A produção de café no Brasil está passando por um momento de retomada. Após os problemas climáticos entre 2020 e 2022, que afetaram a produção, a safra mostrou poder de reação em 2023. E a tendência é o café ficar mais forte. De acordo com a produtora rural e assessora da Comissão Nacional de Café da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Raquel Miranda, a previsão é o país produzir 58,7 milhões de sacas. Ainda está distante da safra recorde de 2020 — quando o país superou 63 milhões de sacas das variedades arábica e robusta.
Raquel comentou o desafio dos produtores ante o cenário climático desafiador. "Administrar uma propriedade rural é administrar uma empresa a céu aberto e que está sujeita a essas questões climáticas", observou. No atual cenário econômico, mencionou a especialista, a produção cafeicultora passa por um momento de altíssima volatilidade. "Observamos um boom das commodities agrícolas", disse. Nos projetos concedidos pela CNA, o produtor se torna peça-chave no processo de assistência técnica. Leia os principais trechos da entrevista, concedida aos jornalistas Roberto Fonseca e Thays Martins.
Quais as expectativas para o café em 2024?
Há uma recuperação da produção nacional. Em 2020, tivemos nossa safra recorde. O Brasil superou 63 milhões de sacas, da variedade arábica e robusta conilon. Tivemos problemas climáticos seríssimos depois do inverno de 2020, geada em 2021 e mais problemas climáticos em 2022, o que prejudicou muito a nossa produção nacional. 2023 já começa com uma recuperação e 2024 nós temos uma retomada, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), de 5,5%. O país vai produzir 58,7 milhões de sacas. Isso é uma sinalização muito importante, principalmente para o mercado internacional. A safra de 2024 traz uma boa notícia, tanto para o produtor rural quanto para o mercado internacional.
A produção de café está preparada para as oscilações climáticas?
O produtor está muito atento. Administrar uma propriedade rural é administrar uma empresa a céu aberto, que está sujeita a essas questões climáticas. Cada vez mais nós vemos os produtores implementando boas práticas agrícolas — como recuperação de nascentes, conservação de um solo com qualidade de matéria orgânica, de um solo vivo — tudo isso contribui para que as plantas tenham melhor vigor para atravessar momentos, por exemplo, de extremo calor como está acontecendo nas principais regiões produtoras. Ao mesmo passo, nós temos o desenvolvimento de novos materiais genéticos, que são mais resilientes a essas mudanças climáticas. Então, o produtor está atento — e hoje eu digo que é a maioria dos cafeicultores brasileiros.
Como está o mercado internacional?
Se nós olharmos para uma janela bem estreita, nós estamos passando por um momento de altíssima volatilidade. Quando olhamos por uma janela mais extensa, desde 2020, quando a gente atravessou um período de pandemia, observamos um boom das commodities agrícolas como um todo. O café brasileiro atingiu seus preços recordes, tanto do arábica quanto do conilon. Mas também foi um momento que o produtor passou por problemas climáticos e frustração de produção. Então, muitos produtores, apesar de um preço competitivo e interessante, não tinham produção para comercializar. Foi um momento delicado. Nós também estamos passando por um período de recuperação. O clima não está perfeito, mas já está mais favorável e é esperado que muitos produtores tenham um melhor resultado.
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Os preços estão atrativos?
Ao contrário do que se esperava, os preços continuam firmes. Nas últimas semanas, apesar da alta volatilidade, tivemos uma recuperação no café arábica, que voltou a ser negociado acima de mil reais na saca de 60kg nas principais praças do Brasil. E o canéfora, com as variedades conilon e robusta, atingiu a máxima histórica de preços dos últimos 16 anos. O país está sendo muito procurado nesse momento.
Estamos num período chuvoso. Isso não impacta no preço para o consumidor?
