risco de quebrar.

Até o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que tinha diminuído as críticas, resolveu dar uma cutucada no BC, após a Standard & Poor's (S&P) elevar de estável para positiva a perspectiva de risco dos títulos da dívida do país, na última quarta-feira. "Está faltando o Banco Central se somar nesse esforço. Mas eu quero crer que nós estejamos prestes a ver isso acontecer. Na hora que estivermos todos alinhados, a coisa vai começar a prosperar", disse Haddad, após destacar a "harmonia" entre os três Poderes como um dos motivos para o voto de confiança da agência de classificação de risco norte-americana.

Na avaliação de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, Haddad não devia ter provocado o Banco Central, porque esse tipo de pressão joga contra a decisão da autoridade monetária, que passou a ter autonomia em 2021. "A mudança da perspectiva não muda nada no cenário para o Copom. É uma chancela interessante para a melhora do cenário, mas o BC vai trabalhar com dados concretos. O BC está fazendo o trabalho dele com os dados que existem, totalmente técnico, e vai responder tecnicamente. É o que está acontecendo", afirma. Para ele, o Copom só deverá começar a reduzir a Selic em setembro.

"O BC vai começar a falar um tom um pouco mais suave. A inflação está cedendo, e isso pode ajudar em uma sinalização de que, lá para frente, os juros podem começar a cair. Eu ainda acredito que é setembro, não é agosto", destaca o economista da MB. Ele lembra que, apesar de a inflação estar cedendo, ainda há alguns itens de preocupação, como os preços no setor de serviços, mas o IPCA está cada vez mais caminhando para ficar próximo de 5% no fim do ano, ou até abaixo desse patamar, "dependendo da inflação de alimentos".

Insistência

Ex-diretor do Banco Central e professor visitante na Universidade Georgetown, em Washington, Tony Volpon considera que o contexto atual colabora para o início da queda de juros e o BC não deveria ficar tão preso às expectativas de inflação do mercado para dar início ao ciclo de baixa. "Nada é óbvio em política monetária. Mas o contexto parece realmente chamar para o início de um processo de queda de juros, no qual a política monetária ficará em posição restritiva por muito tempo", destaca. Ele observa que a maioria das previsões apontam para a Selic acima de 10% até o fim de 2024, o que manterá a política monetária contracionista.

Apesar de achar que existem elementos de sobra para o BC começar a reduzir os juros, Volpon reforça que a normalização da taxa básica deverá ocorrer entre agosto e setembro, devido à insistência de que é preciso uma desancoragem das estimativas do boletim Focus antes de o Copom agir. "Botando o Focus de lado, neste momento, ele não serve muito como um bom balizador da política monetária. Todo o resto está trabalhando para isso. É câmbio, preços de atacado caindo, atividade econômica, excluindo a agrícola, claramente desacelerando...E tem a melhora da perspectiva da S&P, que não foi tanto um elogio ao governo, mas um reconhecimento de que o Brasil tem restrições políticas institucionais que evitam medidas radicais, muito diferentes do que ocorre na Argentina, por exemplo", afirma.

Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, acredita que o Copom deve reconhecer a mudança do cenário, com o começo da queda nas expectativas de inflação no próximo ano. "Isso vai meio que preparando o terreno para queda dos juros em agosto. Portanto, não há novidade agora na taxa, mas haverá um reconhecimento dessa melhora de cenário", comenta.

Política expansionista

Para Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, é precipitado para o BC cortar os juros nesta semana, apesar da desaceleração da inflação oficial entre abril e maio. "No comunicado após a reunião, o Copom pode reconhecer a melhora do cenário como um avanço inicial que pode abrir espaço para alguma queda de juros no próximo encontro. Não vai ser explícito, mas vai deixar a porta aberta para juros mais baixos", afirma.

Ele reconhece que a indefinição da meta de inflação é um dos fatores que contribuem para que a queda dos juros não comece na reunião deste mês, E diz que, apesar do avanço do arcabouço fiscal, a questão das contas públicas ainda requer atenção, porque os gastos foram ampliados na PEC da Transição, as despesas continuam crescendo e podem prejudicar os efeitos da política monetária.

"A meta de inflação é importante, as projeções de inflação são importantes e o tamanho da inflação global também. Existe uma série de coisas que acontecem na direção de sugerir que política monetária pode ser menos contracionista. Na minha avaliação, as condições econômicas melhoraram, mas a política fiscal continua expansionista, não tenho dúvida. As despesas públicas cresceram 20% acima da inflação entre 2021 e 2023 e o arcabouço permite que elas continuem aumentando 2,5%, em um patamar elevado", alertou.

Megale aposta em queda dos juros a partir de agosto, mantém a previsão de 12% para a Selic no fim do ano, e também não alterou a estimativa de 11% para os juros básicos no fim de 2024. Por conta da política fiscal, que ainda tem muito aumento de despesas obrigatórias neste ano e no próximo, como reajuste de servidores, aumento real do salário mínimo, e até mesmo a sinalização de Lula ter o interesse para prorrogar por mais tempo o estímulo para compra de carros "populares" de até R$ 120 mil, o economista da XP é taxativo ao justificar a previsão de dois dígitos para a Selic em 2024.

"A soma das promessas deixa uma conta que não fecha. Isso significa que a política fiscal limita o espaço para corte de juros", diz Megale, lembrando que secretários do Planejamento e da Fazenda já contabilizam quase R$ 40 bilhões de gastos a mais no ano que vem.

Rafael Cardoso, economista-chefe da Daycoval Asset, ressalta que a política monetária não deve ter grandes mudanças. "O BC olha futuramente, pela política monetária, como um transatlântico, que não consegue fazer grandes alterações rapidamente", frisa. Cardoso aposta em queda de juros em setembro. Mas, ao contrário da maioria dos analistas, prevê a Selic abaixo de dois dígitos no fim de 2024, em grande parte, porque o impacto da política monetária atual na atividade do ano que vem poderá ser maior do que o esperado.


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