Não porque a característica da safra brasileira é bem diferente dos outros países. No Brasil, a colheita é concentrada durante o período de inverno. E o inverno costuma ser um clima mais seco. Então, eu tenho uma safra de café no Brasil concentrada numa janela. Depois que acaba a safra é que esse café começa a ser ofertado ao mercado. E, ao contrário de outros produtos agrícolas, o café pode ser estocado por um tempo mais prolongado.
O consumidor tem cada vez mais opções no mercado. Quais são as principais diferenças?
O consumidor brasileiro tem mudado os hábitos de consumo, ficando mais curioso em quantas variedades que a gente tem de café. Nós produzimos duas espécies. Produzimos muito e somos bons na produção do café arábica e do café canéfora, que tem duas categorias: o conilon, onde o maior produtor é o Espírito Santo; e o robusta, cujo produtor é Rondônia, que traz um perfil sensorial de terroir muito exótico e interessante para os robustos amazônicas. Só falando de genética, portanto, já apontei três tipos.
Mas há outras características?
Sim. Posso falar de outros aspectos que influenciam a característica sensorial desse café, como, por exemplo, cafés especiais. Existe uma metodologia de avaliação mais consolidada no mundo, que é a norte-americana. O café é pontuado de 0 a 100. Cafés que obtêm uma pontuação acima de 80 pontos são considerados sensorialmente especiais. Então, quanto mais alta é essa pontuação, atributos como doçura natural, aroma intenso, aromas agradáveis, achocolatados, frutados, florais, eles vão se destacar nesse café e trazer elementos exóticos. Quando se fala em café especial, o olhar é para além do sensorial, volta-se para quem produziu esse café. Existe a agregação de valor por ser um café produzido por mulher, por um jovem, por ter vindo de determinada região.
Quais são os principais mercados consumidores do café brasileiro?
O Brasil exporta praticamente para todos os países do mundo que consomem café. Mas nossos principais destinos são do bloco europeu e os Estados Unidos. Nossas exportações para Ásia têm crescido muito, algo que sempre foi um sonho da cafeicultura brasileira porque, se conseguirmos aumentar o consumo de café principalmente na China, que ainda não é um país que consome café de forma tradicional, essa demanda vai ficar muito aquecida. É um sonho do Brasil, mas ao mesmo tempo leva desafios, porque vamos ter que investir em tecnologia e aprimoramento para produzir mais a fim de atender esse mercado.
Quais programas da CNA estão à disposição do produtor?
Eu tenho novidades para os produtores. A CNA tem um programa chamado Programa CNA Brasil Artesanal. A primeira de 2024 vai ser para o café torrado. Produtores que comercializam café torrado podem participar do prêmio CNA Brasil Artesanal. As inscrições vão iniciar em fevereiro, e o edital será divulgado com todas as regras. Tem premiação, tem capacitação desses produtores para que eles possam se tornar ainda mais profissionais, e com uma colocação de mercado ainda mais estratégica para ter sucesso na comercialização do grão torrado.
Como isso vai funcionar?
Vamos trabalhar com duas categorias: café 100% arábica e café 100% canéfora. Para essa primeira edição serão essas duas categorias. Nós temos cafés maravilhosos do Acre ao Paraná. Então, teremos uma disputa muito boa entre cafés de todo o país.
E os programas de assistência técnica?
O nosso carro-chefe é a assistência técnica gerencial através do Sener. Quando olhamos para o Brasil agrícola, nós temos uma história. Normalmente, são famílias que durante muito tempo souberam produzir com excelência, mas tiveram dificuldades em comercializar e saber vender esse produto. Além de fornecer assistência para melhorar técnicas de produção, o Sener capacita o produtor para fazer a gestão eficiente da propriedade. Nós temos um outro programa que é o Agro BR. Temos mais de 300 produtores cadastrados, que exportam café para outros países. Então, a CNA, além de representar politicamente os interesses dos produtores rurais brasileiros, leva assistência, capacitação, qualidade de vida para esse produtor no campo e a abertura de novos mercados.
*Marina Dantas - Estagiária sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza
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